quarta-feira, 25 de abril de 2018

PROGRAMAÇÃO FINANCEIRA E CRONOGRAMA MENSAL DE DESEMBOLSO: O QUE É?

. INTRODUÇÃO

Direito Financeiro, ainda hoje, é seara pouco estudada dentro da ciência jurídica. Por tal razão, os institutos desse ramo do Direito, mesmo os mais basilares para a atividade financeira estatal, ainda são bastante desconhecidos, de modo que, muito comumente, os profissionais do direito apresentam grandes dificuldades de compreendê-los-los e maneja-los.
Diante desse quadro, o presente artigo busca analisar o cronograma mensal de desembolso, um importante instrumento de Direito Financeiro, relacionado ao controle de gastos públicos e ao atingido das metas e objetivos traçados no planejamento orçamentário. Instituto esse que, contudo, é ainda bastante inexplorado pelos estudiosos do Direito.

2. AS LEIS ORÇAMENTÁRIAS E A PREVISÃO DE METAS

            Antes de abordarmos a programação financeira e o cronograma de execução mensal de desembolso, é de extrema relevância, mesmo que de maneira superficial, conhecermos os instrumentos jurídicos que viabilizam a elaboração de metas econômicas financeiras pelo Estado, quais sejam: LOA (lei orçamentária anual), LDO (lei de diretrizes orçamentárias) e o PPA (plano plurianual).
É mister salientar, que os projetos das referidas leis orçamentárias são de iniciativa exclusiva e privativa do chefe do poder executivo, conforme pode ser constatado nos artigos 84, XXIII e 165, ambos da Magna Carta de 88. Cabe ressaltar, que tal determinação é aplicada a todos os entes da federação: União, Estados Federados, Municípios e o Distrito Federal.
            O primeiro instrumento de elaboração de metas e de planejamento da atividade financeira do Estado mencionado pela Constituição é o PPA. Tal lei tem a vigência de quatro anos, e deve ser elaborada no primeiro ano de mandato presidencial. O plurianual estabelece os objetivos e metas da Administração Pública com referência às despesas de capital e outras afins de duração continuada (art. 165, § 1º, CF/88).
            Já a lei de diretrizes orçamentárias dispõem sobre as metas e prioridades no tocante as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente. Como no Brasil o exercício financeiro coincide com o ano civil (art. 34, lei 4320/64), a LDO estabelecerá metas para o próximo ano. Além disso, a lei de diretrizes também poderá disciplinar alterações na legislação tributária (art. 165, §2º, CF/88).
            A lei orçamentária anual, finalmente, deve ser enviada pelo executivo ao Parlamento, no prazo máximo de até quatro meses antes do término do exercício financeiro (art. 35, §2º, III, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Tal lei, em suma, abriga o orçamento fiscal financeiro dos três poderes, fundos, entidades da administração direta e indireta, seguridade social, entre outras, conforme os incisos do §5º, do art. 165, da Constituição de 1988.
            As três leis citadas e rapidamente comentadas são os instrumentos hábeis para que a Administração Pública elabore metas e objetivos para a aplicação do dinheiro do contribuinte. Feita essa rápida explicação podemos passar para a fase do cumprimento de tais metas, ou seja, a fase de execução do orçamento.

3. DA EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO

A fase de execução do orçamento compreende a realização e materialização das metas e despesas previstas nas leis orçamentárias, posto que as mesmas apenas preveem as receitas e os gastos da Administração Pública. Assim, pode-se afirma que é na execução orçamentária que se tem a efetiva saída de dinheiro dos cofres públicos.
Para Eduardo Marcial, Mestre e Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, a execução financeira é dividida em quatro etapas: empenho, liquidação, ordenação e pagamento. Vejamos a definição dada pelo autor para cada uma das referidas etapas.
O empenho, efetivado, em geral, através da emissão de documento denominado nota de empenhoobjetiva pormenorizar a operação e quantificar a despesa.
A liquidação consiste na verificação do adimplemento do credor (o que gera direito subjetivo ao credor de receber a contraprestação), a fim de apurar a legitimidade do pagamento a ser efetuado.
Em seguida, fala-se em ordenação, que é o despacho pelo qual a autoridade competente determina o pagamento da despesa.
E, por fim, o pagamento, que é o ato pelo qual o Estado promove a entrega do valor devido ao credor, por meio de ordem bancária ou de cheque nominativo.
            Pelo exposto, concluímos que as metas previstas nas leis orçamentárias serão de fato materializadas na execução do orçamento. Além disso, é na referida etapa que se define como as despesas serão realizadas e de que formar os recursos serão liberados. Disso que trata, em essência, a execução orçamentária.

4. PROGRAMAÇÃO FINANCEIRA

Programação financeira deve ser entendida como os mecanismos responsáveis por racionalizar a liberação dos recursos financeiros necessários ao custeio das despesas previstas na lei orçamentária anual, através da compatibilização entre o ritmo da realização das despesas previstas, segundo a probabilidade de arrecadação.
Os artigos 47 a 50, da lei n. 4.320/64 dispõem que a programação financeira se faz mediante a definição de um cronograma, o qual considera a data efetiva da disponibilidade dos recursos financeiros. O que é um pressuposto fundamental para a realização de qualquer despesa que tenha sido autorizada pela lei orçamentária anual, pois é de tal maneira que se assegura a disponibilidade de recursos ao longo do exercício financeiro.
Nesse sentido, a previsão o caput do art. 47, da lei n. 4.320/64 é de uma programação financeira trimestral, entretanto, atualmente a lei complementar n. 101/2000 (lei de responsabilidade fiscal) exige que tal periodicidade seja mensal, vejamos o que aduz a referida legislação?
Art. 8o Até trinta dias após a publicação dos orçamentos, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias e observado o disposto na alínea do inciso I do art. 4o, o Poder Executivo estabelecerá a programação financeira e o cronograma de execução mensal de desembolso.
Parágrafo único. Os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso.
           
