Uma das grandes dificuldades que percebo é que quem analisa a defesa apresentada por um agente público - refiro-me, em especial, àquelas produzidas perante um tribunal de contas - tem dificuldade de encontrar a IDEIA-NÚCLEO ao redor da qual deve desenvolver sua análise. Vejamos a seguir um exemplo disso (o que está na fonte vermelha é a resposta do gestor. Na fonte azul está a análise correspondente da resposta):
Ocorre que, em contraponto ao apresentado, não fora apresentado os respectivos processos que comprovassem a legalidade das despesas orçamentárias, impossibilitando o controle exercido por esta Corte para auferir a legalidade e a economicidade dos desembolsos efetuados. Portanto, não há como acatar as justificativas do gestor".
O título do problema está em negrito. É a partir dele que a ideia-núcleo deve ser identificada. No caso, o problema identificado pela auditoria foi a "inexistência de comprovantes que demonstrem a legalidade da execução da despesa".
O gestor, ao responder à indagação, ADJETIVOU tais comprovantes. Ele disse que tais comprovantes estão representados por DOCUMENTOS FISCAIS E CONTÁBEIS e os PROCESSOS DE PAGAMENTO DAS DESPESAS. Bem, como ele adjetivou o que era AMPLO (documentos) então essa é a IDEIA-NÚCLEO ao redor da qual a análise deve se desenvolver.
Note, porém, que a análise só se debruçou sobre os processos de pagamento das despesas. Nada disse sobre os documentos fiscais e contábeis. Aqui, já temos uma lacuna na análise. A ideia-núcleo não foi discutida suficientemente. O servidor que fez a instrução deveria também desenvolver sua análise sobre os documentos fiscais e contábeis, mas não o fez. Desta feita, algumas lacunas permaneceram em aberto na análise quanto a tais aspectos: os documentos fiscais e contábeis estão ou não estão no processo? (lacuna 1). Se estão, o conteúdo dele comprova ou não comprova a legalidade na execução das despesas? (lacuna 2). Se não comprova, por que não comprova? (lacuna 3). Se comprova, por que comprova? (lacuna 4).
Ou seja, tudo tem que ser suficientemente analisado. Note também que um questionamento leva a outro, como se fosse uma análise em cadeia. Se toda a trajetória da análise for percorrida pelo analista então você terá certeza que iniciou, desenvolveu e CONCLUIU o que tinha que analisar. Você ESGOTOU o conteúdo analisado com relação a este ponto. Lembre-se: não pode haver faltas ou omissões!!!
Por fim, outro aspecto que precisa ser destacado e que ajuda na organização da análise a partir da identificação da ideia-núcleo é que a palavra-chave encontra-se no título: COMPROVANTES. É ao redor-dela que deve se desenvolver toda a análise. Tais comprovantes podem ser: uma nota de empenho, uma ordem bancaria, notas fiscais, recibos, ordem de autorização da despesa, etc. Veja que o termo COMPROVANTE comporta uma multiplicidade de documentos, todos ligados à execução da despesa.
Muito bem. De posse dessa informação o analista deverá identificar QUAL O DUCUMENTO QUE ESTÁ SENDO QUESTIONADO. Ou, ao contrário, são todos eles??? Essa procura é muito importante para a organização e desenvolvimento da análise, pois ela será seu FIO CONDUTOR. Ou seja, se , por exemplo, o documento referido no título for a ausência de notas de empenho, então o analista deverá procurar saber se há nos livros contábeis e fiscais essa informação. Se foi a ordem bancária ou notas fiscais, deverá também proceder da mesma forma. Evidentemente que este procedimento só será adotado se tais livros foram apresentados pelo gestor. O mesmo ocorre com os processos de pagamento que, na situação em análise, todavia, não foram apresentados inviabilizando, portanto, a análise.
Em síntese: antes de começar a desenvolver sua análise procure identificar a IDEIA-NÚCLEO. Ela poderá estar no título da irregularidade e/ou na resposta apresentada pelo gestor.
Alipio Reis Firmo Filho
Conselheiro Substituto - TCE/AM
É simples a situação, é só ler o o CPC 2015, não há mistério para analisar, Fatos, Fundamentos e pedidos, pronto, não tem mistério
ResponderExcluirInfelizmente essa não é a realidade para muita gente. Não é tão simples assim. Colocar as ideias no papel pouquíssima gente sabe colocar. Por isso escrevi esse artigo e vou escrever muitos outros tentando oferecer diretrizes que possam ajudar. Tenho um grupo que trabalha comigo e dezenas de outras pessoas que conheço, que têm extrema dificuldade para analisar conteúdos técnicos/jurídicos. A dificuldade não é ler a legislação. Isso toda pessoa alfabetizada sabe. Interpretá-la também muita gente sabe. O grande problema é distribuir as ideias-núcleo num texto por meio do qual o redator seja capaz de se comunicar de maneira simples, direta e objetivamente. Aliás, tenho quase 30 anos lidando com processos. Já vi análises sofríveis produzidas, inclusive, por "gente de renome". Mas, que bom que vc não tem dificuldades. Tenha certeza: essa não é regra no País. É exceção. Muito obrigado por visitar este espaço!!
ExcluirA propósito, no exemplo por mim comentado, nem há referência alguma ao CPC. O contexto é outro, ligado ao controle externo.
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