quarta-feira, 24 de março de 2021

MORO, LULA E A SEGUNDA TURMA DO STF

 (*) Texto publicado na Coluna Gestão, do autor, no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)

A decisão da Segunda Turma do STF de considerar o ex-juiz Sérgio Moro parcial no processo da Lava-Jato, quanto às condenações relacionadas ao ex-presidente Lula, merece grandes e profundas reflexões por parte de todos nós brasileiros. O impacto foi brutal em vários compartimentos desta Terra tupiniquim.

A consequência primeira do fatídico decisório – e também a mais importante – foi a sensação de termos voltado à estaca zero. Um sentimento de completa impotência diante de tantos desmandos e atrocidades que desfilaram diante de nós ao longo dos últimos 5 anos. Parecia, finalmente, que a certeza da impunidade tinha chegado ao fim neste País ou, ao menos, que o arsenal legal reservado aos contumazes transgressores da lei e da ordem  - os chamados “peixes grandes” – seria a eles apresentado. De quebra, restaria cumprido um dos mais significativos direitos fundamentais: “Todos são iguais perante a lei”. Sem exceções. Sem meias palavras.

Ledo engano. Continuamos na mesma.

E o que é pior: a reviravolta se deu em “socorro” ao princípio do “devido processo legal” que, ao menos para a maioria da Segunda Turma, foi mais do que suficiente para sepultar um arsenal de esforços e dinheiro público no combate ao crime organizado.

O voto proferido pelo recém-empossado Ministro Nunes Marques foi brilhante. Parafraseando o próprio Ministro Gilmar Mendes em sua fala, Marques afirmou que  “não se combate crime legitimando outro crime”. Ele se referia ao modus operandi que o ex-presidente Lula recorreu para colher as supostas “provas” que atestavam a parcialidade de Moro. De acordo com o art. 10 da Lei n. 9.296/1996, que regulamentou o inciso XII, do art. 5º, da Constituição Federal, “constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei”.

"Se o hackeamento fosse tolerado como meio para obtenção de provas, ainda para defender-se, ninguém mais estaria seguro de sua intimidade, de seus bens e de sua liberdade, tudo seria permitido. São arquivos obtidos por hackers, mediante a violação dos sigilos ilícitos de dezenas de pessoas. Tenho que são absolutamente inaceitáveis tais provas. Entender-se de forma diversas, que resultados de tais crimes seriam utilizáveis, seria uma forma transversa de legalizar a atividade hacker no Brasil”, afirmou Nunes Marques. Acrescentou: “a sociedade viveria processo de desassossego semelhante às piores ditaduras” se isso acontecesse. “Não é isso que deve prevalecer nas sociedades democráticas. A forma importa na democracia tanto quanto o conteúdo.”

Outro aspecto que o Ministro Marques chamou a atenção foi em relação ao debate ter sido num Habeas Corpus cuja natureza, segundo ele, não oportuniza o contraditório e a ampla defesa o que impossibilitou a oitiva do ex-juiz Sérgio Moro para apresentar suas contrarrazões. A discussão do tema em sede de HC vai contra inúmeros julgados do próprio STF, arrematou. Portanto, não houve o necessário contraditório. É como se alguém amarrasse uma vítima e a esbofeteasse até a morte, sem qualquer chance de defesa para o vulnerável.

E aí? Onde fica mesmo o devido processo legal?  É seletivo? Vale apenas para alguns, para outros não? Cadê o respeito à forma processual adequada? Pior: à guisa de cumprir um princípio processual descumprem-se outros dois, igualmente caros às normas processualísticas: o Contraditório e a Ampla Defesa.

Não bastasse tais alegações, há outras questões que precisavam ter sido enfrentadas para melhor encaminhamento dos entendimentos.

Conquanto haja objeção explícita insculpida no corpo dos direitos fundamentais de nossa Carta Magna repelindo o uso de provas ilícitas no processo, consolidou-se no Brasil uma linha doutrinária e jurisprudencial no sentido de admiti-las para fins de defesa dos réus nos processos em determinadas situações. Foi nessa linha que foi construída a defesa do ex-presidente. 

No caso específico envolvendo o ex-juiz Sérgio Moro, a defesa de Lula alegou a parcialidade no seu julgamento, sustentada em troca de mensagens entre o magistrado e alguns procuradores envolvidos na operação Lava-Jato. Aqui, nascem alguns senões: as provas produzidas no processo, responsáveis por incriminar Lula da Silva, foram fraudadas? E, se foram, a autoria da prova fraudulenta pode ser atribuída, de maneira INQUESTIONÁVEL, ao ex-magistrado? Ou, dito de outra forma, ainda que tenham sido consideradas fraudadas as provas, é possível vincular a conduta de Moro à fraude perpetrada?

Se as respostas a tais questionamentos foram, respectivamente, NÃO, NÃO, NÃO então, a meu ver, há margem suficiente para “se esticar” o debate e questionar a solidez da decisão adotada. Se, nada obstante as trocas de mensagens, as provas permanecem robustas, então por que descarta-las??? Isso me cheira a puro preciosismo processual.  

Se houve crime, conforme alega a defesa de Lula, caberá a ele a responsabilidade de provar o fato criminoso (parcialidade do ex-juiz) mediante a oferta de elementos capazes de sustenta-lo, a saber, (i) nexo de causalidade, (ii) autoria, (iii) materialidade e (iv) resultado. Alguém poderia objetar: mas tais responsabilidades são mais costumeiramente aplicáveis aos acusadores nas ações penais e não aos réus. Lembro, todavia, que no novo campo de debate – inaugurado por Lula da Silva – é ele, o ex-presidente, o autor; e Moro o acusado. Os polos se invertem. O Direito não é algo fechado, pronto e acabado. Muito pelo contrário. Se é Ciência, ele deve, como todo conhecimento científico, buscar a verdade OBJETIVA, não subjetiva. As condições de autor e réu não devem se prender ao início da ação judicial, como se fosse algo estático e inalterável. Dependendo do que for debatido no processo, os papéis podem perfeitamente se alternar ao longo da discussão processual. Quem era autor assume o papel de réu; e quem era réu reveste-se da condição de autor. As responsabilidades de quem assume o novo papel processual vão juntas ou, ao menos, deveriam ir.  

A meu ver, um outro argumento que reforça esta essa linha de entendimento molda-se às consequências do decisório.

Conforme mencionado na inicial desses comentários, a decisão da Segunda Turma deletou 5 anos de investigações. Jogou-se fora tempo e dinheiro públicos. Isso tudo sem contar os esforços dos inúmeros magistrados que se debruçaram sobre os autos envolvendo o ex-presidente nas três instâncias da justiça federal com passagens, inclusive, pelo crivo do próprio STF. Portanto, a decisão que viesse a ser adotada – dada a magnitude de suas consequências – deveria ter pavimentado todo o terreno dos debates, a fim de que todos os pontos controversos fossem suficientemente esclarecidos, à luz do melhor Direito e da boa Doutrina.

Acredito que o judiciário penal nacional deva avançar na discussão de embates envolvendo provas materiais e normas processuais. Indubitavelmente, ambas são importantíssimas na produção de decisórios, mas as primeiras não podem sucumbir, cegamente, às últimas; sob pena de o Direito se desgarrar da Justiça.

Ainda reluto em aceitar a rejeição sumária de provas contundentes nos processos que reúnem, de uma só vez, todas as características do delito cometido (autoria, materialidade, nexo de causalidade) simplesmente pelo fato de não terem sido supervisionadas pela autoridade judicial (magistrado). Isso é limitar o dinamismo da Ciência jurídica e esvaziar o debate na busca da verdade real e na distribuição da justiça. É o caso de vídeos em que aparece um sujeito colocando dinheiro na mala, na meia, na cueca e em outros redutos do corpo humano, mas que foram descartados do processo, simplesmente por não terem recebido a prévia autorização judicial. Também as interceptações telefônicas não autorizadas contam-se entre eles.

Por fim, nenhuma linha de discussão foi construída a respeito da INTEGRIDADE das mensagens trocadas entre Moro e os procuradores da Lava-Jato. O Ministro Nunes Marques chamou a atenção para essa lacuna em seu Voto. Nenhum conteúdo das mensagens veio à discussão na Segunda Turma o que exigiria a concorrência do ex-juiz Sérgio Moro para apresentar suas contrarrazões.

Seria preciso fazer um paralelo entre o conteúdo das mensagens oferecidas por Lula e o conteúdo das mensagens constantes nos celulares de Moro, Dallagnol e demais procuradores. Avaliar se havia absoluta correspondência entre ambos. Qualquer desalinhamento entre eles já militaria em desfavor da acusação protagonizada por Lula. Porém, nada foi discutido a esse respeito o que, como disse, semeia dúvida quanto à solidez do decisório.

Finalizo esses comentários compartilhando o trecho de um comentário que me foi repassado por um amigo meu que é professor na Universidade de Cambridge:

“Pobre Brasil!! Seguidos recordes diários de mortes por Covid e a paralisação da atividade econômica não bastavam. Para completar o caos, faltava uma decisão jurídica que não apenas jogasse no lixo os esforços de combate à corrupção dos últimos anos, mas ainda sinalizassem para corruptos que eles não correm riscos. Apenas os que os enfrentam. O passo seguinte será punir quem ousou rebatê-los. Políticos corruptos serão elevados a mártires injustiçados. Quem ousará combater corruptos depois disso? Roberto Campos tinha razão: “uma tragédia como a brasileira não é obra do acaso, mas sim o esforço determinado de décadas”.

E eu pensava que este País estava começando a se curar de suas feridas...Engano meu!!! Nossas chagas parecem INCURÁVEIS!!!

       

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão

      

domingo, 21 de março de 2021

COMO VAI A CAMPANHA DE IMUNIZAÇÃO DOS AMERICANOS CONTRA A COVID-19?

(*) Texto publicado na Coluna Gestão, do autor, no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br) 

Perante o mundo, os EUA se tornaram a prova viva da brutal diferença entre governos negligentes e governantes comprometidos e responsáveis em tempos de pandemia. Eles viveram ambas as realidades. Até 19 de janeiro deste ano, quando Trump ainda ocupava a Casa Branca, o quadro que se desenhava no País era cheio de incertezas e retrocessos. Com a chegada de Biden a Washington o cenário mudou radicalmente.

A primeira vacina foi aplicada em território americano no dia 14 de dezembro de 2020. Uma semana antes ela havia começado no Reino Unido e duas semanas depois fora iniciada na União Europeia. Em 19 de janeiro do corrente ano, véspera da chegada de Biden ao governo americano, haviam sido aplicadas 15,71 milhões de doses de vacinas. Ou seja, em 37 dias a média diária de vacinados foi de 424.594 americanos. Naquela mesma data, o número de mortes por Covid-19 alcançou 2.564,14. Esse pico evoluiu, chegando a seu ponto máximo em 14 de janeiro deste ano quando o número bateu 3.422,29. No dia 19, véspera de Trump passar o bastão para Biden, o número de mortes foi ligeiramente menor que isso: 3.056,86 de falecidos.      

Uma das promessas de campanha de Jo Biden era vacinar 100 milhões de americanos nos 100 primeiros dias de seu governo. Uma tarefa difícil, é bem verdade, diante do caos que se encontrava a política de enfrentamento à Covid-19 nos EUA. Uma dura herança de seu antecessor. No entanto, Biden foi além. Superou a própria meta. E com folga!! Muita folga!! Precisou de apenas 59 dias para cumprir a promessa. Hoje – 20 de março - já são  121,44 milhões de americanos vacinados. Quase o dobro do número de pessoas vacinadas na China (70 milhões). Daquele total, 105,73 milhões pessoais foram vacinadas no seu governo. Uma média diária de 1,762 milhões de americanos vacinados.  

Mas ele prometeu mais. Alguns dias após assumir o governo, prometeu vacinar todos os americanos até o final de julho. Muitos torceram o nariz para o novo presidente, acreditando que recém ocupante da Casa Branca estava delirando, pois o esforço exigia uma capacidade de vacinação de 1,644 milhões de americanos por dia. Não estava. Muito pelo contrário.

Com um discurso consciente e, sobretudo, equilibrado Biden começou a mexer as pedras no tabuleiro. Ouviu sobretudo a Ciência e explorou toda a força que o governo federal americano poderia lhe proporcionar. Além das vacinas da Pfizer/BioNTec e Moderna fechou parceria com a Johnson & Johnson, a fim de disponibilizar mais vacinas para os americanos. Tudo isso combinado com uma fantástica estrutura logística de vacinação montada em seu governo. Ao ritmo atual, os americanos serão vacinados muito antes do final de julho: já em maio do corrente ano. Mais uma meta batida com significativa folga!  A estratégia de Biden é imunizar a população para liberar a gigantesca força de trabalho dos americanos, fazendo decolar sua economia, duramente golpeada pela pandemia.  

Ao lado da vacinação em massa, Biden conseguiu outra grande realização: reduziu drasticamente o número de mortes no País. Conforme outrora referido, em 19 de janeiro morreram 2.564,14 americanos. Ontem, 19 de março, o número era de 1.221,71, isto é, 52,35% a menos da registrada no último dia do governo de Donald Trump.

Tomando apenas esses números por referência, não é difícil percebermos claramente a diferença entre governos responsáveis e governos negligentes.

Governos comprometidos com sua população fazem muito mais.

Governos comprometidos com sua população deixam suas querelas políticas de lado e colocam a mão na massa.

Governos comprometidos com sua população não enxergam dificuldade e nem ameaças. Muito pelo contrário. São otimistas e aproveitam as adversidades para voarem mais alto.

Governos comprometidos com sua população conseguem fazer mais com menos. São altamente produtivos e eficientes.    

Governos comprometidos com sua população mobilizam-se intensamente. Comandam. Lideram. Apontam e abrem caminhos.

Governo comprometidos com sua população dialogam. Conversam. Firmam compromissos objetivando unicamente o bem de seus compatriotas.

Governos comprometidos com sua população antecipam-se aos problemas. Identificam soluções com dias, às vezes, meses de antecedência.

Governos comprometidos com sua população não descansam. Não perdem tempo. São ágeis, rápidos e precisos. Tão precisos quanto o golpe de um bisturi.

Governos comprometidos com sua população pedem ajuda quando não conseguem carregar  o peso sozinho.

Governos comprometidos com sua população esquecem de si mesmos. Colocam-se a serviço da coletividade. Doam-se. Entregam-se. Dão tudo de si em troca do bem comum.

Governos comprometidos com sua população não esperam. Fazem acontecer. Contra tudo e contra todos, parafraseando o refrão de uma conhecida canção de todos nós brasileiros: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão

 

quarta-feira, 10 de março de 2021

FACHIN, MORO E A LAVA-JATO

 (*) Texto publicado na Coluna Gestão, do autor, no Fato Amazônico (www.alipiofilho.blogspot.com)

A decisão de Fachin de anular todos os atos do então juiz Sérgio Moro que condenaram o ex-presidente Lula e que não estavam relacionados com os ilícitos da Petrobrás caiu como uma bomba no cenário político brasileiro. Principalmente por ter devolvido os direitos políticos ao ex-presidente, que agora figura como candidato nas eleições para o Planalto em 2022. Fachin entendeu que as condenações de Lula envolvendo o tríplex de Guarujá (SP), o sitio de Atibaia (SP) e o Instituto Lula envolvem outros órgãos da administração pública o que, segundo ele, esvazia a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, origem da Lava Jato. Reconheceu que caberia a competência do julgamento de todos aqueles casos à Justiça Federal do Distrito Federal à qual remeteu os autos para nova distribuição.

A primeira crítica que se põe é: por que essa reviravolta agora? Por que essa decisão não foi tomada há mais tempo? Arrisco um palpite: por causa das “provas” hackeadas do telefone celular de Deltan Dallagnol. Aqui está talvez o principal estopim do imbróglio.  Há dois anos atrás o site The Intercept Brasil divulgou uma troca de mensagens entre o ex-juiz Sérgio Moro, Dallagnol e outros procuradores. Há época o caso repercutiu no Brasil e no mundo. Lula, de posse das mensagens, engrossou o coro de que não havia imparcialidade de Moro nas condenações. A partir daí, um rio começou a se formar...e...se avolumar...

Mais recentemente, o Ministro Lewandowski autorizou o ex-presidente Lula a acessar o conteúdo das mensagens. Moro recorreu da decisão, mas a Ministra Rosa Weber a manteve. O resultado foi que as mensagens hackeadas migraram para dentro da ação de Habeas Corpus de Lula e, com ela, a discussão acerca da imparcialidade de Moro ganhou corpo e coro na Segunda Turma do STF.

De tudo o que até aqui foi dito, há ainda alguns desdobramentos que precisam ser considerados.

Primeiro, que a decisão de Fachin é monocrática. Portanto, deverá ser ainda analisada pelo Pleno do STF que poderá referendá-la ou não. A Procuradoria Geral da República já sinalizou que irá recorrer da decisão. Portanto, podemos ter desdobramentos.

Segundo, muito embora os simpatizantes e correligionários do ex-presidente Lula estejam alardeando aos quatro cantos que finalmente a justiça foi cumprida e que restou evidente a inocência de Lula, não é bem assim. É importante destacar que a decisão de Fachin não adentrou no mérito das decisões de Moro. Nenhuma vírgula foi tirada. O conjunto probatório continua lá. Em momento algum Fachin disse que as provas contra ele não são robustas o suficiente para condená-lo. A decisão de Fachin alcança tão-somente o curso processual. Não seu conteúdo. Portanto, é nesse contexto que deve ser entendida a decisão de Fachin.   

Terceiro, ao que tudo indica, a decisão de Fachin visou, originariamente, dar uma sobrevida às condenações da Lava-Jato. Não que Fachin deixasse de estar convencido das  decisões tomadas por Moro, que resultaram nas condenações de Lula. Lembrando que por diversas vezes o próprio STF referendou tais decisões, inclusive, mantendo o petista preso, como a que ocorreu em junho de 2019, por decisão da própria Segunda Turma. À época votaram mantendo a prisão de Lula a Ministra Cármen Lúcia e Celso de Mello, juntamente com Fachin. Além disso, o STJ negou vários pedidos do ex-presidente. Uma delas ocorreu em novembro/2020 na qual sua Quinta Turma rejeitou um recurso por ele interposto no caso do triplex de Guarujá (SP). Ou seja, a coisa já estava sedimentada, mas veio a reviravolta.

