sábado, 29 de outubro de 2011

RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS DE CONTABILIDADE PÚBLICA


Para quem faz concursos públicos...

Em maio de 2011, o Chefe do Poder Executivo do Município de Azulão da Serra determinou que o responsável pela Contabilidade procedesse ao cálculo para apurar se havia recursos financeiros disponíveis para serem apontados para abertura de créditos adicionais, suplementares e/ou especiais. Nos termos da Lei Federal nº 4320/64, com os dados a seguir, extraídos do balanço patrimonial, referente ao encerramento ocorrido em 31 de dezembro de 2010, proceda ao exame para informar se ocorreu Superávit Financeiro e qual seu valor total a ser indicado para a abertura dos mencionados créditos adicionais.
Situação Patrimonial apresentada em 31 de dezembro de 2010:
C O N T A S                                                       Saldo Final R$31-12-2010
Caixa - Livre Movimentação                                                       5.000,00
Bancos - Livre Movimentação                                                245.000,00
Diversos Responsáveis                                                             40.500,00
Devedores Diversos                                                                 25.500,00
Bens Móveis                                                                          100.000,00
Bens Imóveis                                                                          250.000,00
Empréstimo a realizar vinculado a crédito especial aberto        100.000,00
Serviço da Dívida a Pagar                                                         22.500,00
Débitos de Tesouraria                                                               33.500,00
Depósitos de Terceiros                                                            12.500,00
Restos a Pagar                                                                         35.500,00
Créditos especiais transferidos do exercício anterior                150.000,00
Saldo a aplicar do empréstimo BID – recebido                         80.500,00

Após proceder aos cálculos pertinentes, pode-se concluir pela
(A) existência de Superávit Financeiro de R$ 75.000,00.
(B) existência de Superávit Financeiro de R$ 81.500,00.
(C) existência de Déficit Financeiro de R$ 81.500,00.
(D) existência de Superávit Financeiro de R$ 80.500,00.
(E) existência de Déficit Financeiro de R$ 33.500,00.

SOLUÇÃO

1 - Para o cálculo do resultado financeiro no balanço patrimonial sabemos que temos de subtrair o Passivo  Financeiro do Ativo Financeiro (parágrafo segundo, art. 43 da 4.320/64).
2 - O valor do Ativo Financeiro é de 316.000 (Caixa, Bancos, Diversos Responsáveis e Devedores Diversos).
3 - O valor do Passivo Financeiro é de 104.000 (Serviço da Dívida a Pagar, Débitos de Tesouraria, Depósitos de Terceiros, Restos a Pagar).
4- Subtraindo o PF do AF teríamos um superávit financeiro de 212.000.
5 - Dentro desse saldo existe um valor recebido, a título de empréstimo junto ao BID, no valor de 80.500. Portanto, esse valor não pode ser considerado como disponível. Devemos subtraí-lo do saldo de 212.000 e encontraremos 131.500.
6 - Temos mais duas outras importantes informações: um crédito especial transferido do exercício anterior (150.000). Parte dele (100.000) terá por fonte um empréstimo a realizar nesse valor. A diferença (50.000) é que deverá ser subtraída de 131.500 e encontraremos a resposta: 81.500 (superávit financeiro, alternativa B).
7 - Esse último cálculo decorre do disposto na parte final do parágrafo segundo do art. 43 da Lei 4.320/64 (...conjungando-se, ainda, o saldo dos créditos adicionais transferidos e as operações de crédito a eles vinculadas).

domingo, 23 de outubro de 2011

REFLEXÕES ACERCA DO PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO DA DESPESA PÚBLICA

A Liquidação da Despesa corresponde ao segundo estágio de execução da despesa pública. Ela é tratada no Volume I do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público[1].  O Manual invoca o conteúdo do caput do art. 63 da Lei n° 4.320/64 para caracterizá-la afirmando que a liquidação consiste na verificação do direito adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito. Também reproduz os parágrafos primeiro e segundo daquele dispositivo, nos quais estão descritas, respectivamente, a finalidade e os documentos que servirão de base ao processo de avaliação, conforme abaixo:

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
II - a importância exata a pagar;
III – a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo;
II - a nota de empenho;
III – os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço”   

Nada obstante, é preciso deixar claro que o processo de liquidação das despesas públicas comporta três fases distintas. São elas:

a) a fase material;
b) a fase cognitiva;
c) a fase de aceite.