            Além da alteração no citado prazo, a lei complementar 101/2000 modificou sensivelmente o conceito de programação. Anteriormente, segundo os artigos 47 a 50 da lei n. 4.320/64 o objetivo da programação era tão somente o de prevenir défices de caixa, ou seja, não permitir a insuficiência de recursos para o custeio das despesas previstas na LOA.
            Agora, com a lei de responsabilidade fiscal, a programação financeira tem uma orientação mais abrangente, enfatizando o planejamento, programação e uma gestão fiscal mais responsável. Concomitantemente, foi reforçada a necessidade de que tal planejamento e essa programação tivessem por finalidade prevenir as consequências de um eventual desequilíbrio financeiro, como por exemplo: o acúmulo de restos a pagar, o que poderia comprometer as receitas dos próximos exercícios.          

5. CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO MENSAL DE DESEMBOLSO

Conforme já demonstrado, anteriormente à lei complementar n. 101/2000 a programação financeira era realizada em cotas trimestrais, com a entrada em vigor do citado diploma legal  o cronograma de execução do orçamental passou a ser mensal.
Entretanto, os objetivos fixados pelo artigo 48 da lei n. 4320/64 ainda devem ser observados, vejamos os citados objetivos:
Art. 48 A fixação das cotas a que se refere o artigo anterior atenderá aos seguintes objetivos:
a) assegurar às unidades orçamentárias, em tempo útil a soma de recursos necessários e suficientes a melhor execução do seu programa anual de trabalho;
b) manter, durante o exercício, na medida do possível o equilíbrio entre a receita arrecadada e a despesa realizada, de modo a reduzir ao mínimo eventuais insuficiências de tesouraria.
Podemos afirmar que o principal objetivo do cronograma mensal de desembolso é organizar a previsão de saída de recursos. Assim, o cronograma fixa quantitativamente e periodicamente, a cada mês, os saques que serão realizados perante a cota única do tesouro.
Através de uma análise conjunta lei n. 4320/64 e a lei complementar n. 101/2000, observa-se que além do objetivo primordial de organizar a previsão de saída de recursos do tesouro, o cronograma mensal de desembolso possui outras três relevantes funções que não devem ser negligenciadas:
  • Prevenir défices futuros, através de ações capazes de impedir o acúmulo de restos a pagar e o ajuste de compromissos que poderiam comprometer receitas futuras;
  • Fixar fluxo de caixa e ajuste na execução do orçamento;
  • Fixação de limites para os saques perante a cota única do tesouro
Desse modo, podemos concluir que o cronograma mensal de desembolso é um importante instrumento de controle de gastos públicos, essencial para a organização da saída de recursos dos cofres públicos e prevenção de défices desnecessários.

6. BIBLIOGRAFIA

JARDIM. Eduardo Marcial Ferreira. Manual De Direito Financeiro Tributário. 12ª ed. São Paulo. Saraiva, 2011.
PISCITELLI, Tathiane. Direito Financeiro Esquematizado. 2ª ed. São Paulo. Método, 2012.
Fonte: Hugo Dutra Fonseca (https://jus.com.br/artigos/48281/programacao-financeira-e-o-cronograma-mensal-de-desembolso) 

DELAÇÃO PREMIADA: O QUE É?

Delação premiada é uma expressão utilizada no âmbito jurídico, que significa uma espécie de "troca de favores" entre o juiz e o réu. Caso o acusado forneça informações importantes sobre outros criminosos de uma quadrilha ou dados que ajudem a solucionar um crime, o juiz poderá reduzir a pena do réu quando este for julgado.
Muitas pessoas consideram a delação premiada como se fosse um "prêmio" para o acusado que opta por delatar os comparsas e ajudar nas investigações da polícia. De acordo com a lei brasileira, o juiz pode reduzir a pena do delator entre 1/3 (um terço) e 2/3 (dois terços), caso as informações fornecidas realmente ajudem a solucionar o crime.
A delação premiada está prevista por lei no Brasil desde o decreto de lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, conhecida como a Lei dos Crimes Hediondos, no artigo 8º, parágrafo único:
Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.
Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.
Posteriormente, em 1999, o decreto de lei nº 9.807 e o artigo 159 do Código Penal Brasileiro, ambos, respectivamente, apresentam os seguintes textos:
Artigo 159 (Código Penal Brasileiro):
"Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena: reclusão de oito a quinze anos.
§ 4° - Se crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços".​

Artigo 13 (Lei nº 9.807/99):
"Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:
I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;
II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada
III – a recuperação total ou parcial do produto do crime.
Parágrafo único: a concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiário e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso"
Artigo 14 (artigo nº 9.807/99):
"O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, no caso de condenação, terá sua pena reduzida de um a dois terços".
Como funciona a delação premiada
A delação premiada pode ser requerida pelo próprio réu, através de um pedido formal feito por seu advogado, ou sugerida pelo promotor de justiça que está investigando o processo criminal. 
Caso a delação premiada seja aprovada, o delator deverá dar ao juiz informações pertinentes sobre o caso em que está envolvido. Se o juiz considerar os dado informados pelo réu realmente importantes, consentirá um "alívio" na sua pena, como:
  • redução da pena de um a dois terços do total;
  • pena em regime semiaberto;
  • anulação total da condenação;
  • perdão pelo envolvimento no crime; 
No entanto, caso as informações fornecidas pelo delator sejam inverídicas, o juiz pode aumentar a sua condenação e ainda processá-lo por "delação caluniosa", sendo punido com dois a oito anos de prisão por faltar com a verdade. 
Fonte: https://www.significados.com.br/delacao-premiada

segunda-feira, 23 de abril de 2018

O QUE É AUDIÊNCIA EM AUDITORIA GOVERNAMENTAL?