Por meio de sua decisão, Fachin ofereceu uma nova oportunidade de as decisões de Moro serem referendadas por um outro Foro. Repito, não porque Fachin duvidasse das posições de Moro, mas mais como estratégia processual, ante à ameaça que começou a se formar no contexto das “provas” hackeadas. Com efeito, a redistribuição processual ao Foro do Distrito Federal calaria a tese de suspeição contra Moro. Essa conclusão parece estar reforçado pela atitude de Fachin no julgamento iniciado ontem pela Segunda Turma do STF, em que se debatia o prosseguimento ou não do julgamento pela Turma da imparcialidade de Moro nos processos da Lava-Jato. A tese de Fachin pelo não prosseguimento recorreu justamente a sua decisão tomada no dia anterior que anulou os atos do ex-juiz Sérgio Moro relacionados  ao tríplex de Guarujá (SP), o sitio de Atibaia (SP) e o Instituto Lula. Fachin sustentou a perda do objeto, mas foi vencido pelos demais integrantes da Turma.

Discussões à parte, evidentemente que o novo juiz poderá manter ou não o que Moro fez. Além disso, há também o risco de prescrição dos ilícitos praticados pelo ex-presidente o que o liberaria, em definitivo, para uma nova carreira política.

Outro ponto que merece reflexão está relacionado à legitimidade das “provas” hackeadas. Afinal de contas, elas realmente podem funcionar a favor do ex-presidente? Aqui, duas verdades se contrapõem: uma formal e outra material.

Pela verdade formal, a meu sentir, as mensagens hackeadas não poderiam servir de parâmetros para decisões judiciais. O primeiro argumento nesse sentido encontra lastro no disposto no inciso LVI, do art. 5º, da Carga Magna: são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. Por provas ilícitas, entenda-se, aquelas colhidas mediante infrações legais/constitucionais. Uma das mais comuns são as provas obtidas sem autorização judicial. Há pacífica jurisprudência nesse sentido. Citemos aqui a decisão da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça/RJ:

“Em agosto de 2017, a Polícia Rodoviária Federal abordou dois homens em um veículo que ia de Cachoeira Paulista/RJ ao Rio de Janeiro. Os homens informaram que estavam se dirigindo ao endereço de um rapaz com o qual comprariam drogas.

Os policiais, então, obtendo acesso ao WhatsApp de um dos homens abordados, sem autorização judicial, localizaram o suspeito de tráfico de drogas e marcaram um encontro entre ele e o rapaz abordado. Após isso, foi realizada uma ação da polícia contra o rapaz, tendo sido encontrados drogas e dinheiro no interior de sua residência. Após a ação da polícia, o morador da residência foi denunciado por tráfico de drogas.

Ao analisar o caso, o juízo de origem julgou a ação parcialmente procedente para condenar o denunciado pelo crime de tráfico de drogas. A defesa do rapaz, então, apelou da sentença, suscitando a nulidade das provas obtidas.

Ao analisar o caso, o desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto divergiu do relator e considerou que toda a ação policial foi derivada do acesso ilegal ao aplicativo de mensagens WhatsApp do telefone que estava na posse da testemunha abordada pelos policiais rodoviários.

Para o magistrado, é evidentemente descabida a versão de que a testemunha teria voluntariamente permitido o acesso dos policiais ao seu aparelho de celular, ainda mais que, após acessar o conteúdo, os agentes fingiram se passar pela testemunha, entraram em contato com um homem e marcaram o encontro com o acusado.

"Diante disso, a apreensão das drogas se deu tão somente em razão do acesso indevido às mensagens no aparelho celular, que provocou a ida dos policiais à residência do réu, não havendo contra ele, até então, qualquer investigação, tampouco mandado de busca e apreensão que justificasse a busca realizada em sua residência."

Segundo o desembargador, o encontro entre a testemunha e o acusado jamais teria ocorrido sem a troca de mensagens forjada e manipulada pelos policiais rodoviários” (https://www.migalhas.com.br/quentes/317121/sao-nulas-provas-obtidas-no-whatsapp-por-policiais-sem-autorizacao-judicial)

 

Ou seja, a verdade formal (ausência de autorização judicial para coleta de provas) se sobrepôs à verdade material – drogas e dinheiro encontrados na residência do acusado. A referida Câmara Criminal fundamentou sua decisão por infração ao inciso XII, art. 5º, do Texto Constitucional: é inviolável o sigilo (...) das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Fundamentou ainda no disposto no art. 1º da Lei n. 9.296/1996, que regulamentou aquele dispositivo constitucional: a interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.

Ou seja, aplicando-se esse linha de raciocínio às mensagens hackeadas, não haveria como recorrer a elas para sustentar  decisões judiciais ou impulsos processuais. A forma processual não foi observada, qual seja, a prévia autorização judicial para obtê-las. Ademais, restaria também infringido o disposto no art. 10 da referida Lei, uma vez que a coleta de informações telefônicas sem autorização judicial constitui crime: constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.  

Portanto, a fatídica decisão da Segunda Câmara do STF, em continuar com o julgamento da imparcialidade de Moro, incorre em flagrante e explícita ilegalidade, pois recorre a uma tipologia penal (crime) para discutir um suposto crime cometido pelo ex-juiz. A dúvida: até que ponto a decisão é legítima? Onde estão mesmo os limites para as decisões judiciais? Vale qualquer coisa? Mesmo se amparadas em tipologias penais? Os simpatizantes do ex-presidente Lula colocam em xeque o devido processo legal, porém, também não dão às costas a ele quando pugnam pela introdução de provas colhidas ilicitamente num processo judicial???

Não me soa como razoável tudo isso. Justiça para ser boa tem que começar de casa. Respeitar seus próprios postulados e limites. Se não for assim, é qualquer coisa, menos justiça.   