 A primeira delas – etapa material – dá início a todo o processo de liquidação da despesa. Corresponde ao momento em que o fornecedor (do bem, do serviço ou o executor da obra) entrega à Administração o que foi por ela solicitado.  Esta fase é chamada de fase material exatamente porque todo o processo é percebido pelos sentidos (especialmente o tato e a visão).

Na fase material, a Administração ocupa uma posição passiva concentrando-se tudo o mais nas mãos do fornecedor. Ela apenas recebe o bem, o serviço (ou parcela deste) ou a obra (ou sua parcela). A partir de então, a unidade administrativa recebedora passa a ser responsável pela guarda e conservação daquilo que lhe foi entregue, mas não poderá usá-lo na prestação dos serviços públicos uma vez que ainda restam duas fases para que todo o processo de  liquidação da despesa se aperfeiçoe em toda a sua integralidade (fases cognitiva e de aceite).

A Lei n. 8.666/93 distingue duas modalidades de recebimentos: o provisório e o defintivo[2]; fixando, ainda, hipóteses em que o recebimento provisório poderá ser dispensado[3]. Desta feita:

- caso a Admnistração tenha solicitado 100 (cem computadores) de seu fornecedor a fase material corresponderá à entrega dos computadores solicitados;

- na hipótese de a Administração haver contratado a limpeza de um terreno de sua propriedade, a fase material será manifestada pela entrega do terreno limpo por parte do prestador do serviço;

- se, contudo, a demanda da Administração for pela construção de uma quadra poliespotiva, a fase material realizar-se-á por meio da entrega da mesma. 

Mas não fará sentido algum se os computadores, o terreno limpo e a quadra construída não possam ser colocados à disposição do serviço público, isto é, não possam ser usados nas finalidades previstas. Para tanto, urge que, imeditamente após cada entrega, inicie-se a fase cognitiva, esta, sim, de inteira responsabilidade da própria Administração.

A fase cognitiva é marcada pelo momento em que a Administração debruça-se sobre o bem, serviço ou obra realizada no sentido de reconhecer ou apurar (§ 1° do art. 63 da Lei n. 4.320/64):

·         a origem do que se deve pagar;
·         a importância exata a pagar; e
·         o beneficiário da importância a ser paga.

Para tanto, a Administração analisará cuidadosamente toda a gama de documentos que suportaram o que lhe fora entregue (contrato, ajuste ou acordo respecitivo; a nota de empenho; os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço), consoante dispõe o § 1° do art. 63 da Lei n. 4.320/64.

A Lei n. 8.666/93 faz alusão a esta fase em algumas oportunidades:

“Art. 73.  Executado o contrato, o seu objeto será recebido:
I - em se tratando de obras e serviços:
a) provisoriamente (…);
b) definitivamente, por servidor ou comissão designada pela autoridade competente, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
II - em se tratando de compras ou de locação de equipamentos:
a) provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação;
b) definitivamente, após a verificação da qualidade e quantidade do material e conseqüente aceitação.

É na fase cognitiva que a Administração convence-se que o que lhe foi entregue,  guarda inteira conformidade com aquilo que demandou. Nesta fase há um intenso trabalho de ordem intelectual por parte da contratante, a fim de identificar vícios, defeitos ou incorreções resultantes da execução ou de materiais empregados (art. 69 da Lei n. 8.666/93). Daí, a propósito, o seu nome[4]. Na etapa cognitiva a Administração adotará um comportamento preponderantemente ativo, em contraste com a fase manterial na qual, conforme dissemos, sua passividade será a tônica principal.

Essencialmente, a Administração verificará:

a) o cumprimento das normas sobre licitação ou documento formalizando a sua dispensa, ou comprovando a sua inexigibilidade;
b) a conformidade com o contrato, convênio, acordo ou ajuste, se houver; e
c) o conteúdo da nota de empenho avaliando-o com o da nota fiscal ou documento equivalente.

