terça-feira, 22 de setembro de 2020

SOBRE O GRAU DE LETALIDADE DO NOVO CORONAVÍRUS

(*) Texto publicado na coluna do autor, no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)


A taxa de mortalidade da Covid-19 está nivelada por baixo. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o número de mortos é de 962.008. Ou seja, próximo de 1 milhão de pessoas. O painel do Google reconhece um número ligeiramente diferente desse: 965.529.  Esses números retratam metade da população de Manaus, aproximadamente.

 Segundo a wilkipédia, a população mundial cravou 8,6 bilhões de pessoas em julho deste ano.

É pouco o número de mortos? Respondo: falar em poucas mortes é desconfortável, porque parece que precisariam morrer mais pessoas para admitirmos a gravidade. Morte é morte. 1 ou 1 milhão não importa. O ideal é que ninguém tivesse morrido. Além disso, a morte de uma única pessoa representa também a morte de seus familiares e amigos, pois quem morre deixa atrás de si um rastro de dor e sofrimento. Por essa ótica, o número de mortos é muito maior.

Mas não me refiro a esse fato quando afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo. Também não digo que há erro na contagem. O número expressa, relativamente bem, a dimensão das mortes no mundo causada pelo novo coronavírus. Se o número de mortos for um pouco mais (ou pouco menos) que 1 milhão de pessoas, a meu ver, a diferença é insignificante, pois a estatística já cumpriu o seu papel: já nos deu uma ideia, ainda que estimada, do número de pessoas que vieram a óbito. Nesse terreno, a precisão é desprezível.

Afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo porque a Covid-19 possui várias travas: distanciamento/isolamento social e o uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros, por parte da população em geral.

O que quero dizer é que só teríamos uma real ideia do número de mortos por Covid-19 no mundo e, por extensão, de seu real grau de letalidade, se não existissem essas travas.

Elas funcionam como verdadeiras barreiras protetoras, semelhantemente às paredes das hidrelétricas, que seguram a massa d’água. Apenas parte do rio é que desce através dela, fazendo girar as turbinas.

Com efeito, o número de mortos por Covid-19 expressa apenas o “filete de água” que passou pela parede das medidas preventivas (distanciamento/isolamento social, uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros).

Mas a estatística pode nos ajudar nesse trabalho. Quantas pessoas teriam morrido por Covid-19 se não existissem as referidas travas?

A última grande epidemia global foi a que assolou o mundo entre 1918/1920. Matou entre 50 a 100 milhões de pessoas. Considerando que a população mundial em 1920 era de 1 bilhão, 834 milhões de pessoas, percentualmente falando, o número de mortes oscilou entre 2,73 % (para 50 milhões de mortos) e 5,45 % (para 100 milhões de mortos).

Tais percentuais foram obtidos dividindo-se o número de mortos pelo número da população mundial naquela época.

Pois bem. Como informado, o planeta conta na atualidade com 7 bilhões e 800 milhões de indivíduos. Ora, aplicando sobre ela os referidos percentuais, o número de mortes na atualidade pela covid-19 oscilaria entre 213 milhões e 425,1 milhões de pessoas, ou seja, um número muito superior às mortes por covid-19, que, até agora, ficou abaixo de 1 milhão de pessoas.

Considerando o primeiro cenário, é como se morressem toda a população do Brasil (estimada em 211 milhões de pessoas); ou, tomando por referência o segundo cenário, isso equivale ao óbito de toda a população da américa do sul (estimada em 418 milhões de pessoas). A comparação com a pandemia de 1918/1920 é válida pois naquela época não havia as medidas preventivas que contamos na atualidade (uso de máscaras, álcool em gel, distanciamento/isolamento social, meios de comunicação em massa). Na comparação que fiz com a hidrelétrica, é como se não existisse parede alguma de contensão e a massa d'água fluísse com todo o seu vigor.

Entretanto, muito provavelmente o número de mortos na atualidade seria superior. Em razão de um dado simples: a mobilidade humana em nossos dias não se compara com a do início do século passado. Hoje a possibilidade de contato social é infinitamente superior o que indubitavelmente elevaria, a proporções geométricas, o número de infectados e de óbitos no mundo.

Por essa perspectiva, talvez, estaríamos testemunhando números apocalípticos: 600 milhões de mortos? 800 milhões de mortos? 1 bilhão de mortos? Ou muito mais que isso?