A conclusão da Câmara Criminal do TJ/RJ se ampara em jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. LEGALIDADE. PERDA DO OBJETO. LIBERDADE PROVISÓRIA CONCEDIDA. NULIDADE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA PERSECUÇÃO PENAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PROVAS OBTIDAS POR MEIO DE TELEFONE CELULAR APREENDIDO. MENSAGENS DE WHATSAPP. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NULIDADE CONSTATADA. PROVAS INADMISSÍVEIS. DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS. WRIT PARCIALMENTE PREJUDICADO E, NO MAIS, ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO APENAS EM PARTE. (...) 4. Esta Corte Superior de Justiça considera ilícita o acesso aos dados do celular e das conversas de whatsapp extraídas do aparelho celular apreendido em flagrante, quando ausente de ordem judicial para tanto, ao entendimento de que, no acesso aos dados do aparelho, se tem a devassa de dados particulares, com violação à intimidade do agente. Precedentes. No caso, a obtenção dos dados telefônicos do impetrante se deu em violação de normas constitucionais e legais, a revelar a inadmissibilidade da prova, nos termos do art. 157, caput, do Código de Processo Penal - CPP, de forma que, devem ser desentranhadas dos autos, bem como aquelas derivadas, devendo o Magistrado de origem analisar o nexo de causalidade e eventual existência de fonte independente, nos termos do art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal. 5. Writ prejudicado em parte e, no mais, ordem concedida, de ofício, em parte, apenas para reconhecer a ilicitude da colheita de dados dos aparelhos telefônicos (conversas de whatsapp), sem autorização judicial, devendo mencionadas provas, bem como as derivadas, serem desentranhadas dos autos, competindo ao Magistrado de origem analisar o nexo de causalidade e eventual existência de fonte independente, nos termos do art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal. (HC 450.617/MG, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 21/02/2019, DJe 06/03/2019).

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ACESSO AOS DADOS ARMAZENADOS EM TELEFONE CELULAR (MENSAGENS DO APLICATIVO WHATSAPP) DURANTE A PRISÃO EM FLAGRANTE. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NULIDADE DAS PROVAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. LIBERDADE PROVISÓRIA. CONCESSÃO. RECURSO PROVIDO. I - A jurisprudência deste Tribunal Superior firmou-se no sentido de ser ilícita a prova oriunda do acesso aos dados armazenados no aparelho celular, relativos a mensagens de texto, SMS, conversas por meio de aplicativos (WhatsApp), obtidos diretamente pela polícia no momento da prisão em flagrante, sem prévia autorização judicial. II - In casu, os policiais civis obtiveram acesso aos dados (mensagens do aplicativo WhatsApp) armazenados no aparelho celular do corréu, no momento da prisão em flagrante, sem autorização judicial, o que torna a prova obtida ilícita, e impõe o seu desentranhamento dos autos, bem como dos demais elementos probatórios dela diretamente derivados. III - As instâncias ordinárias fundamentaram a prisão preventiva do recorrente nos indícios de materialidade e autoria extraídos a partir das conversas encontradas no referido celular, indevidamente acessadas pelos policiais, prova evidentemente ilícita, o que impõe a concessão da liberdade provisória. Recurso ordinário provido para determinar o desentranhamento dos autos das provas obtidas por meio de acesso indevido aos dados armazenados no aparelho celular, sem autorização judicial, bem como as delas diretamente derivadas, e para conceder a liberdade provisória ao recorrente, salvo se por outro motivo estiver preso, e sem prejuízo da decretação de nova prisão preventiva, desde que fundamentada em indícios de autoria válidos. (RHC 92.009/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2018, DJe 16/04/2018)

Em outro julgado, o Ministro Jorge Mussi da 5ª Turma do STJ, comentando a respeito, fez a seguinte abordagem:  “... Não obstante os dados armazenados em aparelhos eletrônicos, notadamente em telefones celulares, não se encontrem albergados pela proteção contida no inciso XII do artigo 5º da Lei Maior, não há dúvidas de que, consoante o disposto no inciso X do mencionado dispositivo constitucional, dizem respeito à intimidade e à vida privada do indivíduo, não se admitindo, assim, que sejam acessados ou devassados indiscriminadamente, mas apenas mediante decisão judicial fundamentada. Doutrina. Jurisprudência” (RHC 100.922/SP, julgado em 11/12/2018, DJe 01/02/2019)

Conforme se vê, aceitando as “provas” hackeadas os Ministros da Segunda Turma colidem frontalmente com remansosa jurisprudência da mais alta corte da justiça infraconstitucional do País. Também colocam por terra dois dos mais sensíveis alicerces dos Direitos e Garantias Constitucionais deste País, a saber, os incisos XII e LVI, ambos insculpidos no art. 5º da Constituição Federal.   

Não bastasse isso, o próprio conteúdo das mensagens é colocado em xeque, pois há indícios que parte delas foram editadas e alteradas para fazer delas extrair contextos diversos dos originais.

A reboque de tudo, semeia-se uma forte instabilidade processual no País. O que é hoje poderá já não mais ser no amanhã, ainda que ancorado em sólidos e prestigiados dispositivos e entendimentos legais e constitucionais.

Coisas do Brasil. Apenas isso. Por isso somos o que somos.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão  

 

 

 

domingo, 7 de março de 2021

MULHERES

Comprometidas. Determinadas. Pacientes.

Amigas. Companheiras. Lutadoras.

Ansiosas. Indecisas. Inseguras.

Frágeis. Fortes. Impotentes.

Indecifráveis. Indescritíveis. Impenetráveis.

Amorosas. Rancorosas. Ressentidas. 

Ambiciosas. Carentes. Desejosas. 

Assim é o universo feminino. 

Com altos e baixos. Com tropeços e quedas. Com acertos e desacertos  é bem verdade, mas que representam o alicerce de muitas construções.

Partícipe  na origem da vida. 

Centelha do amor divino. 

Sábia em todas as horas.  

Conselheira fiel. 

A vida não seria completa sem elas. 

Sua companhia, seu colo e seu abraço são como um porto seguro nas grandes tempestades.

O meu respeito. O meu apreço. A minha gratidão a todas as mulheres neste 08/03/2021.