Identificada alguma falha que represente algum óbice, por mínimo que seja, ao reconhecimento do dever de pagar, o fornecedor deverá ser imediatamente contatato, a fim de reparar, corrigir, remover, reconstruir ou substituir, às suas expensas, no total ou em parte, o objeto do contrato (art. 69 da Lei n. 8.666/93). Se, ao contrário, o bem, o serviço ou a obra entregue for considerado adequado, em quantidade e em qualidade, a Administração dará o seu “de acordo”. Nesse momento, assumirá, juridicamente falando, o dever de pagar uma quatia financeira correspondente; ao mesmo tempo em que realizará a última fase do processo de liquidação da despesa, qual seja, o ateste. A partir de então, a unidade administrativa que até então assumira a responsabilidade de somente guardar e conservar o que lhe fora entregue, também poderá utilizá-lo na prestação dos serviços públicos.

Em síntese, o estágio da liquidação da despesa será iniciado com a fase material, submeter-se-á a uma fase cognitiva vindo, em seguida, a se aperfeiçoar mediante o ateste manifestado pela Administração. Somente após é que existirá, juridicamente, a obrigação de pagar, habilitando-se o fornecedor ao direito de receber a contrapartida financeira correspondente.    



[1] O Volume I do Manual dispõe sobre os Procedimentos Contábeis Orçamentários.
[2] Art. 73.
[3] Art. 74.
[4] Cognição corresponde a ato ou processo de conhecer, inclui estados mentais e processos como pensar, a atenção, o raciocínio, a memória, o juízo, a imaginação, o pensamento, o discurso, a percepção visual e audível, a aprendizagem, a consciência, dentre outras.

sábado, 22 de outubro de 2011

O RELATOR NOS TRIBUNAIS DE CONTAS

              Dependendo da esfera de governo onde atuem, temos quatro categorias de Tribunais de Contas no Brasil. Na esfera federal temos o Tribunal de Contas da União; no âmbito estadual os Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal; em algumas unidades federativas como os Estados do Pará e de Goiás, aparecem os Tribunais de Contas dos Municípios;  e, por fim, junto aos Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro há o Tribunal de Contas do Município.

              Os tribunais de contas são órgãos administrados por um colegiado. No Tribunal de Contas da União cada membro desse colegiado é chamado de Ministro (nove Ministros); enquanto nos outros órgãos de contas temos os Conselheiros (sete Conselheiros). Tanto os Ministros quanto os Conselheiros possuem substitutos chamados de Auditores.

              Respeitadas as particularidades de cada estrutura, a relação entre os ministros/conselheiros e seus respectivos auditores (nos tribunais de contas) é a mesma existente entre os juízes titulares e seus juízes substitutos (na magistratura). Assim como os juízes substitutos atuam nas ausências do juiz titular (férias, afastamentos para tratamento de saúde etc.); os auditores também assumem as funções dos ministros e conselheiros nesses e em outros afastamentos. 

              Mas há ainda uma importante característica comum entre ministros/conselheiros e os auditores. Ambos relatam processos. E por assumirem essa função responsabilizam-se pelo seu saneamento, isto é, pela supressão de dúvidas e lacunas existentes no processo. O objetivo do saneamento é prepará-lo para ser  julgado pelo respectivo colegaido (Tribunal Pleno/Câmaras). Por isso são chamados de Relatores. Ser relator de um processo é, portanto, chamar para si a função de saneá-lo. O Relator é o presidente do processo (de prestação e tomada de contas, de admissões e concessões, de denúncias, de representações etc.). 

             Na função de relator os auditores produzem uma proposta de voto; enquanto os ministros/conselheiros proferem um voto. O voto (ou a proposta de voto) representam a conclusão do ministro/conselheiro (ou do auditor) sobre o processo. As propostas de votos formuladas pelos auditores podem ou não prevalecer. Tudo dependerá se os ministros/conselheiros concordarem com o ponto de vista dos auditores. Mas há duas situações em que os auditores formulam votos. A primeira é quando eles estão substituindo os ministros/conselheiros; a segunda é quando são convocados para compor quorum durante as sessões de julgamentos. No primeiro caso eles exercitam a judicatura plena; no último a judicatura restrita. 

              Quando estiverem no exercício da judicatura plena os processos distribuídos aos auditores serão por eles relatados na condição de ministro/conselheiro até o seu arquivamento. Ficarão permanentemente a eles vinculados.

              Dito de outra forma. 

            Todas as vezes que se manifestarem nesses processos  os auditores o farão como se fossem ministros/conselheiros. Terão, portanto, o mesmo "peso" dos titulares. Por isso mesmo, os ministros/conselheiros substituídos ficarão impedidos de votar na sessão de julgamento em que tais processos forem apreciados.

               Em síntese, poderíamos dizer:

               a) ministros, conselheiros e auditores presidem os processos que lhes forem distribuídos;
               b) por presidirem os procesos eles são chamados de relatores;
               c) o exercício da relatoria pelo auditor não depende de ele está ou não substituindo o ministro/conselheiro correspondente. Quando não está substituindo ministro/conselheiro o auditor preserva sua condição de relator;
               d) o auditor, assim como os ministros/conselheiros, é responsável pelo saneamento dos processos de sua relatoria. O saneamento é realizado pela supressão de dúvidas e/ou lacunas processuais preparando os autos para serem apreciados pelo órgão colegiado (Tribunal Pleno/Câmaras);
               e) nos afastamentos dos ministros/conselheiros (férias, etc.) os auditores exercem a judicatura plena. Nessa condição, proferem votos, de forma semelhante aos ministros/conselheiros substituídos;
               f) os auditores também exercem a jurisdição restrita, para fins de composição de quorum nas sessões de julgamento;
                g) quando não estão substituindo ministro/conselheiro os auditores proferem propostas de voto; quando exercem as jurisdições plena ou restrita,  manifestam votos.     

               

   

          

               
   

domingo, 16 de outubro de 2011

JULGAMENTO DAS CONTAS DE GESTOR JÁ FALECIDO: É POSSÍVEL?

             No dia de hoje (16/10/2011) a imprensa local deu destaque, talvez em tom de crítica, ao fato de o Tribunal de Contas do Estado do Amazonas ter julgado as contas de alguém já falecido. Ainda que cause um certo desconforto, o fato é que o procedimento é perfeitamente possível. Pensemos na seguinte situação:

             Um gestor público apresentou sua prestação de contas no ano 2. As contas apresentadas foram relativas ao ano 1.  Foram identificadas algumas irregularidades nas contas, algumas delas ensejando a devolução de recursos. Chamado a se manifestar, o gestor apresentou suas justificativas.  Contudo, não conseguiu esclarecer os questionamentos formulados nem justificar parcelas de recursos gastos de forma irregular. Após as devidas análises, o processo finalmente foi a julgamento no ano 5. Infelizmente, o gestor faltoso veio a falecer no ano 4, mas após ter apresentado suas justificativas (ocorridas no ano 3). 

              Por expressa disposição constitucional o Tribunal terá de julgar suas contas, ainda que após seu falecimento. Do contrário, deixará de cumprir o disposto no inciso II do art. 40 da Constituição estadual e aí, sim, estará cometendo uma arbitrariedade. Portanto, a saída que nos pareceria mais plausível - arquivamento processual -, colide com o mandamento Constitucional.

                Apenas uma limitação lhe será imposta: a impossibilidade de aplicação de pena ao responsável falecido.  A razão, para tanto, decorre do inciso XLV do artigo 5º da Constituição Federal, ao determinar que nenhuma pena passará da pessoa do condenado. Ora, se somente o condenado é que poderá cumpri-la conclui-se, por óbvio, que a penalização de alguém falecido restará inócua. Daí a impossibilidade de penalizá-lo.

                   Mas isso não impedirá que o Tribunal julgue suas contas já que todas as etapas processuais foram observadas, isto é, houve pleno cumprimento do princípio do devido processo legal e todos os demais deles decorrentes (princípios do contraditório e da ampla defesa, dentre outros). No exemplo ilustrativo, havendo determinação para a devolução de recursos  a obrigação passará aos seus sucessores e contra eles também será executada, até o limite do valor do patrimônio transferido.  Essa disposição também encontra amparo na parte final do dispositivo federal mencionado.

