As
Despesas de Exercícios Anteriores – DEA’s estão disciplinadas pelo art. 37 da
Lei nº 4.320/64. Além desse dispositivo, cada ente da Federação poderá
regulamentar a matéria visando atender às suas peculiaridades, desde que, é
evidente, observe os limites traçados pelo Diploma Legal. As DEA’s correspondem
a autorizações dadas na lei orçamentária, destinadas a atender a compromissos
gerados, conforme o título aduz, em exercícios anteriores. Foram criadas a fim
de se desestimular o administrador público a solicitar autorizações para a
abertura de créditos especiais cujo objeto contemplasse despesas dessa
natureza. Isto porque nem toda despesa empenhada em cada ano necessariamente
foi nele gerada ou constituída. Assim, é possível que um dado empenho contemple
despesas cuja entrega do bem, obra ou serviço tenha ocorrido em anos
anteriores. Mas... em que hipóteses o administrador público recorrerá ao
empenho à conta de Despesas de Exercícios Anteriores? A resposta é dada pelo dispositivo
referenciado, que assim dispõe: “As despesas de exercícios encerrados, para as
quais o orçamento respectivo consignava crédito próprio, com saldo suficiente
para atendê-las, que se tenham processado na época própria, bem como os Restos
a Pagar com prescrição interrompida e os compromissos reconhecidos após o
encerramento do exercício correspondente poderão ser pagos à conta de dotação
específica consignada no orçamento, discriminada por elementos (Ver Anexo da
Portaria nº 163/2001), obedecida, sempre que possível, a ordem cronológica”.
Assim
três são as hipóteses:
a)
despesas com saldo suficiente para atendê-las e não processadas no mesmo
exercício financeiro: ao longo de todo o ano, o Poder Público procede ao
empenho de suas despesas, comprometendo-o com um determinado fornecedor. Ao
final do exercício, entretanto, é possível que este fornecedor, por motivos
diversos, não realize a prestação que se obrigou: não entregue o bem, não
preste o serviço ou não realize a obra ou sua etapa. Em outras palavras, tais
despesas não se processaram. Nessas situações, as alternativas à disposição do
administrador público são apenas duas: ou ele mantém o valor empenhado
inscrevendo seu beneficiário em restos a pagar; ou procede à anulação do
empenho correspondente. Na hipótese de ele optar por esta última alternativa, o
pagamento que vier a ser reclamado em exercícios futuros (pelo fornecedor)
poderá ser empenhada novamente, só que à conta de Despesas de Exercícios
Anteriores.
b)
restos a pagar com inscrição interrompida: retomando a situação descrita no
item precedente, na hipótese de o administrador público, entretanto, optar por
manter o empenho correspondente, inscrevendo-o em restos a pagar, também é
possível, por razões diversas, que o fornecedor não implemente a prestação que
se obrigou durante todo o transcorrer do exercício seguinte. Nessa hipótese, o
administrador público poderá cancelar o valor inscrito. Se assim ocorrer, o
valor que vier a ser reclamado no futuro pelo fornecedor, também poderá ser
reempenhado à conta de Despesas de Exercícios Anteriores.
c)
compromissos reconhecidos após o encerramento do exercício correspondente: em
dadas situações, alguns compromissos são reconhecidos pelo administrador
público após o término do exercício em que foram gerados. Um bom exemplo dessas
situações é o caso de um servidor público cujo filho tenha nascido em dezembro
de um ano qualquer mas que somente veio a solicitar o benefício do
salário-família em janeiro do ano subseqüente. Para proceder ao pagamento das
despesas relativas ao mês de dezembro, é preciso, primeiramente, reconhecê-las
e, após, empenhá-las à conta de Despesas de Exercícios Anteriores. Tais
despesas, portanto, sofrem o empenho pela primeira vez, diferentemente das
outras duas situações apontadas, cujos objetos já sofreram empenhos no passado.
Quanto às despesas relativas ao mês de janeiro e seguintes, serão empenhadas no
elemento de despesa correspondente (elemento “09”, de acordo com o Anexo II da
Portaria Interministerial nº 163/2001).
Ao
proceder o reconhecimento dos compromissos, o administrador público ordenará o
correspondente pagamento, no mesmo processo em que reconhecer a dívida,
oportunidade em que discriminará, pelo menos, os seguintes elementos: •
Importância a pagar; • Nome, CPF ou CNPJ e endereço do credor; • Data do
vencimento do compromisso; • Causa da inexistência do empenho, no elemento
próprio, à conta do orçamento vigente Mencione-se ainda que, conforme orienta o
dispositivo em comento, os pagamentos das dívidas assim reconhecidas deverão
obedecer, sempre que possível, a ordem cronológica. Despesas de Exercícios
Anteriores versus Lei de Responsabilidade Fiscal O caput do art. 42 da LC nº
101/2000 assim dispõe: “É vedado ao
titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres
do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida
integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício
seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito”.
Consoante
doutrina dominante, o dispositivo em causa foi inserido no texto da referida
lei a fim de se tentar coibir a prática (comum entre nós) de, a cada virada de
mandato, os governantes transferirem para seus sucessores dívidas constituídas
no último ano de seus mandatos. A partir da Lei de Responsabilidade Fiscal,
mencionada prática, a princípio, deveria ter sido obstada ante à proibição
legal. Dizemos “deveria” porque o que se observa é que muitos governantes, a
fim de fugirem ao regramento em referência, passaram a incorporar a prática
(nociva) de cancelar os empenhos emitidos em sua gestão deixando tão-somente,
no último ano de seus mandatos, aqueles com suficiente disponibilidade
financeira. Com tal prática, acabam “atendendo” ao comando legal, mas
continuando a transferir as dívidas por eles constituídas a seus sucessores.
Exemplifiquemos com uma administração que apresenta os seguintes dados nos
últimos dois quadrimestres de seu mandatário: - total de empenhos emitidos: $
1.000 u.m. - montante arrecadado no período: $ 800 u.m. - total de empenhos
anulados: $ 200 u.m. O próximo mandatário herdará, portanto, uma dívida
contraída por seu antecessor no valor de $ 200 unidades monetárias.
Tal
situação é nociva à administração das contas públicas na medida em que a dívida
contraída (e não paga) terá de ser saldada pelo próximo governante, fato que,
indubitavelmente, pressionará o caixa de seu primeiro ano de mandato. Essa
situação é, ainda, “legitimada” em razão da existência de dotações na rubrica
Despesas de Exercícios Anteriores cujo volume máximo a ser executado em cada
ano e em cada ente não encontra regramento no Direito Financeiro nacional. Com
efeito, temos uma porta aberta ao descontrole das contas públicas que, a nosso
ver, poderia ser fechada se fosse disciplinada a utilização daquela rubrica
orçamentária estabelecendo-se, p. exemplo, limites máximos à sua execução, a
exemplo do que ocorre com as despesas com pessoal e dívida pública. A situação
ilustrativa acima adquire um contorno mais agressivo quando o administrador,
sabendo que não contará com disponibilidades financeiras suficientes, sequer
emite os empenhos correspondentes. Com efeito, o novo governante somente irá
tomar conhecimento da dívida deixada no momento em que o fornecedor requerer
seu pagamento. Na ilustração por nós relacionada bastaria que o novo
administrador levantasse o rol de empenhos anulados no final do mandato para
aferir o montante das dívidas contraídas.
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