Alipio Reis Firmo Filho









domingo, 28 de fevereiro de 2021

54 ANOS DA ZONA FRANCA DE MANAUS: MOTIVO PARA ALEGRIA OU PREOCUPAÇÃO???

 (*) Texto publicado na Coluna Gestão no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)

A Zona Franca de Manaus completa 54 anos. Há exatos 54 anos atrás nascia o modelo com o objetivo de alavancar a economia de uma região situada no coração da Floresta Amazônica. De lá para cá muita coisa mudou. O mundo também. Mas parece que o tempo parou por aqui. Parece que ainda vivemos nos idos de 1970 em que a febre “Zona Franca de Manaus” tomava conta do País.  

Sim. Os ganhos foram incontáveis nesses 54 anos. Disso não resta dúvida nenhuma. A grande questão é: e quanto ao nosso futuro? Estamos realmente preocupados com ele? O que estamos fazendo no presente para termos uma matriz econômica alternativa? Eu respondo: NADA. Eis o nosso grande calcanhar de aquiles.  

A economia global vem sofrendo grandes rupturas. Rupturas que irão mexer (ou já estão mexendo) com a vida de todos nós. Existem novas demandas que estão impulsionando novas formas de fazer negócios nos quatro cantos do planeta. Uma delas é a busca por fontes de energia renováveis. Dentro desse escopo, máquinas com soluções elétricas  despontam em vários países. Os motores elétricos são uma realidade há muito tempo. Mas só num período relativamente recente é que eles entraram na pauta da indústria dos transportes. Aqui, a Índia desponta como um grande mercado.

Em setembro de 2018 o país pretendia que até 2023 15% de sua frota de veículos fosse movida a eletricidade. No ano passado a fabricante indiana Northway Motorsports transformou seu modelo de veículo popular – Maruti 800 – num veículo elétrico. Em 2020 também a Hyundai anunciou a produção do SUV Compacto para a Índia. A promessa é que para 2022 o veículo seja totalmente elétrico. Mas não é apenas o setor de transportes que está sentindo essa demanda. Também o polo de 2 rodas vem sendo visitado cada vez com mais frequência por ela (bicicletas e motocicletas).

Mas talvez a mudança mais significativa e que promete impactar  a indústria eletroeletrônica – entenda-se, Zona Franca de Manaus – refere-se à produção de televisores.

Há vários anos os telefones móveis deixaram de ser apenas ferramentas de comunicação pessoal. Transformaram-se em smarts fones. Por meio da internet das coisas eles conseguem se conectar a vários outros dispositivos (estações de rádio e TV, dentre outros). Pois bem. Os televisores, na forma como atualmente os concebemos, tendem a desaparecer. Migrarão para dentro dos aparelhos celulares. Aliás, isso já é uma realidade em muitos países do mundo. Seu uso em massa, contudo, é apenas uma questão de tempo.

Conforme se vê, não temos muita margem de escolha. A produção em grande escala de motores elétricos em outras partes do mundo;  e  a  demanda cada vez mais frequente por televisores em telefones celulares são dois grandes problemas que ameaçam diretamente duas das mais importantes colunas da Zona Franca de Manaus. Evidentemente que nenhum deles poderá ser resolvido com emendas constitucionais, esticando o prazo de validade do modelo. Também não há como pressionar o Ministro da Fazenda do Brasil mediante discursos inflamados, buscando uma solução. É preciso que tenhamos consciência que  a solução vem de fora do País e, na verdade, não temos controle nenhum sobre ela. Justamente porque a solução depende exclusivamente das leis de mercado, muito mais poderosas e destrutivas (em alguns casos) que as leis jurídicas.

Uma das críticas que se levanta contra o modelo Zona Franca de Manaus é que ele se tornou e está se tornando cada vez mais obsoleto. Além de estar sustentada por soluções que daqui a pouco deixarão de existir, o modelo bem que poderia ser repensado imediatamente, a fim de  incorporar funcionalidades que poderiam lhe dar mais sustentabilidade. Como? Transformando-a numa zona de produção e desenvolvimento de inovações tecnológicas, à maneira da Zona Franca chinesa Shenzhen.

Em 1980 – dois anos após seu nascimento - a Shenzhen transformara-se numa zona de atração de novas tecnologias. A coisa deu tão certo que sua população cresceu de 30 mil habitantes para 12 milhões de pessoas em 2018. Seu PIB em 2018 bateu US$ 491 bilhões de dólares, o quarto maior PIB da China. Seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos representam o dobro da média nacional chinesa. Taí uma ótima alternativa para a nossa Zona Franca.   

As mudanças na economia são como ondas. Elas nascem em algum ponto do planeta e, rapidamente, se propagam em várias direções. Muito semelhante à pandemia no mundo. Dependendo da região onde essas ondas irão “quebrar”, sua força pode ser descomunal, à maneira de uma grande tsunami. Muitas tsunamis estão nascendo ao redor do planeta e ainda não nos damos conta disso. Insistimos em tentar manter a vida de um paciente numa UTI a peso de remédios (jurídicos), enquanto o corpo já não dá mais sinais de sobrevida. Por isso é tão importante a busca por alternativas. Aliás, já se passaram 54 anos e ainda não nos despertamos para isso. Continuamos a viver berço esplêndido.

Precisamos mudar rapidamente. Pensar nosso futuro. Observar as grandes tsunamis que estão se formando ao nosso redor e bater o martelo.

Do contrário, seremos submergidos por todas elas e voltaremos inevitavelmente  a ser  apenas um grande porto de lenha...

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão   

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

MULHERES ELEGANTES

Por mais que se afadiguem, alguns exemplares femininos não conseguem passar sem serem distinguidas pelos olhos do sexo oposto. Numa rua. Numa praia. Numa reunião de negócios. Na fila de um banco. Num restaurante. Numa rede social. Não importa o lugar. Elas sempre chamam e reclamam a nossa atenção.  Não dá para permanecer indiferente diante delas. 

À maneira de pérolas preciosas, esses belos exemplares fascinam de maneira singular. Não precisam fazer muito esforço para isso. Com elas, é tudo muito natural. Respiram e transpiram glamour. Talvez sem mesmo se darem conta disso. Desconhecem o dom que possuem e o poder que desfrutam. 