O art. 157 do Regimento Interno do TCU dispõe que o relator presidirá a instrução do processo, determinando, mediante despacho, de ofício ou por provocação da unidade de instrução ou do Ministério Público junto ao Tribunal, dentre outras medidas, a audiência dos responsáveis. O que o TCU chama de AUDIÊNCIA?

Segundo o inciso III do art. 202 (Regimento Interno/TCU), a Audiência é uma modalidade de comunicação processual determinada pelo Relator ou pelo Tribunal para ofertar aos responsáveis nos casos em que haja irregularidade em que não há débito, ou seja, valor algum a ser devolvido pelo agente público infrator. Vejamos algumas situações:

- Em razão de uma denúncia, os auditores vão a campo investigar se um determinado órgão efetivamente está contratando pessoal sem concurso público. Em caso afirmativo, haverá infração a dispositivos constitucionais e legais sem, contudo, envolver a necessidade de devolução de recursos. Caberia a Audiência do agente responsável;

- Ao realizar o plano anual de auditoria, os auditores constatam que uma tomada de preços foi realizada quando, na verdade, caberia uma concorrência. Na oportunidade, verificou-se que a tomada de preços ocorreu de maneira regular, sem maiores consequências. Com efeito, o ato infrator se limitou a tomar uma modalidade licitatória por outra. O mesmo fato se fosse constatado que um agente responsável estivesse dispensando licitações ao invés de realizar convites ou outras modalidades licitatórias. Caberia a Audiência do agente responsável;  

-   Fiscalizando um contrato firmado por um órgão público, o auditor constata que muitas cláusulas obrigatórias (previstas na Lei nº 8.666/93) não foram incluídas no termo processual. Há infração sem envolver débito. Também aqui caberia a Audiência do agente responsável.

Nas três situações apontadas o ato infrator não provocou a sangria de recursos públicos. Todavia, deve ser reprimido. Antes, contudo, o agente responsável deve ser ouvido, a fim de apresentar suas razões de justificativas, isto é, exercer o seu direito de apresentar seu ponto de vista. Por meio da Audiência, portanto, oportuna-se aos responsáveis o direito de exercerem o contraditório e a ampla defesa. O prazo para apresentar as razões de justificativa é de 15 dias (inciso III, art. 202). 

Caso as razões sejam rejeitadas, o fato deverá ser comunicado ao agente responsável (§ 1º, art. 202). 

sexta-feira, 13 de abril de 2018

CONTA ÚNICA DO GOVERNO FEDERAL: O QUE É?

O Banco Central é conhecido como o "Banco dos bancos". Sabe por quê? Porque todos os demais bancos são correntistas dele. É isso mesmo. Assim como eu - ou você-  possuo uma conta bancária  num banco, também os bancos possuem uma conta no Banco Central. Nessa conta eles depositam e retiram grandes somas de dinheiro, igualzinho ao que fazemos com nossas movimentações bancárias. Diariamente, portanto, os bancos sacam e depositam dinheiro nessa conta. Ao final do dia as contas apresentam um saldo, que representará o saldo inicial do dia seguinte. Ela é conhecida como conta de RESERVA BANCÁRIA. 

Pois bem. A Secretaria do Tesouro Nacional também possui uma conta aberta no Banco Central onde são depositados todos os recursos da União, que ingressam por meio de Darf, GPS, GFIP ou GRU. Ou seja, a STN é correntista do Banco Central. Aliás, para quem não sabe, a STN possui uma numeração própria, como se fosse uma instituição financeira. Seu número é 009 (o do Banco do Brasil é 001; Caixa Econômica Federal, 104; Bradesco, 237, etc.) 

É exatamente essa conta que é chamada de CONTA ÚNICA da União. Na prática ela se comporta como se fosse uma conta de reserva bancária, dotada de suas mesmas funcionalidades. 

Quando a União deseja fazer um pagamento a um fornecedor, ela retira dinheiro da Conta Única e o envia para o banco onde o fornecedor é correntista. Em muitas operações as trocas de recursos ocorrem entrem as contas de reservas bancárias dos bancos e a Conta Única. Recebido os recursos da STN o banco então efetiva o pagamento do beneficiário. 

Há muito tempo atrás a Conta Única funcionava no Banco do Brasil. As constantes greves, contudo, paralisavam o BB e travavam toda a movimentação financeira da União. Era um grande transtorno. A solução veio com sua transferência para o Banco Central, instituição não sujeita à greve do sistema bancário. 


terça-feira, 10 de abril de 2018

CONSTITUIÇÃO DO JAPÃO EM INGLÊS

Navegando pela internet a gente encontra muitas coisas. Para os curiosos, segue a Constituição Japonesa em inglês. 

Clique AQUI para acessar o texto na íntegra. 

Boa leitura!!