           De se ressaltar, por último, que ao proferir o  julgamento pela irregularidade das contas de seus jurisdicionados não há que se falar em sanção, mas numa avaliação das contas anuais. É, por assim dizer, um juízo de valor que o Tribunal profere. Por isso ele poderá ser operado ainda que o responsável já tenha falecido, conforme descrito no exemplo dado.     





sábado, 15 de outubro de 2011

CUIDADO COM SUA PRIVACIDADE!!!

          Tenho observado que nas redes de relacionamentos é cada vez mais comum as pessoas exporem particularidades de sua vida íntima, muitas vezes, sem qualquer reserva.  Talvez isso decorra da impressão de estarmos sempre entre amigos. Sabemos, contudo, que no mundo da tecnologia da informação as coisas não funcionam desse modo. A todo instante podemos ser alvo de pessoas inescrupulosas, sempre a procura de um detalhe que possa ser uma porta aberta a visitas indesejáveis. 

          Falo de quem, num momento de descontração e pura abertura do coração, veicula fotos que revelam pequenos mas importantes detalhes de sua vida particular. Uma simples foto tirada no interior de nosso lar, em que compartilhamos momentos de descontração com nossos amigos, talvez seja a senha de acesso. Ela poderá servir de peça para a montagem de alguns quebra-cabeças (a posição de uma janela, a localização do muro dos fundos, a trinca da fechadura da garagem, a mobília da casa, etc., tudo pode ser útil). Outras vezes a simples revelação do lugar em que irei almoçar, jantar ou lanchar com um(a) amigo(a), o(a) namorado(a), o(a) esposa(o), os filhos, também pode funcionar como um inimigo em potencial.  

          E não pensemos que isso é coisa de ficção ou que se passa apenas na cabeça de pessoas neuróticas. Em absoluto. A violência que impera no mundo, em nosso país, em nossa cidade; e que, a cada dia, chega mais perto de nós é um claro sinal disso. Infelizmente, vivemos num tempo em que temos que redobrar a atenção com nós mesmos, com nossa família, com nosso lar,  para não sermos presa fácil dela. 

         Reflita sobre isso e...passe adiante essa informação!!!          

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

ENTENDA AS DIFERENÇAS ENTRE DIREITO MATERIAL e DIREITO PROCESSUAL


           
            Para que possamos entender convenientemente o que a vem ser o Direito Processual é preciso, antes, entendermos o que é o Direito Material; quais suas características, suas particularidades.

            Numa primeira palavra, poderíamos dizer que o Direito Material é aquele que se manifesta em uma das seguintes situações na vida de cada um de nós:

a) entrega-nos algum direito; ou
b) retira-nos algum direito (que já possuíamos); ou
c) modifica algum direito (que também já possuíamos), transformando-o.

Mas... em que momento ocorre cada uma dessas manifestações? Vamos a três exemplos.

O atual Código Civil[1]  determina que aos dezoito anos de idade ficamos habilitados à prática de todos os atos da vida civil (art. 5º). Isso significa que antes de atingirmos este estágio de nossa vida não poderíamos exercer, sozinhos, os atos de natureza civil (assinar um contrato de compra e venda, p. exemplo). Pois bem, ao completarmos dezoito anos realiza-se, na prática, uma previsão legal, contida numa norma de Direito Material: o Código Civil. Com efeito, aos dezoito anos de idade incorpora-se, automaticamente, um direito ao nosso patrimônio jurídico[2], ampliando-o. Assim, nosso patrimônio jurídico ficará maior que antes.  

O Código Tributário Nacional prevê em seu artigo 173, caput, que o direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se em cinco anos, contados da ocorrência das situações descritas em seus incisos I e II e em seu parágrafo único. Com efeito, após esse prazo, e desde que não tomadas as providências necessárias à constituição do crédito, a Fazenda Pública perderá um direito que, até então, estava incorporado ao seu patrimônio jurídico. Em decorrência, esse patrimônio jurídico ficará menor que antes.

Continuemos.

O Código Penal[3] impõe três modalidades de penas: as privativas de liberdade, as restritivas de direitos e as penas de multa. Vamos nos ater às penas privativas de liberdade.

As penas privativas de liberdade, em regra, deverão ser executadas de forma progressiva, obedecendo à seqüência[4]: se condenado à pena superior a oito anos o apenado  deverá  iniciar o cumprimento de sua pena no regime fechado; se, contudo, o apenado não for reincidente e sua pena for superior a quatro anos, mas igual ou inferior a oito anos, deverá iniciar sua execução em regime semi-aberto e, por último, caso o condenado seja não reincidente e sua pena for igual ou inferior a quatro anos deverá iniciar o seu cumprimento em regime aberto. Normalmente não pensamos assim, mas quando alguém é condenado ele passa a ter um “direito” a uma certa e determinada modalidade de pena. Pois bem. Ocorre que o mesmo Código Penal prevê em seu art. 60, § 2º, que na hipótese de aplicação de pena privativa de liberdade cuja duração não seja superior a seis meses o condenado terá direito à substituição de sua pena por outra modalidade: a pena de multa. Nestas condições, o condenado que se viu, num primeiro momento, apenado por uma modalidade de sanção (restritiva de liberdade) terá seu direito transformado em uma outra modalidade de pena, a saber, a pena de multa (desde que, é evidente, preencha os requisitos da norma penal). Em outras palavras, seu patrimônio jurídico será modificado qualitativamente, não quantitativamente, se quisermos recorrer a uma linguagem contábil para melhor compreensão do aqui exposto. É assim, portanto, que os direitos se modificam, se transformam no mundo do Direito: desincorporam algumas características ao mesmo tempo que incorporam outras.     

  Nos três exemplos considerados, tomados a partir de disposições contidas no Código Civil, no Código Tributário Nacional e no Código Penal, manifestou-se o Direito Material outorgando, retirando ou transformando um direito (a/de alguém).

E onde nasce o Direito Processual? Em que momento ele se manifesta? Bem, o Direito Processual vem completar o Direito Material e se manifesta no momento em que o Direito Material já não pode, por si só, fazer prevalecer o que ele determina. Ele precisa, pois, de alguém que o execute, que o coloque em prática. Como assim? Esclarecemos.

Você já deve ter ouvido dizer que a cada direito corresponde um dever. É como na Ciência Contábil: a cada crédito corresponderá um débito. Assim, da mesma forma que na Contabilidade não há débito sem crédito; no Direito não é admissível a existência de um direito sem um correspondente dever.

Muitas vezes, contudo, o dever imposto a alguém resumir-se-á numa obrigação desse alguém de entregar algo ao titular do direito correspondente. Entretanto, é possível que o titular do dever não cumpra, voluntariamente, essa obrigação a ele imposta, a exemplo de alguém que provoca dano material no veículo de outrem, mas que entende que o acidente decorreu de culpa exclusiva da outra parte não tendo, por isso mesmo, obrigação de reparar o dano. Nessas condições, o que fazer? Bem, para a Ciência Jurídica somente o Estado é que detém o Direito de obrigar alguém a cumprir uma obrigação. Nós, pobres mortais, não possuímos esse direito. Dessa forma, a saída será pedir ao Estado que intervenha e obrigue a outra parte a cumprir a sua obrigação. Como? Provocando-o. Se nós não provocarmos o Estado jamais ele virá em nosso socorro[5]. E o órgão do Estado que virá em nosso auxílio será o Judiciário. Teremos, portanto, que provocar o Poder judicante estatal para realizar um direito incorporado ao nosso patrimônio jurídico. Ocorre, contudo, que o Estado é muito poderoso. É como se ele fosse um grande rolo compressor que, ao fazer alguém cumprir a sua obrigação, poderá, ao mesmo tempo, machucá-lo. Foi por causa disso, então, que foi necessário se criar um outro bloco de regras jurídicas capazes de atenuar a força propulsora estatal impondo-lhe freios e contrapesos. Nasceu, então, o que denominamos hoje de Direito Processual. Este, em última análise, persegue dois objetivos:

a) fazer valer o direito de alguém contra uma outra pessoa (quando assim entender pertinente); e
b) não machucar, nesse processo, a pessoa sobre a qual se impõem a correspondente obrigação.          

Cumpre-nos esclarecer, ainda, que todas as vezes que você ouvir falar em Direito Civil, Direito Tributário, Direito Eleitoral, Direito Administrativo, Direito Constitucional etc.,  você estará diante de um Direito Material. Quanto ao Direito Processual, será fácil identificá-lo em algumas situações pois já trará, em seu título, esta característica, como o  Direito Processual Civil, o Direito Processual Penal e o Direito Processual do Trabalho. Em outras situações, contudo, suas regras estarão como que “misturadas” com as regras do Direito Material, a exemplo do Código Eleitoral que contém tanto regras do Direito Material Eleitoral quanto normas de Direito Processual Eleitoral. Nestas situações as normas de um e outro ramo do Direito conviverão lado a lado. Também vale a pena esclarecer que o Direito Material poderá ser Público ou Privado. Já o Direito Processual será sempre público. Isto em razão, conforme dissemos, de suas normas destinarem-se a controlar o poderio estatal frente a alguém sobre o qual se impõe uma obrigação e que se recusa a cumpri-la voluntariamente.    


[1] Lei nº 10.406/2002.
[2] O termo “patrimônio jurídico” aqui por nós empregado tem o mesmo significado, guardadas as devidas proporções, de seu congênere, o “Patrimônio Contábil”, usado na Contabilidade. Desta feita, assim como o patrimônio contábil é constituído por um conjunto de bens, direitos e obrigações; o patrimônio jurídico compõe-se de um conjunto de direitos e obrigações atribuídos pelo Direito Material a cada indivíduo. Dessa forma, todos nós temos, em maior ou menor grau, um patrimônio jurídico, assim como cada pessoa jurídica, com ou sem fins lucrativos, possui um patrimônio contábil.
[3] Inciso I, II e III do art. 32.
[4] Art. 33, § 2º.
[5] Apenas em raras situações o Estado agirá de ofício.

sábado, 8 de outubro de 2011

PARÂMETROS PARA INSCRIÇÃO DE RESTOS A PAGAR NÃO PROCESSADOS

Muitos entes da federação, em especial, alguns Estados e a maior parte dos Municípios,  não possuem nenhuma legislação disciplinando o procedimento de inscrição dos restos a pagar não processados. Isso se constitui num sério problema pois, na ausência de uma legislação específica, qualquer despesa poderá ser inscrita.
A União, ao contrário, desde 1986, possui legislação própria sobre o assunto. Trata-se do Decreto n. 93.872/86[1]. De acordo com esse normativo[2], há 05 (cinco) hipóteses em que está autorizada a inscrição das despesas orçamentárias em restos a pagar não processados. Fora delas, o empenho correspondente deverá ser anulado. Vejamos:
a) vigente o prazo para cumprimento da obrigação assumida pelo credor, nele estabelecida;
b) vencido o prazo de que trata o item anterior, mas esteja em cursos a liquidação da despesa, ou seja de interesse da Administração exigir o cumprimento da obrigação assumida pelo credor;
c) se destinar a atender transferências a instituições públicas ou privadas;
d) corresponder a compromissos assumido no exterior.
Comentemos cada uma dessas hipóteses.
A primeira delas contempla as situações em que, ao término do exercício (31.12), os fornecedores ainda dispõe de prazo para cumprirem a obrigação assumida.  Vejamos a seguinte situação.
1 - Empenho emitido em 10/12.
2 – Prazo para cumprimento da obrigação: 30 dias.
3 – Término do prazo para cumprimento da obrigação: 09/01 (do ano subsequente).
Nesse caso, o empenho não poderá ser anulado pois vigente o prazo para cumprimento da obrigação assumida pelo credor fixado na respectiva nota de empenho.
Na letra “b” há duas situações. A primeira (vencido o prazo de que trata o item anterior, mas esteja em cursos a liquidação da despesa) se configura imediatamente após a entrega do bem ou prestação do serviço por parte do fornecedor ao órgão/entidade governamental. Sabemos que o poder público somente poderá expedir uma ordem de pagamento após sua regular liquidação. É a regra do art. 62 da Lei n. 4.320/64. E sabemos também que todo o processo de liquidar uma despesa exige um tempo razoável. Muitas vezes, entretanto, chegado o término do exercício financeiro, o processo de liquidação de uma despesa ainda não foi finalizado. Ela ainda estará em curso. Em tais situações o empenho não poderá ser anulado. Exemplifiquemos:      
1 - Empenho emitido em 20/11.
2 – Prazo para cumprimento da obrigação: 30 dias.
3 – Término do prazo para cumprimento da obrigação: 19/12 (do ano de emissão do empenho).
4 – Entrega do bem ou da prestação do serviço: 19/12 (do ano de emissão do empenho).
5 – Tempo estimado para a liquidação da despesa: 15 dias (se em 31/12 o processo não estiver finalizado, configurar-se-á a hipótese contida na primeira parte da letra “b”, acima).
A outra situação prevista na letra “b” (seja de interesse da Administração exigir o cumprimento da obrigação assumida pelo credor) na verdade é um “cheque em branco” entregue ao poder público. É que através dele poderão ser praticados as mais diversas atrocidades contra os cofres públicos.  E sabemos que em inúmeros casos esse dispositivo poderá servir para acobertar desmandos e conceder privilégios.
Talvez a ideia do legislador fosse oferecer alguma margem de manobra aos administradores públicos para solucionarem problemas com a entrega de produtos e serviços essenciais, cuja falta poderia acarretar prejuízos inimagináveis (medicamentos, p. exemplo). Se esse fosse, de fato, o propósito do dispositivo, a regra deveria ser melhor dimensionada a fim de frear o poder discricionário dos gestores. Da forma como está posta a norma, seu poder é amplo e irrestrito. Afinal de contas, que tipo de interesse autorizará a Administração a não proceder à anulação de despesas não processadas:  o desejo de evitar prejuízos aos administrados e à própria administração ou fazer concessões graciosas a determinados fornecedores?     
A hipótese referida na letra “c” guarda um valor social em seu conteúdo, mas que também, à exemplo da hipótese precedente, poderá servir de “escudo” para o comentimento de excessos.
As transferências são obrigatórias ou voluntárias. Se obrigatórias, ou decorrem do texto constitucional (Fundo de Participação dos Estados e Municípios, etc.) ou de legislação infraconstitucional (Fundo Nacional de Assistência Social, etc.). Já as transferências voluntárias decorrem, como o próprio nome aduz, de um acordo de vontades entre as entidades públicas. Os convênios são a figura mais comum. Mas também temos os contratos de repasse, os termos de parceria e mais recentemente os consórcios públicos.
A norma não faz qualquer distinção quanto à modalidade de transferência, se obrigatória ou voluntária. Também para ela é irrelevante se seu destinatário será uma instituição pública ou privada. O certo é que em qualquer caso o empenho não poderá ser anulado. Ao que parece ela não excepciona sequer os ajustes voluntários cancelados imediatamente após sua assinatura.
Pelo dispositivo em referência, se o Estado do Amazonas firmar um convênio com a Prefeitura de Manaus em 15/12 de um ano qualquer, o empenho correspondente não será  anulado ao término desse exercício devendo ser inscrito em restos a pagar não processados.
A última das hipóteses refere-se a compromissos assumidos no exterior. Exemplifiquemos.
O Presidente da República viaja para o exterior e vem a se hospedar num hotel estrangeiro. Os custos da hospedagem deverá ser paga pelo governo brasileiro. Nessas condições, como anular o empenho correspondente se está em jogo o próprio nome do País perante a comunidade internacional? Não ficaria bem um “calote” em tais condições.  No contexto estadual e municipal também essa mesma regra deve prevalecer já que uma eventual inadimplência desses entes corresponderá, em última análise, à inadimplência da própria República Federativa do Brasil.
Conforme dissemos, conquanto em vigor desde 1986 o Decreto n. 93.872 não se aplica aos estados e municípios, mas apenas à União. Urge, portanto, que os entes cuja legislação orçamentária ainda não discipline os procedimentos de inscrição de suas despesas em restos a pagar não processados, promovam os necessários ajustes. A sociedade certamente agradecerá. Com a palavra, os órgãos de controle.




[1] Dispõe sobre a unificação dos recursos de caixa do Tesouro Nacional, atualiza e consolida a legislação pertinente e dá outras providências.
[2] Art. 35.