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sexta-feira, 25 de dezembro de 2020
SOBRE OS TESTES COM AS VACINAS CONTRA A COVID-19
segunda-feira, 16 de novembro de 2020
AS ELEIÇÕES AMERICANAS E O VOTO NÃO OBRIGATÓRIO
(*) Artigo publicado na Coluna Gestão no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)
Por mais incrível que
possa parecer, as eleições americanas não polarizaram apenas as intenções de
votos dos eleitores do Tio Sam. Também
ela dividiu inúmeros “eleitores” por aqui.
Parte deles, simpatizantes
do Governo Bolsonaro que, por força disso, apoiaram a tentativa de reeleição de
Trump. A outra parte, formada pelos contrários à Bolsonaro, que levantaram a
bandeira a favor de Jo Biden. Em meio a tantas opiniões divergentes, ora pró
Biden, ora pró Trump, um detalhe importante não passou despercebido: o sistema
eleitoral americano. Muito diferente do nosso. Não apenas em razão da figura
dos delegados, mas também pelo voto facultativo. Por lá vota quem quiser. O
voto não é obrigatório. Diferente do sistema eleitoral brasileiro que até
admite o voto facultativo em algumas situações (pessoas com idade entre 16 e 18
anos ou acima de 70 anos; analfabetos), mas que obriga o comparecimento da
maior parte de seu eleitorado às cabinas de votação.
No mundo, apenas 21
países adotam o voto obrigatório. Destes, 10 estão situados aqui na América
Latina sendo que o Chile o aboliu em 2011. Entre os países do primeiro mundo,
apenas a Suíça o reconhece em algumas de suas regiões. Ou seja, ao que tudo
indica, estamos mais uma vez na contramão das economias avançadas.
Nas eleições americanas deste
ano votaram pouco mais de 151 milhões de eleitores. Muito abaixo do número
máximo do eleitorado (230 milhões). Conquanto o número dos votantes represente
apenas 65% do total, ele foi o maior em toda a história das eleições
americanas. Em 2016, p. exemplo, compareceram às urnas apenas 138 milhões de
eleitores, isto é, 13 milhões a menos. Lembrando que a diferença no número de
eleitores de Biden em comparação com os de Trump foi de, aproximadamente, 5
milhões de votos, ou seja, dentro dos 13 milhões. Por isso mesmo, especula-se
que a vitória de Biden foi impulsionada justamente pelo voto de quem apenas era
um mero espectador nas eleições passadas e resolveu ir às urnas neste ano. Essa
atitude confere maior credibilidade às eleições americanas referendando e
legitimando a escolha de Biden para a Casa Branca. Em outras palavras, parece
que Biden não foi eleito “por acaso”, mas sua vitória resultou de um efetivo
desejo por mudanças de uma parcela determinante dos eleitores americanos.
Por aqui, nada obstante a
obrigatoriedade do voto, tivemos quatro capitais que apresentaram abstenções
superiores a 30%: Porto Alegre, Rio de Janeiro, Goiânia e Curitiba.
Evidentemente que deverá ser considerado nesse cenário os efeitos da pandemia.
Porém, em 2016 o percentual oscilou entre 16,4% e 24,3 %. A situação se agrava quando computados os
votos nulos e brancos.
Em Manaus, ela alcançou
18,23% no primeiro turno. Ou seja, 2 em cada cinco eleitores manauaras
decidiram não votar.
Nada obstante tais
apontamentos, há um problema de fundo mais grave que depõe contra a
obrigatoriedade do voto. Em outras palavras, o voto obrigatório
conduz a algumas assimetrias quando admitido num regime democrático.
O primeiro deles é colocar o eleitor numa redoma obrigando-o a realizar algo que o próprio Texto Constitucional reconhece e declara solenemente quem é seu titular: “Todo o poder emana do povo (...)” (Parágrafo único, art. 1º, CF/88). Ora, não faz sentido um gesto tão grandioso como este, seguido de um imperativo, castrando-o naquilo que parecia ser seu bem jurídico mais precioso. Não existe verdadeira liberdade onde não comparece plenamente o direito de escolha. Afinal, a quem pertence de fato o poder? Ao povo ou ao legislador constituinte originário? Quem pode dele dispor? Creio que não é difícil respondermos a tais questões.
Portanto, por esta ótica parece que avançamos num primeiro momento, mas retrocedemos no instante seguinte. Ficamos meio que pela metade. Um pé lá e outro cá.
Outro desdobramento do voto obrigatório é que ele impõe aos eleitores a obrigação de também abraçarem uma ideologia político-partidária. Sim, porque o voto representa, em parte, justamente isso. Um eleitor que corrobora a maneira de pensar de uma agremiação partidária. Na prática sabemos que isso não acontece.
E aqui reside um outro problema.
Muito provavelmente, nem todas as escolhas refletem esse cenário. O fato de um eleitor votar em “A” ou “B” não significa, necessariamente, que ele concorda com a ideologia partidária nutrida por um ou por outro. Muitas vezes, o voto se manifesta mais por receio às possíveis sequelas prometidas pelo sistema eleitoral do que propriamente por uma identidade ideológica. É aqui que o voto facultativo ganha relevância. Ele oportuniza a cada eleitor – titular do poder – o direito de se identificar ou não com referida ideologia. Caso não se identifique ele tem a opção de não votar. Ninguém irá obriga-lo a se violentar em suas próprias convicções pessoais. É ele – apenas ele – que determina em quais situações deverá exercer seu direito (não sua obrigação) de votar. Talvez seja por isso que a maior parte dos países do mundo optaram por um sistema eleitoral que reconheça, efetivamente, a soberania do eleitor no direito de escolher seus representantes.
Note que as soluções postas à disposição dos eleitores para comporem eventuais problemas de identidade ideológica nos sistemas de votação obrigatórios são (1) votar em branco, (2) anular o voto ou (3) abster-se, sofrendo as sanções prometidas pelo próprio sistema. Convenhamos, soluções nada republicanas.
Isso tudo sem falar num outro problema que agrava ainda mais este cenário: a filiação partidária obrigatória. Por ela, apenas filiados a um partido político podem ser votados numa eleição. Trata-se de outra castração, semelhante à primeira.
Quem deseja se candidatar a um cargo eletivo nesta Terra Tupiniquim não pode ter ideologia própria. Tem que abraçar alguma ideologia partidária já existente. É como se ele assinasse um contrato de adesão com seu partido político. Trata-se de mera formalidade.
Então, temos o seguinte cenário: de um lado, eleitores cujas escolhas nem sempre recaem sobre os postulantes a cargos eletivos. De outro, postulantes a cargos eletivos cujas ideias nem sempre estão refletidas no partido que escolheram para concorrer às eleições.
Vá entender esse imbróglio.
Coisas do Brasil.
Voto facultativo já!!
Filiação partidária não obrigatória já!!
Alipio Reis Firmo Filho
Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão
sábado, 17 de outubro de 2020
COMO POSSO TRADUZIR UM TEXTO EM PDF NUMA LÍNGUA ESTRANGEIRA PARA O PORTUGUÊS?
Pessoal, às vezes temos vários documentos em PDF escritos numa língua estrangeira (inglês, italiano, etc.) e precisamos traduzi-los para o português. A dica é visitar o site "onlinedoctranslator.com". Nele você poderá fazer essa tradução em segundos. O site traduz também documentos de outros formatos como Excel, Word, Txt, Power Point, .odt, .ods e .odp.
Recomendo!!
Alipio Reis Firmo Filho
POR QUE ALGUMAS PORTARIAS DE NATUREZA FISCAL DA SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL OBRIGAM OS DEMAIS ENTES FEDERATIVOS?
Até antes do advento da Lei Complementar n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) convivíamos com uma verdadeira “torre de babel”. A confusão decorria da coexistência de inúmeros códigos, nomenclaturas e procedimentos contábeis, orçamentários e fiscais. Cada ente federativo, p. exemplo, tinha seu próprio plano de contas. Essa verdadeira “colcha de retalhos” dificultava a consolidação das contas, ou seja, a reunião de todos os dados dos entes subnacionais em demonstrativos que pudessem apresentar a situação orçamentária, contábil e fiscal de todos os entes em conjunto.
A solução veio com a LRF.
Todavia, nem tudo ela podia estabelecer em detalhes. Ademais, vários
procedimentos esbarravam no interesse e nas peculiaridades dos entes
federativos, pois a dimensão continental do País representava um empecilho
nessa empreitada.
Foi então que a Lei
concebeu o Conselho de Gestão Fiscal, previsto em seu art. 67, nestes termos:
Art. 67. O
acompanhamento e a avaliação, de forma permanente, da política e da
operacionalidade da gestão fiscal serão realizados por conselho de gestão
fiscal, constituído por representantes de todos os Poderes e esferas de
Governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da
sociedade, visando a:
I -
harmonização e coordenação entre os entes da Federação;
II - disseminação de práticas que resultem
em maior eficiência na alocação e execução do gasto público, na arrecadação de
receitas, no controle do endividamento e na transparência da gestão fiscal;
III - adoção de normas de consolidação das
contas públicas, padronização das prestações de contas e dos relatórios e
demonstrativos de gestão fiscal de que trata esta Lei Complementar, normas e
padrões mais simples para os pequenos Municípios, bem como outros, necessários
ao controle social;
IV -
divulgação de análises, estudos e diagnósticos.
§ 1o O conselho a
que se refere o caput instituirá formas de premiação e
reconhecimento público aos titulares de Poder que alcançarem resultados
meritórios em suas políticas de desenvolvimento social, conjugados com a
prática de uma gestão fiscal pautada pelas normas desta Lei Complementar.
§ 2o Lei disporá
sobre a composição e a forma de funcionamento do conselho.
Para a LRF o Conselho
funcionaria como um órgão supranacional em que representantes de diversos
segmentos e dos entes federativos e do Ministério Público poderiam nele sustentar seu ponto de vista e, juntos, chegarem às
conclusões que favorecessem a consolidação das contas públicas a partir da
uniformização de procedimentos em todo o País. Garantia-se, de antemão, a
segurança jurídica necessária, uma vez que a autonomia dos entes restaria
preservada.
No entanto, o legislador fiscal sabia perfeitamente que a
criação do Conselho poderia não ocorrer rapidamente. Por isso, a Lei definiu no § 2º de seu art. 50 que, enquanto não criado o Conselho, “A edição de normas gerais para consolidação das contas
públicas caberá ao órgão central de contabilidade da União”. Nascia
precisamente aqui a competência da Secretaria do Tesouro Nacional – órgão central
de Contabilidade do governo federal - para regulamentar a consolidação das
contas públicas no Brasil. Aqui está seu
fundamento de validade.
Observe, contudo, que a
própria LRF não transferiu todas as competências do Conselho de Gestão Fiscal
para a STN, mas tão-somente a competência para agir em prol da consolidação das
contas públicas. Todas as demais funções do Conselho continuam, portanto,
preservadas, até sua criação.
Pois bem. Enquanto órgão
central de Contabilidade da União a STN só dispõe de uma forma de manifestar
sua vontade: por meio de PORTARIAS.
Em relação à força normativas delas, tenho ouvido críticas no sentido de dizer
que elas não obrigam os entes federativos, justamente porque, na pirâmide
legislativa, ocupam posição inferior às leis; estas, sim, dotadas de força para fixar obrigações para os entes
subnacionais.
A afirmação, no entanto,
carece de fundamento e deve ser creditada à falta de conhecimento de causa.
Conforme visto, a
competência da STN encontra validade na própria Lei Complementar n. 101/2000 e
não no rol de suas competências ordinárias. É preciso que se entenda que a
atuação da STN no contexto da consolidação das contas nacionais não deve ser
interpretada como decorrente de vontade própria, mas do legislador fiscal, ao
regulamentar dispositivo de índole constitucional. Indiretamente, portanto, as
portarias da STN estão ligadas à própria Carta Magna, conforme representado na
figura a seguir:
Ou seja, há uma exigência
mútua. Primeiramente, a Magna Carta reclama a LRF. Na sequência, a própria LRF
exige a atuação da STN. São três níveis de exigências que se articulam entre
si. Os dois últimos níveis (LC 101/2000 e Portarias/STN) retiram seu fundamento
de validade do próprio Texto Constitucional.
Nesse sentido, atuando
a serviço da consolidação das contas, as portarias da STN possuem natureza só
FORMALMENTE infralegais, mas MATERIAMENTE legais. Por isso elas obrigam os
entes subnacionais.
Prova disso é o Manual de
Contabilidade Aplicado ao Setor Público que tem sido publicado por meio de
portarias. Cite-se, exemplificativamente, as Portarias/STN nºs 06/18, 07/18 e
877/18. O mesmo se aplica aos Manuais de Demonstrativos Fiscal que igualmente
foram publicados por meio de portarias, a exemplo das Portarias/STN nºs 286/19,
641/19 e 91/2020. Por fim, também se encontra nessa situação a Portaria/MF n.
548/2010, que estabeleceu os requisitos mínimos de segurança e contábeis do
sistema integrado de administração financeira e controle utilizado no âmbito de
cada ente da Federação, adicionais aos previstos no Decreto nº 7.185, de 27 de
maio de 2010.
A Portaria/MF n. 548/2010
retira seu fundamento de validade do art. 8º do Decreto nº 7.185/2020, nestes
termos:
Art. 8o No prazo de cento e oitenta dias a contar da data de
publicação deste Decreto, ouvidas representações dos entes da Federação, ato do
Ministério da Fazenda estabelecerá requisitos tecnológicos adicionais,
inclusive relativos à segurança do SISTEMA, e requisitos contábeis,
considerando os prazos de implantação do Plano de Contas Aplicado ao Setor Público
(PCASP), aprovados pela Secretaria do Tesouro Nacional.
O ato do Ministério da
Fazenda ali referido foi materializado
por meio da Portaria n. 548/2010. Ademais, conforme orienta o próprio artigo 8º,
referida Portaria não decorreu de uma vontade unilateral da Pasta da Fazenda,
mas depois de “ouvidas representações dos entes da Federação”. Portanto, os
demais entes subnacionais participaram da elaboração da Portaria/MF n. 548/2010,
legitimando-a em todos os seus aspectos. Não há, portanto, como tais entes
recusar-lhe sua aplicabilidade.
Por fim, citemos ainda o
Decreto federal nº 7.185/2010, fruto de exigência contida no inciso III,
parágrafo único, do art. 48 da LRF, dispositivo esse incorporado a ela pela Lei
Complementar n. 131/2009 (Lei da Transparência). Paira, igualmente, confusão
acerca desse decreto federal. Muitos acreditam que o referido Decreto não
obriga os demais entes federativos só pelo fato de sua natureza ser de um ato
regulamentar.
Há, aqui, o mesmo
problema.
Conforme visto, o
referido decreto federal encontra seu fundamento de validade na corpo da LRF.
Portanto, só FORMALMENTE ele é um puro ato regulamentar infralegal federal, não
MATERIALMENTE, uma vez que ele, assim como as portarias mencionadas, TAMBÉM
OBRIGAM NO PLANO JURÍDICO A TODOS OS ENTES SUBNACIONAIS (União, estados, DF,
municípios).
Com tais esclarecimentos
espanca-se, de uma vez por todas, qualquer discurso tendente a excluir da linha
de responsabilidade dos estados, DF e municípios, as portarias da STN
juntamente com a Portaria/MF n. 548/2010 e Decreto federal n. 7.185/2010.
Alipio
Reis Firmo Filho
Conselheiro
Substituto TCE/AM
segunda-feira, 12 de outubro de 2020
NOSSA CONSTITUIÇÃO ENVELHECEU?
(*) Texto publicado no Fato Amazônico, na Coluna do Autor (www.fatoamazonico.com.br)
Neste mês de outubro,
mais especificamente no último dia 05, a
Carta Magna completou 32 anos. Parece que foi ontem que assistíamos pela
televisão a solenidade de sua promulgação, por meio das palavras proferidas
pelo Dr. Ulisses Guimarães. Lá se vão um terço de século. De lá para cá muita coisa aconteceu. O mundo
mudou. O Brasil mudou. Os valores mudaram. Os costumes também.
A Carta de 1988 representou
o anseio por liberdade de uma nação que, por longos anos, sofrera grandes
limitações e tolhimentos por conta do regime militar então vigente. A liberdade
pessoal tornou-se necessidade de primeira grandeza e, com ele, inúmeros anseios.
Mencione-se, dentre os mais importantes, a vontade de eleger seus próprios
governantes, tendo por premissa a autonomia da vontade.
Nada obstante os
incontáveis avanços, não devemos nos esquecer que tudo sofre a ação do tempo.
Mesmo as coisas inanimadas perdem seu vigor. Deixe uma casa fechada por 30 anos
e veja o que acontece. O tempo é quem nos governa. Seu movimento é contínuo e
permanente. Nada o detém. Assim como nada pode se opor ao curso de um rio que
percorre um longo caminho até desaguar no oceano. Assim é o tempo. Assim também
a norma jurídica.
É preciso ter em conta
que o regime constitucional inaugurado há 32 anos atrás refletiu os valores de
seu tempo. Valores que a sociedade os tinha como “a menina de seus olhos”. Por
isso eram muito caros à sociedade brasileira da época. Muitos desses valores
foram recolhidos pelo legislador constituinte e incorporados na Carta de 1988.
A presunção de inocência, o direito ao voto e a filiação partidária obrigatória
foram apenas alguns, dentre tantos outros dispositivos constitucionais, que
consolidavam um regime constitucional que acabara de nascer e que precisava ser
nutrido, a fim de que não corresse o risco de sucumbir. Disso resultou uma
Constituição rígida. Difícil de ser alterada. É como se pretendêssemos que os
compartimentos constitucionais permanecessem para sempre, sujeita a uma ou
outra mudança, mas nada que ameaçasse sua estrutura. No fundo, essa maneira de
gestar nosso modelo constitucional parece deixar transparecer um certo medo
coletivo ou alguma insegurança. Eis uma ótima pauta de pesquisa para a
Antropologia.
Mas, como disse, tudo
envelhece. Para continuar sintonizada com seus súditos uma Constituição precisa
caminhar com eles de mãos entrelaçadas. Se não for assim, haverá rupturas que
darão origem a distanciamentos que, por sua vez, resultarão em queixas e
lamentações.
Creio que estamos
passando justamente por isso.
Muitos dos valores
cristalizados na Carta Magna de 1988 trouxe consigo alguns efeitos colaterais
que há época não nos foi possível cogitar. Nada mais natural. Estávamos em “lua
de mel”. Muitas janelas abertas para a liberdade eram, na verdade,
corredores que nos conduziam, na
verdade, a redutos hermeticamente fechados que, com o passar do tempo,
começaram a nos aprisionar. É como se fossem uma pedra no sapato. Por outro
lado, nesse tempo, a tábua de valores da sociedade brasileira mudou
profundamente. O conceito de sociedade politicamente desenvolvida do presente não
guarda similitude com muitas colunas plantadas no passado. Por isso muitos
desses valores começaram a se digladiar com os valores cristalizados há três
décadas atrás. Como sair desse imbróglio? Só pelo “jus sperniando”.
Alguns defendem que
caberia às emendas constitucionais atualizar a tábua de valores cristalizada no
Texto Constitucional colocando-a em sintonia com os valores sociais. Ledo
engano. Não aconteceu assim. A Constituição sofreu, sim, várias alterações, mas
nenhuma delas conseguiu dar a resposta que a sociedade esperava para superar
alguns nódulos malignos que começaram a aparecer com o decorrer do tempo.
Talvez a mais evidente na
atualidade seja a tal da prisão em segunda instância. A Constituição cidadã
proclamou a presunção da inocência até o trânsito em julgado de uma sentença
condenatória. Contudo, diante de tantas bizarrices jurídicas que temos
testemunhado, tornou-se muito difícil para significativa parcela da sociedade
brasileira conviver com referida disposição constitucional. O que temos
assistido são verdadeiros gatunos que se escondem por detrás da tal presunção
de inocência para continuar cometendo seus delitos.
E o que falar da filiação
partidária obrigatória? Também já não é possível convivermos com ela. Perdemos
excelentes postulantes a cargos eletivos justamente porque são preteridos por
muitos partidos políticos já na porta de entrada. Precisamos de uma Carta de Alforria!!! Aliás, já passou do
tempo.
Não é possível
convivermos mais com candidatos a cargos eletivos andando com o pires na mão
para mendigar o apoio partidário e, assim, emplacar suas candidaturas, muitas
vezes, em troca de apoios e renúncias nada republicanos.
E quanto ao voto
obrigatório? Será que também não chegou a hora de quebrarmos mais essa
barreira? Que democracia é essa que se comporta, algumas vezes, como verdadeira
ditadura branca? Nossa queixa do regime militar não nasceu justamente de
inconformismos como este? Pois bem. Por que então aceita-lo num regime
democrático? Quem é o dono do poder é o povo brasileiro! Ao menos, assim
proclama a Constituição cidadã já na sua porta de entrada. Ora, se é assim, porque não deixar o titular
do poder à vontade para decidir ou não pelo voto? Não é assim que procedem os
grandes modelos democráticos no mundo? Então. Por que não nos nivelarmos por
cima?
Esses são apenas alguns
dos muitos pontos que precisam ser revistos no Texto Constitucional. Há muitos
outros por lá. Não é difícil identifica-los. Não precisa nem mesmo enxerga-los
pelas lentes de suas disposições. Basta consultarmos as redes sociais que logo
os encontraremos.
Quando a norma jurídica
começa a causar desconfortos sociais isso significa que algo vai mal.
Guardadas as devidas
proporções, a patologia jurídica é muito semelhante à patologia biológica. Quando
um indivíduo apresenta quadro febril significa que agentes patológicos estão
dentro de seu organismo a ameaça-lhe a vida. De igual modo o ordenamento
jurídico.
Se existe embate entre os
valores sociais e os valores cristalizados na norma jurídica, seja ela
constitucional ou não, isso significa que há também um perigoso foco de
infecção que precisa ser combatido.
Do contrário, a
desestabilização política e social será o inevitável desfecho.
Em suma, tomando por
referência o quadro geral de insatisfação que tomou e tem tomado conta de
significativa parcela da sociedade brasileira, não há outra solução senão
calibrar o modelo constitucional vigente, aparando suas arestas e colocando-o
em perfeita sintonia com a tábua de valores sociais então vigentes.
Direito sem justiça é
qualquer outra coisa, mas, indubitavelmente, não é Direito.
Alipio
Reis Firmo Filho
Conselheiro
Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão
terça-feira, 22 de setembro de 2020
SOBRE O GRAU DE LETALIDADE DO NOVO CORONAVÍRUS
(*) Texto publicado na coluna do autor, no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)
A taxa de mortalidade da Covid-19
está nivelada por baixo. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o número de
mortos é de 962.008. Ou seja, próximo de 1 milhão de pessoas. O painel do Google
reconhece um número ligeiramente diferente desse: 965.529. Esses números retratam metade da população de
Manaus, aproximadamente.
Segundo a wilkipédia, a população mundial cravou 8,6 bilhões de pessoas em julho deste ano.
É pouco o número de mortos? Respondo: falar em poucas mortes é desconfortável, porque parece que precisariam morrer mais pessoas para admitirmos a gravidade. Morte é morte. 1 ou 1 milhão não importa. O ideal é que ninguém tivesse morrido. Além disso, a morte de uma única pessoa representa também a morte de seus familiares e amigos, pois quem morre deixa atrás de si um rastro de dor e sofrimento. Por essa ótica, o número de mortos é muito maior.
Mas não me refiro a esse fato quando afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo. Também não digo que há erro na contagem. O número expressa, relativamente bem, a dimensão das mortes no mundo causada pelo novo coronavírus. Se o número de mortos for um pouco mais (ou pouco menos) que 1 milhão de pessoas, a meu ver, a diferença é insignificante, pois a estatística já cumpriu o seu papel: já nos deu uma ideia, ainda que estimada, do número de pessoas que vieram a óbito. Nesse terreno, a precisão é desprezível.
Afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo porque a Covid-19 possui várias travas: distanciamento/isolamento social e o uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros, por parte da população em geral.
O que quero dizer é que só teríamos uma real ideia do número de mortos por Covid-19 no mundo e, por extensão, de seu real grau de letalidade, se não existissem essas travas.
Elas funcionam como verdadeiras barreiras protetoras, semelhantemente às paredes das hidrelétricas, que seguram a massa d’água. Apenas parte do rio é que desce através dela, fazendo girar as turbinas.
Com efeito, o número de mortos por Covid-19 expressa apenas o “filete de água” que passou pela parede das medidas preventivas (distanciamento/isolamento social, uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros).
Mas a estatística pode nos ajudar nesse trabalho. Quantas pessoas teriam morrido por Covid-19 se não existissem as referidas travas?
A última grande epidemia global foi a que assolou o mundo entre 1918/1920. Matou entre 50 a 100 milhões de pessoas. Considerando que a população mundial em 1920 era de 1 bilhão, 834 milhões de pessoas, percentualmente falando, o número de mortes oscilou entre 2,73 % (para 50 milhões de mortos) e 5,45 % (para 100 milhões de mortos).
Tais percentuais foram obtidos dividindo-se o número de mortos pelo número da população mundial naquela época.
Pois bem. Como informado, o planeta conta na atualidade com 7 bilhões e 800 milhões de indivíduos. Ora, aplicando sobre ela os referidos percentuais, o número de mortes na atualidade pela covid-19 oscilaria entre 213 milhões e 425,1 milhões de pessoas, ou seja, um número muito superior às mortes por covid-19, que, até agora, ficou abaixo de 1 milhão de pessoas.
Considerando o primeiro cenário, é como se morressem toda a população do Brasil (estimada em 211 milhões de pessoas); ou, tomando por referência o segundo cenário, isso equivale ao óbito de toda a população da américa do sul (estimada em 418 milhões de pessoas). A comparação com a pandemia de 1918/1920 é válida pois naquela época não havia as medidas preventivas que contamos na atualidade (uso de máscaras, álcool em gel, distanciamento/isolamento social, meios de comunicação em massa). Na comparação que fiz com a hidrelétrica, é como se não existisse parede alguma de contensão e a massa d'água fluísse com todo o seu vigor.
Entretanto, muito provavelmente o número de mortos na atualidade seria superior. Em razão de um dado simples: a mobilidade humana em nossos dias não se compara com a do início do século passado. Hoje a possibilidade de contato social é infinitamente superior o que indubitavelmente elevaria, a proporções geométricas, o número de infectados e de óbitos no mundo.
Por essa perspectiva, talvez, estaríamos testemunhando números apocalípticos: 600 milhões de mortos? 800 milhões de mortos? 1 bilhão de mortos? Ou muito mais que isso?
É um caso a pensar.
Num cenário como este, o melhor e mais bem equipado sistema de saúde do mundo teria sucumbido. Não seria páreo para um número de atendimentos tão grande. O mesmo se diga dos serviços funerários. Gigantescas covas coletivas teriam que ser abertas. Muitas delas, talvez, várias vezes superiores aos de um campo de futebol. Algo estarrecedor. Sem precedentes na História da Humanidade.
No início do século passado, portanto, tivemos uma ideia do poder mortal virótico e de sua capacidade destrutiva. De se ressaltar que o novo coronavírus é da mesma família do vírus que causou a referida pandemia.
Diante de estatísticas como essa, dirijo-me agora àqueles que teimam em criticar as medidas de prevenção adotadas pelas autoridades de saúde: quando você abrir sua boca para criticar as medidas de profilaxia adotadas, melhor permanecer em silêncio. Seja sábio (a) e não ignorante.
“Até o insensato passará por sábio se ficar quieto e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento” (Provérbios 17: 28)
sábado, 12 de setembro de 2020
O FUTURO DA LAVA-JATO
(*) Artigo publicado no Fato Amazônico, na Coluna do autor (www.fatoamazonico.com.br)
Completando seis anos de existência, a Lava-Jato tem colecionado simpatizantes e críticos ferrenhos. Ela foi responsável por investigações bombásticas que sacudiram os alicerces da República. Até então, figurões nunca tinham ganhado a mídia com tanta frequência. Principais personagens de histórias de um mesmo enredo: a corrupção.
Evidentemente que podem
ter ocorridos excessos, mas as virtudes, sem sombra de dúvidas, foram
infinitamente superiores. Ela mais deu do que retirou do Patrimônio moral
nacional.
Nada obstante os avanços,
a Lava-Jato tem perdido força já há algum tempo. Principalmente depois da saída
de seu principal articulista: Sérgio Moro. Desde quando deixou a Magistratura
para ocupar o cargo de Ministro da Justiça no Governo Bolsonaro, a Lava-Jato,
de certa forma, não foi mais a mesma. Curiosamente, testemunhamos o que nós,
brasileiros, apaixonados por futebol, costumamos observar nos gramados. Às
vezes, quando o principal jogador de um time deixa o campo ou não rende o
suficiente, as coisas começam a travar. Perde-se poder ofensivo. O caminho do
gol parece que fica mais distante. O entrosamento não acontece. Até parece que
os demais jogadores desaprenderam a jogar futebol.
Não foi diferente com a
Lava-Jato após a saída de Sérgio Moro.
Uma segunda baixa veio
com a saída de Deltan Dallagnol meses depois. Por motivos de saúde da filha,
Deltan deixou a Lava-Jato e também um grande vazio se instalou na foça tarefa.
Seus algozes aproveitaram
o momento de vulnerabilidade e investiram forte contra Deltan, mediante
denúncias contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Especialmente
uma delas, movida pelo Senador Renan Calheiros, surtiu o efeito esperado na
semana que passou. Por nove votos contra um o Conselho aplicou a pena de
censura ao Procurador da República, acolhendo a queixa de Renan Calheiros
segundo o qual Deltan havia interferido nas eleições à presidência do Senado em
2019. No entanto, o mais curioso é que foi a Advocacia Geral da União que
recorreu de uma decisão do Ministro Celso de Mello, que havia suspenso o
processo no CNMP. Nem mesmo o interessado – Renan Calheiros – havia tomado essa
inciativa. Devido à ausência do Ministro por razões de saúde, o recurso foi
analisado pelo Ministro Gilmar Mendes que decidiu pela retomada do processo
contra Deltan.
Em meio a tudo isso, o
futuro da Lava-Jato se torna incerto. Não sabemos até onde ela terá fôlego para
suportar os próximos golpes que certamente continuarão. Às vezes da parte de
quem foi pego por ela na boca da botija. Às vezes da parte de quem discursou
nas eleições de 2018 que caminharia de mãos dadas com a justiça e lutaria
ferrenhamente contra a corrupção. Uma enganação.
Como diz os evangelhos: “Nada
há de escondido que não venha a ser revelado, nem oculto que não venha a ser
conhecido” (Mt 10, 26).
Fica a lição: não é fácil
ser justo num país injusto. As cicatrizes, às vezes, são inevitáveis.
Alipio
Reis Firmo Filho