Alipio Filho

sábado, 7 de abril de 2018

REQUISITOS MÍNIMOS DE SEGURANÇA DOS BANCOS DE DADOS PÚBLICOS


Pouca gente sabe, mas os bancos de dados públicos (entenda-se: os softwares utilizados pelo governo federal, estadual e municipal para administrar os seus negócios) já possuem normativos que fixam requisitos mínimos de segurança. A Lei Complementar nº 131/2009 se referiu a esse banco de dados públicos como Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle (inciso III, § 1º, art. 48, da LC 101/2000, alterado pela LC 131/2009). Posteriormente, a LC 156/2016 dispôs que “todos os Poderes e órgãos referidos no art. 20, incluídos autarquias, fundações públicas, empresas estatais dependentes e fundos, do ente da Federação devem utilizar sistemas únicos de execução orçamentária e financeira, mantidos e gerenciados pelo Poder Executivo, resguardada a autonomia”. A inovação trazida foi profunda e oportuna.

Foi profunda, porque, de agora em diante, cada ente da federação deverá contar com apenas um único banco de dados. Num município, por exemplo, nesse modelo, tanto o poder executivo quanto o poder legislativo municipal deverão compor um só banco de dados. Ora, sabemos que hoje cada chefe de poder adquire os softwares que entender necessários à sua gestão. A partir da LC 156/2016 isso não será mais possível. Os chefes dos poderes deverão definir, em conjunto, o banco de dados que será melhor para a municipalidade devendo, qualquer que seja o banco de dados escolhido, preservar a autonomia de cada poder. Quebra-se um paradigma municipal vivido há anos em que os chefes de poderes geriam suas informações segundo critérios pessoais. Agora tais critérios deverão ser institucionais. A mesma regra deve ser observada pela União e pelos estados e Distrito Federal.

A novidade trazida pela LC nº 156/2016 é também oportuna, na medida em que as informações orçamentárias, financeiras e contábeis dos entes devem ser enviadas para a Secretaria do Tesouro Nacional - STN consolidá-las periodicamente (§ 1º, art. 51, LRF). Ora, é comum, nos pequenos municípios, a falta de diálogo entre os chefes de poder por razões políticas fato que tem prejudicado o processo de consolidação dos dados públicos municipais. A consequência dessa falta de comunicação é que os dados não migram em toda a sua integralidade para a STN prejudicando a consolidação da informação municipal. A partir da unificação dos bancos de dados esse problema será finalmente solucionado, pois o próprio sistema integrado ficará responsável por consolidá-los no âmbito municipal e enviá-los eletronicamente para o sistema da STN.

No tocante aos normativos que fixam requisitos mínimos de segurança do banco de dados, trata-se do Decreto federal nº 7.185/2010 e da Portaria/MF nº 548/2010. Esses normativos disciplinam como os bancos de dados públicos devem preservar as informações nele inseridas, evitando que elas se percam, sofram sinistros ou não representem fielmente a realidade. É importante destacar que, muito embora se tratem de normativos formulados pelo governo federal, eles regulamentam dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, alterada, nesse particular, sucessivamente, pelas Leis Complementares nºs 131/2009 (Lei da Transparência) e 156/2016. Ora, como a Lei Complementar nº 101/2000 é uma lei nacional, então tais normativos também adquirem essa natureza impondo-se, em decorrência, a todos os entes federativos (União, estados, DF e municípios).

Entretanto, os órgãos de fiscalização (ministérios públicos federal e estadual, tribunais de contas, controladorias) ainda não despertaram para a importância de fiscalizarem o fiel cumprimento das diretrizes ali descritas por parte do poder público federal, estadual e municipal.
Passemos rapidamente em revista os principais aspectos neles destacados.

DECRETO nº 7.185/2010

Finalidade do Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle

O sistema integrado de administração financeira e controle utilizado no âmbito de cada ente da Federação, doravante denominado SISTEMA, deverá permitir a liberação em tempo real das informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira das unidades gestoras, referentes à receita e à despesa, com a abertura mínima estabelecida neste Decreto, bem como o registro contábil tempestivo dos atos e fatos que afetam ou possam afetar o patrimônio da entidade (art. 2º).

Abrangência do Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle

Integrarão o SISTEMA todas as entidades da administração direta, as autarquias, as fundações, os fundos e as empresas estatais dependentes, sem prejuízo da autonomia do ordenador de despesa para a gestão dos créditos e recursos autorizados na forma da legislação vigente e em conformidade com os limites de empenho e o cronograma de desembolso estabelecido (§ 1º, art. 2º).

Características do Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle

I - disponibilizar ao cidadão informações de todos os Poderes e órgãos do ente da Federação de modo consolidado;
II - permitir o armazenamento, a importação e a exportação de dados; e
III - possuir mecanismos que possibilitem a integridade, confiabilidade e disponibilidade da informação registrada e exportada (art. 4º)

 PORTARIA/MF nº 548/2010

Requisitos de segurança do Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle

Esse é, talvez, o capítulo mais importantes dos normativos, pois ele trata da qualidade e integridade da informação registrada nos bancos de dados públicos. Vejamos as principais disposições sobre as funcionalidades de segurança:
SISTEMA deverá possuir mecanismos de controle de acesso de usuários baseados, no mínimo, na segregação das funções de execução orçamentária e financeira, de controle e de consulta (art. 2º)

O acesso ao SISTEMA para registro e consulta aos documentos apenas será permitido após o
cadastramento e a habilitação de cada usuário, com código próprio (§ 1º, art. 2º)

O cadastramento de usuário no SISTEMA será realizado mediante:
I – autorização expressa de sua chefia imediata ou de servidor hierarquicamente superior; e
II – assinatura do termo de responsabilidade pelo uso adequado do SISTEMA (§ 2º, ar. 2º)

O SISTEMA deverá adotar um dos seguintes mecanismos de autenticação de usuários:
I código e senha; ou
II certificado digital, padrão ICP Brasil.
Caso seja adotado o mecanismo a que se refere o inciso I do parágrafo anterior, o SISTEMA
deverá manter política de controle de senhas (§§ 3º e 4º, art. 2º).

O registro das operações de inclusão, exclusão ou alteração de dados efetuadas pelos
usuários será mantido no SISTEMA e conterá, no mínimo:
I código do usuário;
II operação realizada; e
III data e hora da operação (art. 3º)

Cópia de segurança do Sistema Integrado de Administração Financeira e Controle

A imposição aos entes de gerarem cópias de seguranças  periódicas do banco de dados (back ups)  é INOVADOR também. Sabemos que nos pequenos municípios, a cada virada de mandato, parte ou a totalidade dos bancos de dados se perdem. Muitas informações são criminalmente apagados. A geração de cópias periódicas preserva todas as informações pondo fim a esse problema crônico que temos enfrentados em todo o País.

Sobre o armazenamento dessas cópias, é de boa prática que elas sejam armazenadas em locais diversos. Uma sugestão é que uma cópia esteja guardada no ministério público, outra no respectivo tribunal de contas e uma terceira na associação dos municípios (caso se trate de ente público municipal).

Vejamos o que diz a Portaria sobre essa obrigatoriedade:

Deverá ser realizada cópia de segurança periódica da base de dados do SISTEMA que permita a sua recuperação em caso de incidente ou falha, sem prejuízo de outros procedimentos (art. 6º).  

Lembrando, por fim, que há muito tempo os bancos de dados públicos já deveriam ter sido integrados. A LC nº 131/2009 estabeleceu prazos para que eles adotassem essa providência. Infelizmente, todavia, passado já muitos anos, quase nada foi feito nesse sentido e quase nada tem sido igualmente cobrado. Vejamos os prazos por ela estabelecidos (incisos I, II e III, art. 73-B, da LRF):

I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes;                   
II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes;                      
III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000 (cinquenta mil) habitantes.                        
Parágrafo único.  Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os dispositivos referidos no caput deste artigo. 

Em síntese, tanto a sociedade quanto os órgãos de fiscalização (ministérios públicos, tribunais de contas, controladorias) já dispõem de ferramentas jurídicas para preservar a qualidade da informação pública veiculada nos bancos de dados. Basta agora arregaçar as mangas e passar a cobrá-las.


ALIPIO REIS FIRMO FILHO

Conselheiro Substituto – TCE/AM

segunda-feira, 26 de março de 2018

EMPRESA ESTATAL DEPENDENTE: CARACTERÍSTICAS

O conceito de empresa estatal dependente encontra-se no inciso III, art. 2º, da LRF. Nesse dispositivo há uma particularidade que merece ser destacada e que quase sempre passa desapercebida dos olhos dos leitores. 

O fato de ser uma empresa estatal dependente não significa, necessariamente, que ela não disponha de receitas próprias para custear suas despesas. O que acontece é que, muito embora haja recursos próprios, eles não são suficientes para cobrir todas as suas despesas. Há, portanto, um déficit entre as receitas e os dispêndios (próprios) que precisa ser fechado. A solução para esse problema vem do ente federado controlador que, lançando mão de suas próprias receitas, transfere recursos para a empresa controlada tornando-a dependente deste (financeiramente falando). 

Em situações mais extremas, é possível que a empresa controlada não disponha de nenhuma receita própria (fato raríssimo, mas que, em termos de probabilidade, é passível de ocorrer, mormente nos pequenos municípios). Em tais casos, o ente federado controlador se torna o principal mantenedor da empresa controlada. Sem essa assistência financeira, ela não conseguirá sobreviver. Nessa hipótese o grau de dependência será ainda maior, visto que não existirá nenhuma disponibilidade de recursos na empresa controlada. É evidente que nesse último cenário o ente federado terá que repensar o custo/benefício de sua política governamental em criar empresas estatais sem que elas caminhem com pernas próprias. Em tais circunstâncias, a empresa controlada funcionará à semelhança de uma secretaria, ou seja, dependerá inteiramente do tesouro central para tocar suas atividades. Isso poderá redundar na revisão da política adotada pelo ente federado quanto à criação e manutenção de suas empresas controladas, já que o modelo poderá estar onerando os cofres públicos levando-se em consideração a carga tributária incidente sobre a atividade empresarial. Por outro lado, é possível também que o modelo seja mantido dada a compatibilidade entre o custo e os benefícios daí decorrentes, aliado à essencialidade da atividade econômica desenvolvida. Tudo dependerá, certamente, das particularidades de cada caso. 

Uma dúvida: as receitas de uma empresa estatal dependente (se existirem) devem integrar o orçamento fiscal do ente controlador? Tomemos por referência o que dispõe o art. 5º da Lei nº 13.473/2017 – Lei das Diretrizes Orçamentárias da União para o exercício de 2018: “Os Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social compreenderão o conjunto das receitas públicas, bem como das despesas dos Poderes, do Ministério Público da União e da Defensoria Pública da União, seus fundos, órgãos, autarquias, inclusive especiais, e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, das empresas públicas, das sociedades de economia mista e das demais entidades em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto e que dela recebam recursos do Tesouro Nacional, devendo a correspondente execução orçamentária e financeira, da receita e da despesa, ser registrada na modalidade total no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – Siafi”. O dispositivo dissipa qualquer dúvida. Portanto, as receitas das empresas controladas dependentes deverão integrar o orçamento fiscal e da seguridade social do respectivo ente controlador.

