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sexta-feira, 15 de agosto de 2014

MULTA PELA FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DEFESA AO TRIBUNAL DE CONTAS: É POSSÍVEL?

No TCE-AM tenho visto algumas propostas de multa (da Secex, do Ministério Público de Contas, de alguns Relatores) a gestores que não apresentaram razões de justificativa na fase do contraditório e da ampla defesa. Também tenho notado que essas proposituras têm sido acompanhadas pelo Tribunal Pleno. Alguns desses entendimentos alegam que por ser de índole pública, não há como os administradores públicos omitirem-se em suas contrarrazões.   Segundo essa corrente, os jurisdicionados têm o dever de se defenderem perante o tribunal contas. Seu silêncio possibilita a aplicação de penalidades pecuniárias (multas). 

Outro argumento é de que há previsão expressa na Lei Orgânica do Tribunal (Lei 2423/96) de que, a recusa em cumprir diligências do Tribunal, autoriza a aplicação da multa: 

             Art. 54 - O Tribunal poderá aplicar multa de até R$...:

            (...)

            IV - não atendimento, no prazo fixado, sem causa justificada, à diligência ou a                   decisão do Tribunal.

Em que pese os entendimentos postos, entendo ser outra a conclusão a ser extraída. Para tanto, é preciso que façamos dois esclarecimentos. 

Primeiramente, é importante deixar claro que o Regimento Interno do TCE-AM admite, expressamente, o instituto da REVELIA, verbis:

       Art. 88. A ausência de manifestação no prazo para oferecimento de defesa e                      justificativas implica revelia, mas não afasta do Tribunal o dever de buscar a verdade          material na instrução do processo.

Ora, segundo a melhor doutrina, a revelia é caracterizada pelo silêncio da parte em apresentar suas contrarrazões, imediatamente após tomar ciência do que é dito contra ela. Na revelia o acusado simplesmente prefere não se manifestar. De pronto, percebe-se que o silêncio da parte na fase de realização do contraditório e da ampla defesa é uma FACULDADE sua e não uma impossibilidade. Não havendo, portanto, norma fixando a obrigatoriedade da manifestação dos responsáveis não há como censurar-lhes a conduta, impondo-lhes as sanções correspondentes. E se formos analisar o instituto da revelia com mais profundidade, descobriremos que ela é, sim, uma forma de resposta às notificações do Tribunal. Em outras palavras, quero dizer que numa revelia o responsável responde à notificação. Ele não permanece em silêncio. Em absoluto. Ao optar por permanecer revel o responsável admite contra si tudo aquilo que é dito contra ele no processo. Essa admissão é, entretanto, tácita, não expressa. 

Desta feita, é possível concluirmos que a resposta às notificações do Tribunal poderão ser EXPRESSAS ou TÁCITAS. A revelia se põe em relação a estas últimas. Só por isso, não há como sustentarmos a tese da possibilidade de apenação dos responsáveis apenas pelo fato de eles não terem atendido à notificação. Na verdade, a manifestação se operou, ainda que tacitamente. 

Outro ponto que precisa e deve ser aclarado é o real significado do termo DILIGÊNCIA, previsto no inciso IV do art. 54 da Lei Orgânica do TCE-AM (outrora reproduzido).

As diligências correspondem a solicitações de documentos e informações para se formar um juízo. Por isso mesmo, elas não decorrem de um entendimento já formado. Ela se põe no início do processo investigativo e não no seu término. Vejamos alguns exemplos dessas situações:

a) solicitações de editais de concursos públicos motivadas por matéria veiculada em mídia local dando conta de vícios na seleção dos candidatos;
b) solicitação de folhas de pagamento para análise mais detalhada num processo investigativo, a fim de se confirmar (ou não)  a procedência de denúncia feita junto ao Tribunal;
c) solicitação de documentos necessários à elucidação de dúvidas suscitadas em processo de aposentadoria.

Perceba que em todas as situações referidas o Tribunal está em processo de saneamento processual, ou seja, busca a verdade material dos fatos tentando suprimir dúvidas e lacunas de informações. Ora, nessa etapa cognitiva os documentos e informações solicitados são ESSENCIAIS para a extração de conclusões sobre o conteúdo investigado. É a partir deles que serão adotados outros procedimentos (auditorias, inspeções, representações, contraditório e ampla defesa, etc.). SEM ESSES DOCUMENTOS não há como o processo investigativo evoluir satisfatoriamente. Nesse sentido, os responsáveis passam a ser colaboradores do Tribunal. E é nessa esteira de entendimento que se põe a multa aplicada por não atendimento à diligência do órgão. 

Ou seja,  sempre que os responsáveis não encaminharem os documentos e informações solicitados eles acabam impedindo a ação fiscalizadora do Tribunal. Há uma clara obstrução de suas atividades. Disso advém a possibilidade de impor sanções aos responsáveis uma vez que sua conduta impossibilita que o órgão de controle externo exerça em plenitude sua competência constitucional. É nesse sentido que deve ser entendido o dispositivo em referência. Não há como confundí-lo com a fase do contraditório e da ampla defesa. Essa fase é outra, que se põe APÓS o processo de fiscalização, de aclaramento dos fatos, da elucidação das dúvidas. Com efeito, o contraditório e a ampla defesa começam quando o Tribunal já possui um juízo formado em relação a dado fato investigado. É nesse ponto que se emitem as notificações, exatamente para ofertar aos responsáveis a possibilidade de apresentarem os seus pontos de vista diante do fato JÁ INVESTIGADO pelo Tribunal. Por conta disso, não há como aplicar multa a responsável  que, devidamente cientificado, não apresenta defesa no prazo estabelecido.

Em suma, poderíamos dizer que antes que se proponha multa ao responsável será preciso que se saiba exatamente o momento processual que nos encontramos. Ainda na fase de investigação ou depois dela? Já se tem um juízo formado a respeito da conduta do gestor supostamente faltoso ou ainda estamos em busca disso? O contraditório e a ampla defesa é um produto de todo um trabalho de cognição realizado pelo Tribunal. Nessa fase, conforme exposto, não há como sancionarmos o gestor pelo simples fato de ter se recusado a apresentar suas razões de justificativas. 

Agora, se a conduta do gestor obstrui a ação fiscalizadora do Tribunal, materializada pela negativa em enviar-lhe as informações e documentos solicitados, então a sanção pecuniária não apenas é cabível, mas oportuna. É por meio dela que se tenta coibir a falta de colaboração dos responsáveis no processo de avaliação da boa e regular aplicação dos recursos públicos. 

Para nossa reflexão.     
           

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