(*) Artigo publicado na Coluna Gestão do autor no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com)
No último mês de abril o
Fundo Monetário Internacional divulgou seu tradicional World Economic Outlook (Perspectivas para a economia mundial). Já
naquele mês a perspectiva de crescimento para o PIB global não era nada boa:
-3%. Comparada com a expectativa de crescimento em torno de +3% em janeiro
deste ano, a taxa de abril representa uma distância de seis pontos percentuais
para menos. No último dia 24 de junho,
entretanto, revendo o cenário mundial, o Fundo projetou o crescimento para
-4,9%, ou seja, -1,9% pior do que no cenário de abril. Em 2019 o crescimento mundial
bateu +2,9%. Mas a queda provocada pela pandemia é muito mais grave. Trata-se
do pior desempenho desde a Grande Depressão de 1929. A contração econômica, no
entanto, já era esperada, dada a proporção que a pandemia alcançou no Planeta.
Segundo o FMI, mantendo-se esse desempenho, a curva de crescimento da economia
no mundo será um “V” (com a segunda perna levemente inclinada para a direita),
significando uma queda acentuada no primeiro semestre de 2020 e crescimentos
moderados no segundo, na medida em que as economias forem voltando lentamente à
normalidade e, principalmente, com a chegada da vacina contra a Covid-19,
prevista para dezembro deste ano ou janeiro do próximo. Para 2021 a expectativa
de crescimento é bem mais favorável: de + 5,4%, mas nada garante que seja
assim. O cenário é ainda muito nebuloso. Tudo está muito incerto.
Pela primeira vez, todas
as regiões do globo estão em recessão. A
previsão para a Zona do Euro é uma queda de -10,2%, América Latina e Caribe de
-9,4%, Oriente Médio e Ásia Central de -4,7% e África Subsaariana de -3,2%. A
China, que desde 1999 registra taxas de crescimento acima de 6%, crescerá
apenas 1% em 2020. Entre as economias avançadas, apenas o Japão terá a menor
queda: -5,8%. Os demais: -8% (EUA), -7,8% (Alemanha), -12,5% (França), -12,8%
(Itália), Espanha (-12,8%), -10,2% (Reino Unido), -8,4% (Canadá). Entre as
economias emergentes e em desenvolvimento, o cenário não muda muito: -4,5%
(Índia), -6,6% (Rússia), -9,1% (Brasil), -10,1% (México), -6,8% (Arábia
Saudita), -5,4% (Nigéria) e -8,0% (África do Sul). Na África Subsaariana –
composta por 48 países – a renda per capita cairá 5,5% em 2020, apresentando
níveis de 10 anos atrás. Ou seja, tudo o que foi construído na última década
virará fumaça. Talvez, o nível de renda duramente construído nos últimos dez
anos precisará outra de década (ou mais anos) para alcançar o patamar atual. Em
síntese: um retrocesso brutal.
Segundo Gita Gopinath,
responsável pelo Departamento de Pesquisa do FMI, há dois fatores a considerar.
O primeiro, relacionado à trajetória econômica de cada país. Alguns, estavam em
crescimento, ainda que moderado, antes da pandemia. Outros, apresentavam
tendência de queda. Estes últimos sofrerão mais danos, uma vez que sua condição
econômica, que já não era boa, tenderá a ficar pior devido à queda na atividade
econômica. Outro aspecto relevante diz respeito aos países cuja economia
dependem fortemente do turismo. Com a pandemia, este setor foi drasticamente
atingido. E não apenas agora, mas também para os próximos meses. Trata-se de um
setor bastante sensível a circunstâncias que naturalmente limitam a circulação
das pessoas (taxas de câmbio elevadas, falta de segurança). No caso específico
da Covid-19, o cenário futuro não é dos melhores. Mesmo alguns países
sinalizando com aberturas graduais às visitações públicas, isso não significará
a retomada de viagens turísticas imediatamente ao redor do mundo. Haverá um
tempo de espera. Esse “gab” significará recuperações lentas no setor do turismo
nesses países, além de pressões para déficits nas contas externas. Por outro
lado, países que tiverem dificuldades de controlar as taxas de infecção
dificilmente estimularão residentes de outras nações a nele aterrissarem para
missões de passeio e lazer.