Clique AQUI  e veja a relação das empresas federais dependentes do governo federal. 

sábado, 10 de março de 2018

QUESTÃO DE CONCURSO PÚBLICO COMENTADA: CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO


(CESP-UNB/2012/Auditor/TCE-ES) A respeito das normas brasileiras de contabilidade aplicadas ao setor público, julgue o item a seguir.

O apoio à tomada de decisões em processos de compras ou de aluguel,  de produção ou de terceirização, a redução de custos e a melhoria dos gastos são objetivos do Sistema de Informação de Custos do Setor Público.

O Sistema de Informação de Custos do Setor Público é regulado pela Resolução CFC 1.366/11 (NBC T 16.11). O conteúdo da afirmativa está referenciado no tópico 3, alínea “c”, da norma. A preocupação com a mensuração dos custos no setor público foi uma das novidades introduzidas pela convergência da esfera governamental brasileira aos padrões internacionais de contabilização. Além do apoio à tomada de decisão, também constituem objetivos do Sistema:

1 - mensurar, registrar e evidenciar os custos dos produtos, serviços, programas, projetos, atividades, ações, órgãos e outros objetos de custos da entidade;
2 - apoiar a avaliação de resultados e desempenhos, permitindo a comparação entre os custos da entidade com os custos de outras entidades públicas, estimulando a melhoria do desempenho dessas entidades;
3 - apoiar as funções de planejamento e orçamento, fornecendo informações que permitam projeções mais aderentes à realidade com base em custos incorridos e projetados;
4 - apoiar programas de controle de custos e de melhoria da qualidade do gasto.

Afirmativa: correta.


QUESTÃO DE CONCURSO PÚBLICO COMENTADA: CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO


(CESPE/2016/Perito Criminal – Ciências Contábeis/Polícia Científica--PE)  Conforme o disposto nas Normas Brasileiras de Contabilidade aplicadas ao setor público, o objeto da CASP é
A) um conjunto de procedimentos administrativos que objetivam adquirir materiais, contratar obras e serviços, alienar ou ceder bens a terceiros, observando os princípios da administração pública.
B) a mensuração, a estruturação e as variações que geram reflexos no patrimônio público, além de apresentar temas específicos, como o sistema de custos.
C) determinar os valores pelos quais os elementos patrimoniais devem ser reconhecidos e apresentados nas demonstrações contábeis.
D) o conjunto de direitos e de bens, tangíveis ou intangíveis, onerados ou não, que seja portador ou represente um fluxo de benefícios, presente ou futuro, inerente à prestação de serviços públicos ou a exploração econômica por entidades do setor público e suas obrigações.
E) o orçamento público, contendo a discriminação da receita e da despesa de forma a evidenciar a política econômico-financeira e o programa de trabalho do governo. 

O objeto da Contabilidade Aplicada ao Setor Público é o patrimônio. A alternativa D reproduz o conteúdo do patrimônio das entidades do setor público públicas. Gabarito: D.


QUESTÃO DE CONCURSO PÚBLICO COMENTADA: CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO

CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO: CONCEITO, OBJETO, OBJETIVO, CAMPO DE ATUAÇÃO

(CESPE/2016/Auditor Fiscal de Controle Externo – Contabilidade/TCE--SC)  A respeito do campo de aplicação e dos objetivos da contabilidade pública, julgue o item a seguir.

Os objetivos da contabilidade aplicada ao setor público incluem informar os usuários da informação contábil relativa às mutações do patrimônio das entidades do setor público.

Como ramo da Ciência Contábil, o objetivo fundamental da Contabilidade Aplicada ao Setor Público é informar. Tendo em vista ser o patrimônio o seu objeto, obviamente que essa informação compreenderá as alterações (mutações) que nele ocorrerem para bem orientar os seus usuários. Gabarito: correta.

sábado, 3 de fevereiro de 2018

ESTÁGIO DA PREVISÃO DA RECEITA ORÇAMENTÁRIA: O QUE É?


Prever receitas orçamentárias significa tentar antever o volume de recursos que ingressará nos cofres públicos no exercício seguinte. A regra é a seguinte: se o orçamento se referir ao exercício de 2020, a previsão da receita deve ser realizada no exercício anterior, isto é, em 2019, ano em que será elaborada a proposta orçamentária para ser encaminhada ao legislativo (federal, estadual, distrital, municipal). A orientação é consequência do fato de em nosso País o período de vigência do orçamento público coincidir com o ano civil[1].   O ato de previsão não se mostra, assim, como uma tarefa fácil. É, antes de mais nada, atividade complexa e desafiadora, exigindo conhecimentos matemáticos, estatísticos e de conjuntura econômica, dentre outros. 

A Lei nº 4.320/64 fez referência a ele em seu art. 30, verbis:
a estimativa da receita terá por base as demonstrações[2] a que se refere o artigo anterior, a arrecadação dos três últimos exercícios, pelo menos, bem como as circunstâncias de ordem conjuntural e outras, que possam afetar a produtividade de cada fonte de receita.
O dispositivo assenta o ato de previsão da receita em duas bases: uma de natureza arrecadatória, relacionada ao volume de recursos arrecadados e uma segunda, de natureza circunstancial, em que deverão ser identificadas as variáveis que poderão concorrer para sua oscilação.

A respeito do volume dos recursos, o artigo determina que devem ser considerados não apenas o volume arrecadado no exercício em curso, mas também nos três últimos exercícios. A orientação visa primordialmente fazer com que o gestor possa ter elementos concretos acerca do nível arrecadado e se esse nível tem oscilado ao longo do tempo. Em caso afirmativo, deverá ser investigada qual foi a causa do movimento brusco, se ordinária ou extraordinária, isto é, se decorre de circunstâncias naturais ou não. Essa análise permitirá obter dados objetivos no tocante ao comportamento dos movimentos arrecadatórios que, por sua vez, serão muito úteis na projeção dos recursos a serem futuramente arrecadados.  As causas assim identificadas poderão ser, inclusive, de ordem conjuntural, consoante alude a parte final do dispositivo (inflação/deflação/preços estáveis, recessão/produção, câmbio estável/oscilante, política fiscal,  etc.) ou qualquer uma outra, considerada significativa e capaz de influenciar o ingresso dos recursos no futuro.     

Nesse contexto, a Lei Complementar nº 101/2000 conferiu mais concretude ao que  dispôs a Lei nº 4.320/64. Ela deu mais detalhes do que deve ser considerado no ato de prever receitas orçamentárias. Seu art. 12 determinou que as previsões da receita pública (i) observarão as normas técnicas e legais, (ii) considerarão os efeitos das alterações na legislação, da variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e (iii) serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção para os dois seguintes àquele a que se referem, e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas.

Note que algumas variáveis não eram referidas explicitamente no corpo do texto da Lei nº 4.320/64, a exemplo do dever de observar as normas técnicas e legais ou do índice de preços. Assim, a nova disposição definiu melhor os procedimentos que deverão ser adotados pelo administrador público nessa importante fase da receita pública. Ele também inovou quanto à necessidade de projeção das receitas não apenas para o exercício em que vigorará a nova lei-de-meios, mas também para o imediatamente a seguir, computando, portanto, dois exercícios e não apenas um como até então era realizada.   

Por sua vez, o MCASP - 7ª Edição lembra que, no âmbito federal,

a metodologia de projeção de receitas orçamentárias busca assimilar o comportamento da arrecadação de determinada receita em exercícios anteriores, a fim de projetá-la para o período seguinte, com o auxílio de modelos estatísticos e matemáticos. A busca deste modelo dependerá do comportamento da série histórica de arrecadação e de informações fornecidas pelos órgãos orçamentários ou unidades arrecadadoras envolvidas no processo. A previsão de receitas é a etapa que antecede à fixação do montante de despesas que irão constar nas leis de orçamento, além de ser base para se estimar as necessidades de financiamento do governo.[3]

É evidente que a metodologia de previsão a ser utilizada dependerá da espécie de receita orçamentária que se pretende projetar, o que torna o processo de previsão da receita pública bem mais complexo. Dado o objetivo de nosso curso, não faremos maiores abordagens sobre o tema, ao mesmo tempo em que sugerimos ao leitor que, se desejar, aprofunde seus estudos a partir das fontes aqui referidas ou de outras julgadas pertinentes.

O estágio da previsão realiza-se por meio da publicação da lei orçamentária no órgão de imprensa oficial (diários oficiais). A publicação traz consigo dois efeitos: um jurídico e outro contábil que repercutirão, respectivamente, no mundo jurídico e no mundo contábil. Interessa-nos o último. Desta feita, no mundo contábil o ato será marcado por um  registro contábil correspondente, iniciando o processo de escrituração da receita orçamentária no setor governamental. A informação contabilizada será puramente de natureza orçamentária, movimentando contas das Classes 5 (Controles da Aprovação do Planejamento e Orçamento) e 6 Controles da Execução do Planejamento e Orçamento). Sinteticamente, esse estágio será marcado pelo seguinte registro contábil:

D- Previsão Inicial da Receita
C – Receita a Realizar  



[1] Art. 34 da Lei nº 4.320/64.
[2] As demonstrações às quais se refere o dispositivo correspondem às demonstrações mensais da receita arrecadada prevista no art. 29 do mesmo Diploma Legal.
[3] MCASP, p. 56.

NORMA-ORIGEM E NORMA-DERIVADA: O QUE É?



É sabido que o ordenamento jurídico corresponde ao conjunto das normas jurídicas (normas e princípios) de um país. Por outro lado, também é de conhecimento de todos que em seu interior as normas não estão dispostas ao acaso. Pelo contrário. O próprio ordenamento pressupõe a disposição de suas normas de maneira organizada, sistemática, daí, inclusive, o termo “ordenamento”, significando algo ordenado, isto é, disposto segundo uma ordem. Portanto, as normas que compõe um ordenamento jurídico não são dispostas a  esmo, de qualquer jeito. Elas seguem uma organização, uma disposição, de tal maneira que uma se compatibiliza com as demais formando um todo harmonizado.

Por sua vez, é imperioso destacar também que cada norma representa uma função no ordenamento jurídico. Não nos referimos propriamente à função de legislar sobre determinada matéria (direito financeiro, direito do trabalho, direito civil, etc.). Referimo-nos ao aspecto funcional mesmo de cada norma jurídica, isto é, à sua funcionalidade enquanto umas em relação às outras.  Nesse particular, ganha especial relevância a classificação das normas nos ordenamentos jurídicos e, dentro dessa classificação, merece acolhida a propositura do Prof. Tércio Sampaio Ferraz Júnior[1], construída a partir de critérios gerais sintáticos, semânticos e pragmáticos. Dentre esses critérios, é oportuna a classificação normativa de natureza sintática por levar em conta a comparabilidade entre as normas, tendo em vista justamente a função que cada uma desempenha no ordenamento jurídico.