É um caso a pensar.

Num cenário como este, o melhor e mais bem equipado sistema de saúde do mundo teria sucumbido. Não seria páreo para um número de atendimentos tão grande. O mesmo se diga dos serviços funerários. Gigantescas covas coletivas teriam que ser abertas. Muitas delas, talvez, várias vezes  superiores aos de um campo de futebol. Algo estarrecedor. Sem precedentes na História da Humanidade.  

No início do século passado, portanto, tivemos uma ideia do poder mortal virótico  e de sua capacidade destrutiva. De se ressaltar que o novo coronavírus é da mesma família do vírus que causou a referida pandemia.

Diante de estatísticas como essa, dirijo-me agora àqueles que teimam em criticar as medidas de prevenção adotadas pelas autoridades de saúde: quando você abrir sua boca para criticar as medidas de profilaxia adotadas, melhor permanecer em silêncio. Seja sábio (a) e não ignorante.

“Até o insensato passará por sábio se ficar quieto e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento” (Provérbios 17: 28)


BOM DIA!

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto - TCE/AM e Doutorando em Gestão

sábado, 12 de setembro de 2020

O FUTURO DA LAVA-JATO

(*) Artigo publicado no Fato Amazônico, na Coluna do autor (www.fatoamazonico.com.br) 

Completando seis anos de existência, a Lava-Jato tem colecionado simpatizantes e críticos ferrenhos. Ela foi responsável por investigações bombásticas que sacudiram os alicerces da República. Até então, figurões nunca tinham ganhado a mídia com tanta frequência. Principais personagens de histórias de um mesmo enredo: a corrupção.

Evidentemente que podem ter ocorridos excessos, mas as virtudes, sem sombra de dúvidas, foram infinitamente superiores. Ela mais deu do que retirou do Patrimônio moral nacional.

Nada obstante os avanços, a Lava-Jato tem perdido força já há algum tempo. Principalmente depois da saída de seu principal articulista: Sérgio Moro. Desde quando deixou a Magistratura para ocupar o cargo de Ministro da Justiça no Governo Bolsonaro, a Lava-Jato, de certa forma, não foi mais a mesma. Curiosamente, testemunhamos o que nós, brasileiros, apaixonados por futebol, costumamos observar  nos gramados. Às vezes, quando o principal jogador de um time deixa o campo ou não rende o suficiente, as coisas começam a travar. Perde-se poder ofensivo. O caminho do gol parece que fica mais distante. O entrosamento não acontece. Até parece que os demais jogadores desaprenderam a jogar futebol.  

Não foi diferente com a Lava-Jato após a saída de Sérgio Moro.

Uma segunda baixa veio com a saída de Deltan Dallagnol meses depois. Por motivos de saúde da filha, Deltan deixou a Lava-Jato e também um grande vazio se instalou na foça tarefa.

Seus algozes aproveitaram o momento de vulnerabilidade e investiram forte contra Deltan, mediante denúncias contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Especialmente uma delas, movida pelo Senador Renan Calheiros, surtiu o efeito esperado na semana que passou. Por nove votos contra um o Conselho aplicou a pena de censura ao Procurador da República, acolhendo a queixa de Renan Calheiros segundo o qual Deltan havia interferido nas eleições à presidência do Senado em 2019. No entanto, o mais curioso é que foi a Advocacia Geral da União que recorreu de uma decisão do Ministro Celso de Mello, que havia suspenso o processo no CNMP. Nem mesmo o interessado – Renan Calheiros – havia tomado essa inciativa. Devido à ausência do Ministro por razões de saúde, o recurso foi analisado pelo Ministro Gilmar Mendes que decidiu pela retomada do processo contra Deltan.   

Em meio a tudo isso, o futuro da Lava-Jato se torna incerto. Não sabemos até onde ela terá fôlego para suportar os próximos golpes que certamente continuarão. Às vezes da parte de quem foi pego por ela na boca da botija. Às vezes da parte de quem discursou nas eleições de 2018 que caminharia de mãos dadas com a justiça e lutaria ferrenhamente contra a corrupção. Uma enganação. 

Como diz os evangelhos: “Nada há de escondido que não venha a ser revelado, nem oculto que não venha a ser conhecido” (Mt 10, 26).

Fica a lição: não é fácil ser justo num país injusto. As cicatrizes, às vezes, são inevitáveis.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão