segunda-feira, 16 de novembro de 2020

AS ELEIÇÕES AMERICANAS E O VOTO NÃO OBRIGATÓRIO

(*) Artigo publicado na Coluna Gestão no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)


Por mais incrível que possa parecer, as eleições americanas não polarizaram apenas as intenções de votos dos eleitores do Tio Sam.  Também ela dividiu inúmeros “eleitores” por aqui.

Parte deles, simpatizantes do Governo Bolsonaro que, por força disso, apoiaram a tentativa de reeleição de Trump. A outra parte, formada pelos contrários à Bolsonaro, que levantaram a bandeira a favor de Jo Biden. Em meio a tantas opiniões divergentes, ora pró Biden, ora pró Trump, um detalhe importante não passou despercebido: o sistema eleitoral americano. Muito diferente do nosso. Não apenas em razão da figura dos delegados, mas também pelo voto facultativo. Por lá vota quem quiser. O voto não é obrigatório. Diferente do sistema eleitoral brasileiro que até admite o voto facultativo em algumas situações (pessoas com idade entre 16 e 18 anos ou acima de 70 anos; analfabetos), mas que obriga o comparecimento da maior parte de seu eleitorado às cabinas de votação.

No mundo, apenas 21 países adotam o voto obrigatório. Destes, 10 estão situados aqui na América Latina sendo que o Chile o aboliu em 2011. Entre os países do primeiro mundo, apenas a Suíça o reconhece em algumas de suas regiões. Ou seja, ao que tudo indica, estamos mais uma vez na contramão das economias avançadas.  

Nas eleições americanas deste ano votaram pouco mais de 151 milhões de eleitores. Muito abaixo do número máximo do eleitorado (230 milhões). Conquanto o número dos votantes represente apenas 65% do total, ele foi o maior em toda a história das eleições americanas. Em 2016, p. exemplo, compareceram às urnas apenas 138 milhões de eleitores, isto é, 13 milhões a menos. Lembrando que a diferença no número de eleitores de Biden em comparação com os de Trump foi de, aproximadamente, 5 milhões de votos, ou seja, dentro dos 13 milhões. Por isso mesmo, especula-se que a vitória de Biden foi impulsionada justamente pelo voto de quem apenas era um mero espectador nas eleições passadas e resolveu ir às urnas neste ano. Essa atitude confere maior credibilidade às eleições americanas referendando e legitimando a escolha de Biden para a Casa Branca. Em outras palavras, parece que Biden não foi eleito “por acaso”, mas sua vitória resultou de um efetivo desejo por mudanças de uma parcela determinante dos eleitores americanos.

Por aqui, nada obstante a obrigatoriedade do voto, tivemos quatro capitais que apresentaram abstenções superiores a 30%: Porto Alegre, Rio de Janeiro, Goiânia e Curitiba. Evidentemente que deverá ser considerado nesse cenário os efeitos da pandemia. Porém, em 2016 o percentual oscilou entre 16,4% e 24,3 %.  A situação se agrava quando computados os votos nulos e brancos.

Em Manaus, ela alcançou 18,23% no primeiro turno. Ou seja, 2 em cada cinco eleitores manauaras decidiram não votar.    

Nada obstante tais apontamentos, há um problema de fundo mais grave que depõe contra a obrigatoriedade do voto. Em outras palavras, o voto obrigatório conduz a algumas assimetrias quando admitido num regime democrático.

O primeiro deles é colocar o eleitor numa redoma obrigando-o a realizar algo que o próprio Texto Constitucional reconhece e declara solenemente quem é seu titular: “Todo o poder emana do povo (...)” (Parágrafo único, art. 1º, CF/88). Ora, não faz sentido um gesto tão grandioso como este, seguido de um imperativo, castrando-o naquilo que parecia ser seu bem jurídico mais precioso. Não existe verdadeira liberdade onde não comparece plenamente o direito de escolha. Afinal, a quem pertence de fato o poder? Ao povo ou ao legislador constituinte originário? Quem pode dele dispor? Creio que não é difícil respondermos a tais questões.

Portanto, por esta ótica parece que avançamos num primeiro momento, mas retrocedemos no instante seguinte. Ficamos meio que pela metade. Um pé lá e outro cá.

Outro desdobramento do voto obrigatório é que ele impõe aos eleitores a obrigação de também abraçarem uma ideologia político-partidária. Sim, porque o voto representa, em parte, justamente isso. Um eleitor que corrobora a maneira de pensar de uma agremiação partidária. Na prática sabemos que isso não acontece.

E aqui reside um outro problema.

Muito provavelmente, nem todas as escolhas refletem esse cenário. O fato de um eleitor votar em “A” ou “B” não significa, necessariamente, que ele concorda com a ideologia partidária nutrida por um ou por outro. Muitas vezes, o voto se manifesta mais por receio às possíveis sequelas prometidas pelo sistema eleitoral do que propriamente por uma identidade ideológica. É aqui que o voto facultativo ganha relevância. Ele oportuniza a cada eleitor – titular do poder – o direito de se identificar ou não com referida ideologia. Caso não se identifique ele tem a opção de não votar. Ninguém irá obriga-lo a se violentar em suas próprias convicções pessoais. É ele – apenas ele – que determina em quais situações deverá exercer seu direito (não sua obrigação) de votar. Talvez seja por isso que a maior parte dos países do mundo optaram por um sistema eleitoral que reconheça, efetivamente, a soberania do eleitor no direito de escolher seus representantes.  

Note que as soluções postas à disposição dos eleitores para comporem eventuais problemas de identidade ideológica nos sistemas de votação obrigatórios são (1) votar em branco, (2) anular o voto ou (3) abster-se, sofrendo as sanções prometidas pelo próprio sistema. Convenhamos, soluções nada republicanas.   

Isso tudo sem falar num outro problema que agrava ainda mais este cenário: a filiação partidária obrigatória. Por ela, apenas filiados a um partido político podem ser votados numa eleição. Trata-se de outra castração, semelhante à primeira.

Quem deseja se candidatar a um cargo eletivo nesta Terra Tupiniquim não pode ter ideologia própria. Tem que abraçar alguma ideologia partidária já existente. É como se ele assinasse um contrato de adesão com seu partido político. Trata-se de mera formalidade.

Então, temos o seguinte cenário: de um lado, eleitores cujas escolhas nem sempre recaem sobre os postulantes a cargos eletivos. De outro, postulantes a cargos eletivos cujas ideias nem sempre estão refletidas  no partido que escolheram para concorrer às eleições.

Vá entender esse imbróglio.

Coisas do Brasil.

Voto facultativo já!!

Filiação partidária não obrigatória já!!

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão

    

 

 

 

 

 

sábado, 17 de outubro de 2020

COMO POSSO TRADUZIR UM TEXTO EM PDF NUMA LÍNGUA ESTRANGEIRA PARA O PORTUGUÊS?

Pessoal, às vezes temos vários documentos em PDF escritos numa língua estrangeira (inglês, italiano, etc.) e precisamos traduzi-los para o português. A dica é visitar o site "onlinedoctranslator.com". Nele você poderá fazer essa tradução em segundos. O site traduz também documentos de outros formatos como Excel, Word, Txt, Power Point, .odt, .ods e .odp. 

Recomendo!!

Alipio Reis Firmo Filho



POR QUE ALGUMAS PORTARIAS DE NATUREZA FISCAL DA SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL OBRIGAM OS DEMAIS ENTES FEDERATIVOS?

 Até antes do advento da Lei Complementar n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) convivíamos com uma verdadeira “torre de babel”. A confusão decorria da coexistência de inúmeros códigos, nomenclaturas e procedimentos contábeis,  orçamentários e fiscais. Cada ente federativo, p. exemplo, tinha seu próprio plano de contas. Essa verdadeira “colcha de retalhos” dificultava a consolidação das contas, ou seja, a reunião de todos os dados dos entes subnacionais em demonstrativos que pudessem apresentar a situação orçamentária, contábil e fiscal de todos os entes em conjunto.

A solução veio com a LRF. Todavia, nem tudo ela podia estabelecer em detalhes. Ademais, vários procedimentos esbarravam no interesse e nas peculiaridades dos entes federativos, pois a dimensão continental do País representava um empecilho nessa empreitada.

Foi então que a Lei concebeu o Conselho de Gestão Fiscal, previsto em seu art. 67, nestes termos:

Art. 67. O acompanhamento e a avaliação, de forma permanente, da política e da operacionalidade da gestão fiscal serão realizados por conselho de gestão fiscal, constituído por representantes de todos os Poderes e esferas de Governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da sociedade, visando a:

I - harmonização e coordenação entre os entes da Federação;

II - disseminação de práticas que resultem em maior eficiência na alocação e execução do gasto público, na arrecadação de receitas, no controle do endividamento e na transparência da gestão fiscal;

III - adoção de normas de consolidação das contas públicas, padronização das prestações de contas e dos relatórios e demonstrativos de gestão fiscal de que trata esta Lei Complementar, normas e padrões mais simples para os pequenos Municípios, bem como outros, necessários ao controle social;

IV - divulgação de análises, estudos e diagnósticos.

§ 1o O conselho a que se refere o caput instituirá formas de premiação e reconhecimento público aos titulares de Poder que alcançarem resultados meritórios em suas políticas de desenvolvimento social, conjugados com a prática de uma gestão fiscal pautada pelas normas desta Lei Complementar.

§ 2o Lei disporá sobre a composição e a forma de funcionamento do conselho.

Para a LRF o Conselho funcionaria como um órgão supranacional em que representantes de diversos segmentos e dos entes federativos e do Ministério Público poderiam nele sustentar seu ponto de vista e, juntos, chegarem às conclusões que favorecessem a consolidação das contas públicas a partir da uniformização de procedimentos em todo o País. Garantia-se, de antemão, a segurança jurídica necessária, uma vez que a autonomia dos entes restaria preservada.

No entanto, o legislador fiscal sabia perfeitamente que a criação do Conselho poderia não ocorrer rapidamente. Por isso, a Lei definiu no § 2º de seu art. 50 que, enquanto não criado o Conselho, “A edição de normas gerais para consolidação das contas públicas caberá ao órgão central de contabilidade da União”. Nascia precisamente aqui a competência da Secretaria do Tesouro Nacional – órgão central de Contabilidade do governo federal - para regulamentar a consolidação das contas públicas no Brasil. Aqui está  seu fundamento de validade.    

Observe, contudo, que a própria LRF não transferiu todas as competências do Conselho de Gestão Fiscal para a STN, mas tão-somente a competência para agir em prol da consolidação das contas públicas. Todas as demais funções do Conselho continuam, portanto, preservadas, até sua criação.

Pois bem. Enquanto órgão central de Contabilidade da União a STN só dispõe de uma forma de manifestar sua vontade: por meio de PORTARIAS. Em relação à força normativas delas, tenho ouvido críticas no sentido de dizer que elas não obrigam os entes federativos, justamente porque, na pirâmide legislativa, ocupam posição inferior às leis; estas, sim, dotadas de força  para fixar obrigações para os entes subnacionais.

A afirmação, no entanto, carece de fundamento e deve ser creditada à falta de conhecimento de causa.

Conforme visto, a competência da STN encontra validade na própria Lei Complementar n. 101/2000 e não no rol de suas competências ordinárias. É preciso que se entenda que a atuação da STN no contexto da consolidação das contas nacionais não deve ser interpretada como decorrente de vontade própria, mas do legislador fiscal, ao regulamentar dispositivo de índole constitucional. Indiretamente, portanto, as portarias da STN estão ligadas à própria Carta Magna, conforme representado na figura a seguir:



Ou seja, há uma exigência mútua. Primeiramente, a Magna Carta reclama a LRF. Na sequência, a própria LRF exige a atuação da STN. São três níveis de exigências que se articulam entre si. Os dois últimos níveis (LC 101/2000 e Portarias/STN) retiram seu fundamento de validade do próprio Texto Constitucional.

Nesse sentido, atuando a serviço da consolidação das contas, as portarias da STN possuem natureza só FORMALMENTE infralegais, mas MATERIAMENTE legais. Por isso elas obrigam os entes subnacionais.

Prova disso é o Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público que tem sido publicado por meio de portarias. Cite-se, exemplificativamente, as Portarias/STN nºs 06/18, 07/18 e 877/18. O mesmo se aplica aos Manuais de Demonstrativos Fiscal que igualmente foram publicados por meio de portarias, a exemplo das Portarias/STN nºs 286/19, 641/19 e 91/2020. Por fim, também se encontra nessa situação a Portaria/MF n. 548/2010, que estabeleceu os requisitos mínimos de segurança e contábeis do sistema integrado de administração financeira e controle utilizado no âmbito de cada ente da Federação, adicionais aos previstos no Decreto nº 7.185, de 27 de maio de 2010.

A Portaria/MF n. 548/2010 retira seu fundamento de validade do art. 8º do Decreto nº 7.185/2020, nestes termos:

Art. 8o  No prazo de cento e oitenta dias a contar da data de publicação deste Decreto, ouvidas representações dos entes da Federação, ato do Ministério da Fazenda estabelecerá requisitos tecnológicos adicionais, inclusive relativos à segurança do SISTEMA, e requisitos contábeis, considerando os prazos de implantação do Plano de Contas Aplicado ao Setor Público (PCASP), aprovados pela Secretaria do Tesouro Nacional.

O ato do Ministério da Fazenda  ali referido foi materializado por meio da Portaria n. 548/2010. Ademais, conforme orienta o próprio artigo 8º, referida Portaria não decorreu de uma vontade unilateral da Pasta da Fazenda, mas depois de “ouvidas representações dos entes da Federação”. Portanto, os demais entes subnacionais participaram da elaboração da Portaria/MF n. 548/2010, legitimando-a em todos os seus aspectos. Não há, portanto, como tais entes recusar-lhe sua aplicabilidade.  

Por fim, citemos ainda o Decreto federal nº 7.185/2010, fruto de exigência contida no inciso III, parágrafo único, do art. 48 da LRF, dispositivo esse incorporado a ela pela Lei Complementar n. 131/2009 (Lei da Transparência). Paira, igualmente, confusão acerca desse decreto federal. Muitos acreditam que o referido Decreto não obriga os demais entes federativos só pelo fato de sua natureza ser de um ato regulamentar.

Há, aqui, o mesmo problema.

Conforme visto, o referido decreto federal encontra seu fundamento de validade na corpo da LRF. Portanto, só FORMALMENTE ele é um puro ato regulamentar infralegal federal, não MATERIALMENTE, uma vez que ele, assim como as portarias mencionadas, TAMBÉM OBRIGAM NO PLANO JURÍDICO A TODOS OS ENTES SUBNACIONAIS (União, estados, DF, municípios).

Com tais esclarecimentos espanca-se, de uma vez por todas, qualquer discurso tendente a excluir da linha de responsabilidade dos estados, DF e municípios, as portarias da STN juntamente com a Portaria/MF n. 548/2010 e Decreto federal n. 7.185/2010.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto TCE/AM


segunda-feira, 12 de outubro de 2020

NOSSA CONSTITUIÇÃO ENVELHECEU?

 (*) Texto publicado no Fato Amazônico, na Coluna do Autor (www.fatoamazonico.com.br)


Neste mês de outubro, mais especificamente no último dia 05, a  Carta Magna completou 32 anos. Parece que foi ontem que assistíamos pela televisão a solenidade de sua promulgação, por meio das palavras proferidas pelo Dr. Ulisses Guimarães. Lá se vão um terço de século.  De lá para cá muita coisa aconteceu. O mundo mudou. O Brasil mudou. Os valores mudaram. Os costumes também.

A Carta de 1988 representou o anseio por liberdade de uma nação que, por longos anos, sofrera grandes limitações e tolhimentos por conta do regime militar então vigente. A liberdade pessoal tornou-se necessidade de primeira grandeza e, com ele, inúmeros anseios. Mencione-se, dentre os mais importantes, a vontade de eleger seus próprios governantes, tendo por premissa a autonomia da vontade.

Nada obstante os incontáveis avanços, não devemos nos esquecer que tudo sofre a ação do tempo. Mesmo as coisas inanimadas perdem seu vigor. Deixe uma casa fechada por 30 anos e veja o que acontece. O tempo é quem nos governa. Seu movimento é contínuo e permanente. Nada o detém. Assim como nada pode se opor ao curso de um rio que percorre um longo caminho até desaguar no oceano. Assim é o tempo. Assim também a norma jurídica. 

É preciso ter em conta que o regime constitucional inaugurado há 32 anos atrás refletiu os valores de seu tempo. Valores que a sociedade os tinha como “a menina de seus olhos”. Por isso eram muito caros à sociedade brasileira da época. Muitos desses valores foram recolhidos pelo legislador constituinte e incorporados na Carta de 1988. A presunção de inocência, o direito ao voto e a filiação partidária obrigatória foram apenas alguns, dentre tantos outros dispositivos constitucionais, que consolidavam um regime constitucional que acabara de nascer e que precisava ser nutrido, a fim de que não corresse o risco de sucumbir. Disso resultou uma Constituição rígida. Difícil de ser alterada. É como se pretendêssemos que os compartimentos constitucionais permanecessem para sempre, sujeita a uma ou outra mudança, mas nada que ameaçasse sua estrutura. No fundo, essa maneira de gestar nosso modelo constitucional parece deixar transparecer um certo medo coletivo ou alguma insegurança. Eis uma ótima pauta de pesquisa para a Antropologia.

Mas, como disse, tudo envelhece. Para continuar sintonizada com seus súditos uma Constituição precisa caminhar com eles de mãos entrelaçadas. Se não for assim, haverá rupturas que darão origem a distanciamentos que, por sua vez, resultarão em queixas e lamentações.

Creio que estamos passando justamente por isso.

Muitos dos valores cristalizados na Carta Magna de 1988 trouxe consigo alguns efeitos colaterais que há época não nos foi possível cogitar. Nada mais natural. Estávamos em “lua de mel”. Muitas janelas abertas para a liberdade eram, na verdade, corredores  que nos conduziam, na verdade, a redutos hermeticamente fechados que, com o passar do tempo, começaram a nos aprisionar. É como se fossem uma pedra no sapato. Por outro lado, nesse tempo, a tábua de valores da sociedade brasileira mudou profundamente. O conceito de sociedade politicamente desenvolvida do presente não guarda similitude com muitas colunas plantadas no passado. Por isso muitos desses valores começaram a se digladiar com os valores cristalizados há três décadas atrás. Como sair desse imbróglio? Só pelo “jus sperniando”.

Alguns defendem que caberia às emendas constitucionais atualizar a tábua de valores cristalizada no Texto Constitucional colocando-a em sintonia com os valores sociais. Ledo engano. Não aconteceu assim. A Constituição sofreu, sim, várias alterações, mas nenhuma delas conseguiu dar a resposta que a sociedade esperava para superar alguns nódulos malignos que começaram a aparecer com o decorrer do tempo.

Talvez a mais evidente na atualidade seja a tal da prisão em segunda instância. A Constituição cidadã proclamou a presunção da inocência até o trânsito em julgado de uma sentença condenatória. Contudo, diante de tantas bizarrices jurídicas que temos testemunhado, tornou-se muito difícil para significativa parcela da sociedade brasileira conviver com referida disposição constitucional. O que temos assistido são verdadeiros gatunos que se escondem por detrás da tal presunção de inocência para continuar cometendo seus delitos. 

E o que falar da filiação partidária obrigatória? Também já não é possível convivermos com ela. Perdemos excelentes postulantes a cargos eletivos justamente porque são preteridos por muitos partidos políticos já na porta de entrada. Precisamos de uma  Carta de Alforria!!! Aliás, já passou do tempo.

Não é possível convivermos mais com candidatos a cargos eletivos andando com o pires na mão para mendigar o apoio partidário e, assim, emplacar suas candidaturas, muitas vezes, em troca de apoios e renúncias nada republicanos.

E quanto ao voto obrigatório? Será que também não chegou a hora de quebrarmos mais essa barreira? Que democracia é essa que se comporta, algumas vezes, como verdadeira ditadura branca? Nossa queixa do regime militar não nasceu justamente de inconformismos como este? Pois bem. Por que então aceita-lo num regime democrático? Quem é o dono do poder é o povo brasileiro! Ao menos, assim proclama a Constituição cidadã já na sua porta de entrada.  Ora, se é assim, porque não deixar o titular do poder à vontade para decidir ou não pelo voto? Não é assim que procedem os grandes modelos democráticos no mundo? Então. Por que não nos nivelarmos por cima?

Esses são apenas alguns dos muitos pontos que precisam ser revistos no Texto Constitucional. Há muitos outros por lá. Não é difícil identifica-los. Não precisa nem mesmo enxerga-los pelas lentes de suas disposições. Basta consultarmos as redes sociais que logo os encontraremos.

Quando a norma jurídica começa a causar desconfortos sociais isso significa que algo vai mal.  

Guardadas as devidas proporções, a patologia jurídica é muito semelhante à patologia biológica. Quando um indivíduo apresenta quadro febril significa que agentes patológicos estão dentro de seu organismo a ameaça-lhe a vida. De igual modo o ordenamento jurídico.

Se existe embate entre os valores sociais e os valores cristalizados na norma jurídica, seja ela constitucional ou não, isso significa que há também um perigoso foco de infecção que precisa ser combatido.

Do contrário, a desestabilização política e social será o inevitável desfecho.

Em suma, tomando por referência o quadro geral de insatisfação que tomou e tem tomado conta de significativa parcela da sociedade brasileira, não há outra solução senão calibrar o modelo constitucional vigente, aparando suas arestas e colocando-o em perfeita sintonia com a tábua de valores sociais então vigentes.

Direito sem justiça é qualquer outra coisa, mas, indubitavelmente, não é Direito.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão

         


terça-feira, 22 de setembro de 2020

SOBRE O GRAU DE LETALIDADE DO NOVO CORONAVÍRUS

(*) Texto publicado na coluna do autor, no Fato Amazônico (www.fatoamazonico.com.br)


A taxa de mortalidade da Covid-19 está nivelada por baixo. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o número de mortos é de 962.008. Ou seja, próximo de 1 milhão de pessoas. O painel do Google reconhece um número ligeiramente diferente desse: 965.529.  Esses números retratam metade da população de Manaus, aproximadamente.

 Segundo a wilkipédia, a população mundial cravou 8,6 bilhões de pessoas em julho deste ano.

É pouco o número de mortos? Respondo: falar em poucas mortes é desconfortável, porque parece que precisariam morrer mais pessoas para admitirmos a gravidade. Morte é morte. 1 ou 1 milhão não importa. O ideal é que ninguém tivesse morrido. Além disso, a morte de uma única pessoa representa também a morte de seus familiares e amigos, pois quem morre deixa atrás de si um rastro de dor e sofrimento. Por essa ótica, o número de mortos é muito maior.

Mas não me refiro a esse fato quando afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo. Também não digo que há erro na contagem. O número expressa, relativamente bem, a dimensão das mortes no mundo causada pelo novo coronavírus. Se o número de mortos for um pouco mais (ou pouco menos) que 1 milhão de pessoas, a meu ver, a diferença é insignificante, pois a estatística já cumpriu o seu papel: já nos deu uma ideia, ainda que estimada, do número de pessoas que vieram a óbito. Nesse terreno, a precisão é desprezível.

Afirmo que a taxa de mortalidade está nivelada por baixo porque a Covid-19 possui várias travas: distanciamento/isolamento social e o uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros, por parte da população em geral.

O que quero dizer é que só teríamos uma real ideia do número de mortos por Covid-19 no mundo e, por extensão, de seu real grau de letalidade, se não existissem essas travas.

Elas funcionam como verdadeiras barreiras protetoras, semelhantemente às paredes das hidrelétricas, que seguram a massa d’água. Apenas parte do rio é que desce através dela, fazendo girar as turbinas.

Com efeito, o número de mortos por Covid-19 expressa apenas o “filete de água” que passou pela parede das medidas preventivas (distanciamento/isolamento social, uso de acessórios como máscaras, escudo facial, álcool em geral, dentre outros).

Mas a estatística pode nos ajudar nesse trabalho. Quantas pessoas teriam morrido por Covid-19 se não existissem as referidas travas?

A última grande epidemia global foi a que assolou o mundo entre 1918/1920. Matou entre 50 a 100 milhões de pessoas. Considerando que a população mundial em 1920 era de 1 bilhão, 834 milhões de pessoas, percentualmente falando, o número de mortes oscilou entre 2,73 % (para 50 milhões de mortos) e 5,45 % (para 100 milhões de mortos).

Tais percentuais foram obtidos dividindo-se o número de mortos pelo número da população mundial naquela época.

Pois bem. Como informado, o planeta conta na atualidade com 7 bilhões e 800 milhões de indivíduos. Ora, aplicando sobre ela os referidos percentuais, o número de mortes na atualidade pela covid-19 oscilaria entre 213 milhões e 425,1 milhões de pessoas, ou seja, um número muito superior às mortes por covid-19, que, até agora, ficou abaixo de 1 milhão de pessoas.

Considerando o primeiro cenário, é como se morressem toda a população do Brasil (estimada em 211 milhões de pessoas); ou, tomando por referência o segundo cenário, isso equivale ao óbito de toda a população da américa do sul (estimada em 418 milhões de pessoas). A comparação com a pandemia de 1918/1920 é válida pois naquela época não havia as medidas preventivas que contamos na atualidade (uso de máscaras, álcool em gel, distanciamento/isolamento social, meios de comunicação em massa). Na comparação que fiz com a hidrelétrica, é como se não existisse parede alguma de contensão e a massa d'água fluísse com todo o seu vigor.

Entretanto, muito provavelmente o número de mortos na atualidade seria superior. Em razão de um dado simples: a mobilidade humana em nossos dias não se compara com a do início do século passado. Hoje a possibilidade de contato social é infinitamente superior o que indubitavelmente elevaria, a proporções geométricas, o número de infectados e de óbitos no mundo.

Por essa perspectiva, talvez, estaríamos testemunhando números apocalípticos: 600 milhões de mortos? 800 milhões de mortos? 1 bilhão de mortos? Ou muito mais que isso?

É um caso a pensar.

Num cenário como este, o melhor e mais bem equipado sistema de saúde do mundo teria sucumbido. Não seria páreo para um número de atendimentos tão grande. O mesmo se diga dos serviços funerários. Gigantescas covas coletivas teriam que ser abertas. Muitas delas, talvez, várias vezes  superiores aos de um campo de futebol. Algo estarrecedor. Sem precedentes na História da Humanidade.  

No início do século passado, portanto, tivemos uma ideia do poder mortal virótico  e de sua capacidade destrutiva. De se ressaltar que o novo coronavírus é da mesma família do vírus que causou a referida pandemia.

Diante de estatísticas como essa, dirijo-me agora àqueles que teimam em criticar as medidas de prevenção adotadas pelas autoridades de saúde: quando você abrir sua boca para criticar as medidas de profilaxia adotadas, melhor permanecer em silêncio. Seja sábio (a) e não ignorante.

“Até o insensato passará por sábio se ficar quieto e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento” (Provérbios 17: 28)


BOM DIA!

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto - TCE/AM e Doutorando em Gestão

sábado, 12 de setembro de 2020

O FUTURO DA LAVA-JATO

(*) Artigo publicado no Fato Amazônico, na Coluna do autor (www.fatoamazonico.com.br) 

Completando seis anos de existência, a Lava-Jato tem colecionado simpatizantes e críticos ferrenhos. Ela foi responsável por investigações bombásticas que sacudiram os alicerces da República. Até então, figurões nunca tinham ganhado a mídia com tanta frequência. Principais personagens de histórias de um mesmo enredo: a corrupção.

Evidentemente que podem ter ocorridos excessos, mas as virtudes, sem sombra de dúvidas, foram infinitamente superiores. Ela mais deu do que retirou do Patrimônio moral nacional.

Nada obstante os avanços, a Lava-Jato tem perdido força já há algum tempo. Principalmente depois da saída de seu principal articulista: Sérgio Moro. Desde quando deixou a Magistratura para ocupar o cargo de Ministro da Justiça no Governo Bolsonaro, a Lava-Jato, de certa forma, não foi mais a mesma. Curiosamente, testemunhamos o que nós, brasileiros, apaixonados por futebol, costumamos observar  nos gramados. Às vezes, quando o principal jogador de um time deixa o campo ou não rende o suficiente, as coisas começam a travar. Perde-se poder ofensivo. O caminho do gol parece que fica mais distante. O entrosamento não acontece. Até parece que os demais jogadores desaprenderam a jogar futebol.  

Não foi diferente com a Lava-Jato após a saída de Sérgio Moro.

Uma segunda baixa veio com a saída de Deltan Dallagnol meses depois. Por motivos de saúde da filha, Deltan deixou a Lava-Jato e também um grande vazio se instalou na foça tarefa.

Seus algozes aproveitaram o momento de vulnerabilidade e investiram forte contra Deltan, mediante denúncias contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Especialmente uma delas, movida pelo Senador Renan Calheiros, surtiu o efeito esperado na semana que passou. Por nove votos contra um o Conselho aplicou a pena de censura ao Procurador da República, acolhendo a queixa de Renan Calheiros segundo o qual Deltan havia interferido nas eleições à presidência do Senado em 2019. No entanto, o mais curioso é que foi a Advocacia Geral da União que recorreu de uma decisão do Ministro Celso de Mello, que havia suspenso o processo no CNMP. Nem mesmo o interessado – Renan Calheiros – havia tomado essa inciativa. Devido à ausência do Ministro por razões de saúde, o recurso foi analisado pelo Ministro Gilmar Mendes que decidiu pela retomada do processo contra Deltan.   

Em meio a tudo isso, o futuro da Lava-Jato se torna incerto. Não sabemos até onde ela terá fôlego para suportar os próximos golpes que certamente continuarão. Às vezes da parte de quem foi pego por ela na boca da botija. Às vezes da parte de quem discursou nas eleições de 2018 que caminharia de mãos dadas com a justiça e lutaria ferrenhamente contra a corrupção. Uma enganação. 

Como diz os evangelhos: “Nada há de escondido que não venha a ser revelado, nem oculto que não venha a ser conhecido” (Mt 10, 26).

Fica a lição: não é fácil ser justo num país injusto. As cicatrizes, às vezes, são inevitáveis.

 

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão 

sábado, 29 de agosto de 2020

ESCOLHENDO MELHOR AS LÂMPADAS PARA SUA CASA: TROCANDO AS LÂMPADAS DOS CÔMODOS DE SUA CASA

Talvez você ainda não tenha percebido, mas você pode economizar na conta de energia elétrica apenas trocando suas lâmpadas. Principalmente se suas lâmpadas forem incandescentes ou fluorescentes. Como? Vou te dizer.

Primeiro, faça um levantamento de todas as lâmpadas que existem na sua casa. Conte todas elas. Em cada compartimento.

Quando fizer o levantamento, tenha o cuidado de verificar quanto cada lâmpada consome de energia elétrica. Essa informação estará registrada normalmente na base da lâmpada, como mostra a figura:


Durante o levantamento, não esqueça de avaliar também se você está satisfeito com o nível de claridade em cada compartimento. P. exemplo: você pode achar que a luminosidade num quarto poderia ser melhor, mais reduzida ou, ainda, permanecer a mesma. Faça a mesma avaliação na sala, no corredor, na cozinha, etc.

Anote tudo. Aqui, há três situações a considerar.

A primeira, é que você poderá estar satisfeito com a iluminação do cômodo. Nesse caso, a luminosidade continuará a mesma. Pode acontecer, porém, que você pretenda alterar a luminosidade do cômodo, aumentando-a ou reduzindo-a. Registre também essa informação (para cada compartimento).

A luminosidade de uma lâmpada é medida em LÚMENS. É a quantidade de lúmens que determina quanto uma lâmpada brilha (muito, medianamente, pouco). O brilho de uma lâmpada (conjunto de lúmens) é chamado de Fluxo luminoso.

Há uma proporção entre o número de lúmens que uma lâmpada emite, isto é, seu fluxo luminoso e seu consumo de energia elétrica em Watt. Entretanto, essa proporção dependerá, ainda, se a lâmpada for incandescente, fluorescente ou de LED. A tabela a seguir apresenta os valores aproximados:


A partir dela você poderá trocar todas as lâmpadas de sua casa. Exemplificando.

Admitamos que em algum compartimento de sua casa exista uma lâmpada fluorescente de 17 Watts e você esteja satisfeito com a luminosidade dela (equivalente a 1.000 lúmens).  Pois bem. Basta substitui-la por uma lâmpada LED de 10 Watts, conforme mostra a tabela. Note que você continuará mantendo a mesma luminosidade, mas seu consumo de energia elétrica será reduzido: de 17 W para 10W, ou seja, haverá uma redução no consumo dessa lâmpada de 41%. Considere essa redução em todas as lâmpadas de sua casa!! Haverá uma economia significativa. 

Se, contudo, você desejar aumentar a luminosidade do ambiente, poderá optar por uma  lâmpada LED que emita mais lúmens (maior fluxo luminoso). Poderá ser uma de 12 W ou de 15 W. Mesmo que você escolha a lâmpada de maior consumo (15 W), ainda assim você estará consumindo menos energia elétrica em relação à lâmpada trocada (17 W). Perceba que a lâmpada LED de 15 W (1.500 lúmens) ilumina 50% mais que uma lâmpada fluorescente de 17 W (1.000 lúmens).

Mas pode ocorrer que você deseja reduzir a luminosidade no referido cômodo. Nesse caso, a solução será optar por uma lâmpada LED de 8 W ou 6 W. Você trocará 1.000 lúmens por, respectivamente, 800 e 600 lúmens. A boa notícia é que sua nova lâmpada irá consumir menos ainda energia elétrica.

Você fará isso para cada cômodo de sua casa. Anote tudo direitinho, antes de ir comprar suas lâmpadas.  

 Você talvez esteja se perguntando: e se na minha casa tiver uma lâmpada com número de watts que não exista na tabela? Exemplificando: pode acontecer que você deseja trocar uma lâmpada fluorescente de 15 Watts. Nesse caso, qual o número de lúmens que ela produz? Fácil. Basta fazer uma pequena regra de três:

Se 20 W produz 1.200 lúmens, 15 W produzirá quantos lúmens? Solução: 15 W x 1.200 lúmens / 20 W = 900 lúmens. De posse dessa informação, faça uma nova regra de três para calcular qual a lâmpada LED que você deverá comprar. Fácil também:

Se uma lâmpada LED de 10 W produz 1.000 lúmens, qual lâmpada LED (em watts) produzirá 900 lúmens? Solução: 900 lúmens x 10 W / 1.000 lúmens = 9 Watts. Ou seja, você deverá trocar sua lâmpada fluorescente de 15 W por uma LED de 9 W. Você estará economizando 40% no consumo de energia elétrica só nessa lâmpada.

Comprando suas lâmpadas LED

Não basta você saber quais lâmpadas LEDs você terá que comprar para cada cômodo de sua casa. É preciso ficar de olho no FABRICANTE DA LÂMPADA. É que lâmpadas  LEDs que possuem o mesmo consumo, algumas vezes, apresentam FLUXOS LUMINOSOS DIFERENTES, dependendo de seu fabricante. Veja o quadro a seguir:

 


Nesse caso, você provavelmente optará pelo fabricante B, pois ele lhe oferece mais lúmens (880) consumindo a mesma quantidade de energia elétrica (10 W). No entanto, isso também dependerá do preço cobrado. Se o preço do fabricante B for maior que o do fabricante A, caberá a você decidir. Eu, particularmente, compraria a do fabricante B, mesmo pagando mais caro, pois teria um consumo menor no final do mês. O custo/benefício nesse caso é muito positivo. Mas também você poderá ganhar duas vezes, ou seja, além de obter mais lúmens, você poderá pagar MENOS pela lâmpada, caso o preço ofertado pelo fabricante B seja menor que o do fabricante A. Por isso é importante observar todos esses detalhes quando você for comprar suas lâmpadas. Repito: sua fatura de energia elétrica poderá ficar menor no final do mês. Seu bolso certamente agradecerá.

Fica a dica