Na classificação normativa de natureza sintática existe aquela que classifica as normas do ordenamento jurídico levando em consideração o aspecto da subordinação  entre as normas. Nessa modalidade classificatória distinguem-se as normas-origem e as normas-derivadas. Conforme as respectivas nomenclaturas fazem referência, as primeiras são a base das últimas enquanto estas decorrem das primeiras. Há uma certa dependência entre as duas categorias de normas. Na verdade, segundo o Prof. Tércio Júnior, há uma relação hierárquica entre ambas: as normas-origem são superiores às normas-derivadas. Em consequência dessa hierarquização as normas-derivadas não podem contrariar sua norma-origem, sob pena de serem consideradas inválidas.

No embate entre o Direito Material e o Direito Processual essa forma de pensar o Direito é muito útil.

Já é pacífico na Doutrina o fato de o Direito Processual funcionar como instrumento do Direito Material. Em última análise, a norma processual realiza a norma material, fazendo-a valer, na prática. Na verdade, o que há entre ambos é uma relação de completude. A regra processual completa a regra material formando um todo harmônico. Nessa forma de pensar o Direito, conquanto sejam ramos distintos da Ciência Jurídica, não há como negar o caráter derivado do Direito Processual. Gonçalves Marcus Vinícius Rios[2] já disse uma vez que “Os esforços dedicados à conquista da autonomia do processo civil levaram ao surgimento da ciência processual, ramo independente do direito. Mas alguns institutos de direito processual só são compreensíveis quando examinados à luz da relação que deve haver entre o processo e o direito material. É o caso, por exemplo, da ação e de suas condições. É impossível examinar a legitimidade ad causam dos litigantes, sem referência ao direito material alegado (grifamos).

Recorramos ao Instituto da curatela para melhor Ilustrar o que foi dito.

O Código Civil prevê o Instituto nos incisos I e II de seu art. 1.728, reconhecendo o Direito. Por sua vez, o Código de Processo Civil dispõe sobre os limites em que o Instituto poderá ser usufruído e como isso se dará. É a hipótese da tutela provisória de urgência (inciso I, parágrafo único, do art. 9º) que a norma processualística impede que sofra a  incidência da regra contida na norma cabeça[3] do mesmo dispositivo.

Portanto, de acordo com a classificação proposta, o Direito Processual é essencialmente uma norma-derivada enquanto o conteúdo do Direito Material é marcado por características de uma norma-origem. É bem verdade, porém, que não há exclusividade dessas matizes em cada um dos ramos apontados. Em outras palavras, aqui ou ali iremos encontrar elementos no Direito Processual que são mais de índole material que propriamente processual. O inverso também é verdadeiro no tocante ao Direito Material. Conquanto não perca suas características de norma-origem, vez ou outra alberga, em seu interior, distintivos  próprios do Direito Processual. Eu diria que a questão é mais de prevalência – e não de exclusividade - de uns elementos sobre os outros.

Cada um dos ramos mencionados comporta o que a Doutrina Jurídica nominou de Institutos Jurídicos.  Segundo Paulo Nader[4], o Instituto Jurídico é a reunião de normas jurídicas afins, que rege um tipo de relação social ou interesse e que se identifica pelo fim que procura realizar. Ihering chamou-os de corpos jurídicos, para distingui-los de simples matéria jurídica. Exemplo de Institutos Jurídicos no Direito Material seriam o “casamento”, “a posse”, “a falência” e o “domicílio”. Já “mandado de segurança” e “prisão provisória” são Institutos Jurídicos notadamente encontrados nas normas processuais. Nesse sentido, também os recursos previstos na norma processual seriam Institutos Jurídicos (apelação, agravo de instrumento, agravo interno, embargos de declaração, recurso ordinário, recurso especial, recurso extraordinário, agravo em recurso especial ou extraordinário e embargos de divergência). Essa acepção está rigorosamente de acordo com a concepção proposta por Paulo Nader uma vez que os recursos (i) reúnem normas jurídicas afins (o capítulo que trata dos recursos nos códigos e nas leis ocupam compartimentos específicos dentro das normas onde são regulados); (ii) regem um tipo de relação social ou interesse (a relação se põe entre órgão julgador – que procura aplicar a norma jurídica/reapreciar a matéria já julgada  – e o recorrente) e (iii) que se identifica pelo fim que procura realizar (rediscussão e revisão da matéria já julgada). As “simples matérias jurídicas” referidas por Ihering dizem respeito, essencialmente, à operacionalidade dos Institutos Jurídicos. Elas, por assim dizer, colocam os Institutos em movimento, realizando-os no mundo jurídico. Ocupam, portanto, a parte periférica das relações jurídicas – conquanto não menos importante -, à maneira de satélites que orbitam em torno de um corpo celeste. Numa palavra: as matérias jurídicas adjetivam os institutos. É como se fossem normas-sujeito (os institutos) e normas-predicado (as matérias).      

É forçoso concluir, portanto, que há uma relação de dependência entre as matérias e os Institutos Jurídicos. Com efeito, não é razoável pensarmos em Institutos dissociados de suas respectivas matérias; e nem de matérias separadas de seus institutos. Ou seja, um depende do outro. Há também aqui, como outrora apontado na relação dos Direitos Material e Processual, uma relação de completude.  



[1] Professor Titular da Faculdade de Direito da USP.
[2] In Direito processual civil esquematizado-São Paulo: Saraiva,2011, p. 37.
[3] Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
[4] In Introdução ao Estudo do Direito”, Rio de Janeiro: Forense, 1998, 16ª ed., p. 100.