Portanto, quanto mais
rápido ocorrer a reabertura econômica – mesmo em níveis baixos – menores serão
os prejuízos. Nesse sentido, é importante que os governos invistam em seus
sistemas de saúde, a fim de que eles possam responder à altura às demandas da
Covid-19. Contudo, muitos países não têm recursos suficientes para investir – a
exemplo do bloco de países africanos - o que exigirá aportes de recursos
internacionais de organizações multilaterais de desenvolvimento para ajudar na
retomada do crescimento econômico.
O confinamento social
representou um duro golpe na demanda agregada sendo determinante para a queda
na oferta de bens e serviços. A queda no consumo desestimulou fortemente novos
investimentos das empresas criando uma espiral altamente nociva. O declínio no
faturamento das empresas trouxe consigo também baixos níveis de arrecadação de
impostos e contribuições para os governos, o que sinaliza para orçamentos
públicos deficitários. Não bastasse isso, as despesas públicas, fomentadas
pelas necessárias transferências de renda e investimentos no setor de saúde,
apontam para cenários mais graves, representando preocupantes descompassos
entre receitas e despesas governamentais.
No tocante aos níveis de
endividamento público, as notícias também não são das melhores. Segundo projeções
do Fundo é de se esperar que a dívida pública mundial alcance 101% do PIB
2020/2021, equivalente a 19% a mais quando comparado com o resultado de um ano
atrás. No tocante ao déficit fiscal global o cenário
não é diferente. Há projeção de aumento de 14% do PIB mundial para 2020. Em
2019 o déficit fechou em 4%, isto é, o aumento corresponderá – se nada mudar –
a 10% em valores líquidos.
Outra consequência
importante da pandemia é o desemprego. Segundo dados da Organização
Internacional do Trabalho, o número de horas trabalhadas no primeiro trimestre
de 2020 foi menor que o mesmo período em 2019. A queda representou o
equivalente à perda nos postos de trabalho de 130 milhões de empregos, ou seja,
algo em torno de 62% da população brasileira.
A baixa atividade
econômica produziu também quedas significativas nas taxas de inflação. Entre as
economias avançadas a inflação média foi reduzida em 1,3% no final de 2019 para
0,4% em abril/2020. Já entre as economias emergentes, os percentuais foram,
respectivamente, de 1,2% e 4,2%, em termos de queda.
Evidentemente que, em se
tratando de sistemas econômicos, os cenários podem mudar rapidamente.
Principalmente quando os números representam escalas planetárias. Na verdade, o
que representará efetivamente um fôlego para as economias no mundo é encontrar
logo uma vacina para a Covid-19. Com ela, muitas janelas de oportunidades
voltarão a ser abertas, mas, igualmente, também lições importantes terão de ser
assimiladas.
Penso que um dos fortes
legados deixados por pandemias com estas proporções são as medidas para o fortalecimento
dos sistemas de saúde em cada país. No Brasil, os recursos da telemedicina,
ainda que minimamente explorados, podem representar importantes aliados na
busca por saúde pública de qualidade. Ademais, a identificação de déficits na
oferta de equipamentos hospitalares deve ser tomada como um incentivo aos governos
para refletirem sobre como eles têm conduzido suas políticas de saúde até aqui.
Mais do que ameaças,
circunstâncias domo períodos pandêmicos, devem representar verdadeiras
oportunidades. Oportunidades de melhorias. De avanços. De crescimento. De melhores taxas de produtividade. De
aprendizagem com os próprios erros e com os erros das outras nações.
Agora...será que os
governantes estarão dispostos a aprenderem com os erros? É uma pergunta que
fica no ar, mas que muitos de nós brasileiros, provavelmente já teremos uma resposta à tira colo, pronta para ser
sacada no momento certo.
Alipio
Reis Firmo Filho
Conselheiro
Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão
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