Não me venha dizer também que todo homem é igual. Não é. Existem homens que sabem apreciar bons conteúdos, especialmente os mais refinados. 

Todo homem de bom gosto sabe distinguir uma mulher elegante. O jeito como fala. A postura no olhar. A maneira de sorrir. A forma como se veste. Os acessórios que costuma trazer consigo. Tudo. Absolutamente tudo, conspira a favor dela. 

O perfume que ela usa é um bom referencial. Fragrâncias  - todos sabemos - é algo extremamente pessoal. Mulheres elegantes sabem escolher o que de melhor combina com elas.  Dependendo da ocasião, conciliam, sem maiores dificuldades, uma pluralidade de aromas.        

Também é quase que desnecessário conhecer pessoalmente esses belos exemplares. 

Mulheres elegantes são como ondas nos oceanos. De longe são rapidamente notadas. Têm brilho próprio. Iluminam qualquer ambiente onde chegam. Encantam com sua magia. Inebriam com seu magnetismo. Nada permanece indiferente diante delas. Sua graça e sua beleza - não me refiro apenas à beleza física - são únicas. Tão únicas que não se confundem com outros traços.   

Conhecer mulheres elegantes é um privilégio. Permanecer a seu lado é um presente. Desfrutar da convivência de alguma delas é uma dádiva. 

Por isso, se qualquer dia desses algum desses belos exemplares cruzarem seu caminho, te dou um conselho: não deixe essa oportunidade passar. Lembre-se: belos exemplares estão ficando cada vez mais raros na atualidade. Algumas são como cometas: navegam por nossa vida uma única vez durante toda a nossa existência.    


Alipio Reis Firmo Filho


  

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

O QUE PODE ACELERAR O FIM DA PANDEMIA NO MUNDO?

 

(*) Artigo publicado na Coluna Fato Amazônico do autor (www.fatoamazonico.com.br)


Há pouco mais de 12 meses atrás éramos apresentados a um visitante indigesto: o novo coronavírus. Um personagem que nem mesmo a Ciência o conhecia direito. De lá para cá o mundo virou um campo de guerra. Tornamo-nos prisioneiras de nossas próprias casas. O medo tomou conta de todos. A rotina mudou radicalmente nos quatro cantos do planeta. Viagens, passeios, eventos e agendas foram radicalmente alterados. Na prática, deixamos de ter o controle sobre nossas próprias vidas. Quem passou a ditar as regras foi o tal visitante indigesto, poderoso e incomparavelmente letal. Havia quase 100 anos que o mundo não conhecia uma pandemia com tamanha proporção. A última foi entre 1918/1920. A chamada “gripe espanhola” cujo vírus, aliás, é da mesma família do novo coronavírus.

Quando em 11 de março de 2020 a Organização Mundial da Saúde solenemente declarou  que o foco de infecção em Wuhan na China espalhara-se pelo resto do mundo, alcançando uma escala global, as perspectivas eram as mais sombrias possíveis. Naquela oportunidade, 10 em cada 10 pesquisadores, afirmavam que somente a partir da metade do ano de 2021 é que o mundo poderia contar com alguma vacina. Outros apostavam que apenas no final daquele ano é que surgiria uma vacina. Antes disso, nem pensar.  

Foi quando experimentamos a primeira onda da pandemia no mundo. Um primeiro surto que matou milhares de pessoas e deixou os sistemas de saúde de muitos países no mundo colapsados, como se fossem atingidos por uma tsunami. Era o cartão de visita do inimigo invisível. Aliás, o primeiro deles, pois oito meses depois, experimentaríamos outro, muito mais agressivo que o primeiro.  

Para o bem da humanidade, porém, as previsões não se concretizaram. Ao final de novembro de 2020 o mundo já poderia contar com, pelo menos, quatro vacinas promissoras: Oxford/AstraZeneca, Pfizer, Moderna/BioNtec e Coronavac. Era a luz no final do túnel que todos nós aguardávamos ansiosamente.

A coisa evoluiu e, atualmente, contamos com 08 vacinas sendo aplicadas ao redor do planeta. Aqui no Brasil já contamos com duas delas, com perspectivas para a chegada de mais duas no curto prazo: a russa Sputnik e a vacina da Johnson & Johnson.

Apesar das fortíssimas aliadas, não devemos nos esquecer que, assim como os contágios dos vírus, o efeito de uma vacina também ocorre em ondas. Ela nasce num ponto qualquer do planeta e de lá se propaga em direções diversas, espalhando-se como uma grande nuvem do bem. A velocidade de propagação, porém, depende de fatores como logísticas de transporte e capacidade de guarda e conservação do produto. Entretanto, também de dinheiro e capacidade de produção. Este último – produção em grande escala - talvez, o maior deles.

Além disso, temos que considerar ainda que a vacinação de uma pessoa não produz anticorpos instantaneamente em seu organismo. Após aplicadas, elas exigem tempo para agir. Nas vacinas aplicadas em duas doses – como a de Oxford/AstraZeneca e a Coronavac – a produção de anticorpos no organismo começa a ocorrer 07 dias depois. A partir daí a produção aumenta gradativamente e só atinge o seu pico (próximo de100%) no décimo quarto dia após a segunda dose.  Esse fator joga também contra a imunização da população mundial. Além disso, temos um número gigantesco de pessoas a serem vacinadas.

Façamos as contas.

Somos próximos de 8 bilhões de almas no mundo. Parte das vacinas exige a aplicação de duas doses para se obter uma eficácia próxima de 100%. Por aí já precisaríamos de 16 bilhões de doses, isto é, o dobro da população mundial.

No mundo, o principal produtor de vacinas é uma gigante indiana que atende pelo nome de Instituto Serum. Atualmente, sua produção está a todo vapor. Porém, o instituto tem um grande desafio pela frente. Só na Índia, o desafio é produzir vacinas para 1,353 bilhão de pessoas. Uma tarefa nada fácil. Quanto mais suprir a necessidade de duas centenas de países!

Pois bem. Muito embora as vacinas ajudem muito, elas precisam de tempo para se propagarem pelo mundo, em razão dos fatores que comentei anteriormente. Para ser totalmente vacinado, muito provavelmente o mundo careça de dois anos ou mais o que prolongaria a pandemia no mundo. O problema é que não podemos aguardar por tão longo tempo.

O controle da pandemia no mundo passa pela seguinte equação.

A população mundial pode ser dividida em dois grandes grupos. No primeiro deles está a parcela da população que ainda não foi infectada pelo vírus ou que, embora já infectada, não precisou de maiores cuidados médicos em razão dos sintomas terem sido leves. Na atualidade, essa parcela da população encontra-se recuperada e permanece a espera de ser vacinada. Ela compõe a maior parte da humanidade.

A outra parcela está representada pelas pessoas que se encontram nos hospitais, precisando de tratamentos médicos intensivos. Esse segundo grupo é que pressiona os sistemas públicos e privados de saúde. Aqui mora a limitação das vacinas. Seu calcanhar de aquiles.

É que, apesar de promissoras e eficazes, em relação à população internada as vacinas não poderão ajudar. Elas funcionam como drogas PREVENTIVAS, isto é, que impedem que o vírus cause danos no organismo quando infectado. Por isso, o grupo de populações internadas continuará pressionando as redes de hospitais. Ante à grande demanda, muitos deles carecem de profissionais da saúde e insumos hospitalares. A resultante é que o número de óbitos aumenta significativamente pressionando os serviços funerários.

Por outro lado, enquanto aguardam na fila da vacinação, o outro grupo também pode ser contaminado pelo vírus podendo vir a bater às portas das unidades de saúde, em busca de serviços médicos. O resultado é que essas parcelas adicionais de infectados funcionaram como combustível para estrangular ainda mais os já combalidos sistemas de saúde.

Nesse cenário, qual a solução? Respondo: SOMENTE A DESCOBERTA DE DROGAS CAPAZES DE CURAREM A COVID-19 PODE ABREVIAR NOSSO CALVÁRIO. No atual estágio da pandemia no mundo, e levando-se em consideração que a imunização da população mundial vai demorar, apenas a chegada de medicamentos eficazes para tratarem os doentes é que representará um alívio imediato para as pessoas já acometidas pela Covid-19, reduzindo-se drasticamente a pressão sobre as unidades hospitalares e os profissionais da saúde.  

Ademais, essas drogas teriam a virtude também de tratarem o primeiro grupo; na eventualidade de ele vir também a se contaminar com o vírus e adoecer de Covid-19, enquanto aguarda na fila esperando ser vacinado. Isso evitaria que ele viesse no futuro próximo a também alimentar a fila nos hospitais.

Sobre as perspectivas para a chegada desses novos aliados, em dezembro último a AstraZeneca anunciou o AZD7442 que promete evitar que o infectado pelo novo coronavírus evolua para a Covid-19, se o medicamento for tomado até o 8º dia de infecção. Ele conferiria imunidade instantânea contra a doença. Sua chegada está aguardada para março ou abril do corrente ano.

Outra descoberta promissora está relacionada à comprovação da eficácia de uma droga antiviral que já existe - a tapsigargina – contra o novo coronavírus. Até então, a comunidade científica já se sabia que ela agia eficazmente contra três espécies de vírus: o vírus da gripe comum,  o vírus sincicial respiratório (VSR) e o vírus influenza (H1N1). A descoberta promissora foi feita por pesquisadores do Reino Unido e da China. O medicamento previne a replicação do vírus em células durante pelo menos 48 horas depois de apenas uma dose. O medicamento não age no vírus, mas no sistema imunológico humano.

De se ressaltar que há diferença entre alguém infectado pelo coronavírus e uma outra pessoa acometida da Covid-19. O fato de um organismo está infectado não significa que tenha Covid-19. O AZD7442 impede que o infectado pelo coronavírus evolua para a Covid-19, impedindo-o de sofrer os danos ocasionados por ele em órgãos como pulmões, rins, coração e sistema neurológico.

Outra droga que sinaliza como promissora é a ABX464, conduzida pelo Brasil e pela França, sob a direção da Abivax, uma empresa francesa de biotecnologia. A proposta da droga é reduzir a possibilidade de internação de um paciente com Covid-19, além de abreviar o tempo de recuperação. Além de a Anvisa aprovar os estudos aqui no Brasil, também os órgãos de vigilância sanitária da França, da Alemanha, do Reino Unido e da Itália fizeram o mesmo em seus respectivos países. México, Chile e Peru deverão ser os próximos a aprovarem as pesquisas.

No Brasil os estudos estão sendo coordenados pelo Dr. Jorge Kalil, imunologista e professor titular da Faculdade de Medicina da USP. O ABX464 é uma droga anti-inflamatória, mas que também tem propriedades antivirais. Na verdade, o foco inicial dessa droga era tratar inflamações em doenças autoimunes, mas que ante à pandemia, os estudos clínicos sofreram mudança na trajetória, a fim de investigar sua eficácia contra a Covid-19.

Inicialmente 1.136 pacientes acima de 65 anos de idade foram e estão sendo submetidos aos testes. A droga será aplicada após a constatação da infecção dos voluntários. A previsão é que os testes sejam finalizados no Brasil agora no início de 2021.

Além desses medicamentos existem inúmeros outros sendo pesquisados ao redor do mundo. Se tudo correr bem e os testes se mostrarem realmente eficazes, talvez agora no primeiro semestre de 2021 já possamos contar com mais aliados para tentar frear a pandemia no mundo. Aliados “de peso” e de eficácia instantânea. Não apenas um, mas vários deles, como aconteceu com as vacinas.

A estratégia dos cientistas é trabalhar com drogas antivirais já existentes ou, ainda, com ensaios clínicos que já se mostraram eficazes para outras doenças cujas características guardam estreita relação com a Covid-19.

A ideia é cortar caminho, pois a pesquisa e o desenvolvimento de uma droga genuinamente nova para o tratamento da Covid-19 poderia demandar 5 ou 7 anos. O mundo não pode aguardar tanto tempo.

Portanto, continuemos acreditando na Ciência e nas mentes brilhantes dos pesquisadores. Verdadeiros heróis e salvadores de vidas.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão