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sábado, 30 de abril de 2011

DÚVIDA DO LUIZ CLÁUDIO (Depreciação em Economia versus Depreciação Contábil)

Luiz Cláudio (Nauta), primeiramente, obrigado por frequentar esse espaço. Agradeço também por suas palavras. Bem, tive de recorrer a uma nova postagem para tentar tirar sua dúvida já que o texto que produzi excedeu o tamanho do permitido para resposta aqui no Blogger. Espero que consiga esclarecê-lo. Boa leitura e um fraternal abraço!!! (Que bom que você tem boas recordações de Manaus!!).   

SUA DÚVIDA: Prezado Professor Alipio, há muito venho tentando entender o conceito de depreciação na economia. Os livros lançam a fórmula e não entram em detalhes. A melhor explicação que encontrei foi a sua, deixando claro que é a empresa produzindo para a empresa. No entanto, ainda não consegui entender o seguinte: sob a ótica da despesa, quando eu faço o cálculo do Produto Nacional, eu desconto a depreciação pois ela é o investimento que não chegou às famílias. Mas sob a ótica da renda, eu não paguei para produzir? Por que retiraria a depreciação? Muito obrigado. Atenciosamente, Luiz Claudio.

Conforme sabemos, em Macroeconomia, há uma identidade fundamental entre os conceitos de Renda e Produto (além da despesa, é claro, que entretanto, iremos desconsiderar nessa explicação):
RENDA = PRODUTO
A renda será sempre igual ao produto e vice-versa.
A renda possui quatro componentes: os lucros, os aluguéis, os juros e os salários. De posse dessas informações, vamos a uma exemplificação.
Numa economia são produzidos apenas três automóveis: automóvel1, automóvel2 e automóvel3. O preço de venda de cada um deles é de $ 100. Individualmente, suponhamos que a composição pela ótica da renda seja:
Lucro: $ 40
Juros: $ 20
Aluguéis: $ 10
Salários: $ 30
Total: $ 100
Portanto, em relação a ele, teríamos a identidade acima [($ 100 (renda) = $ 100 (produto)]. Se todos eles forem vendidos, haverá um produto e uma renda no mesmo valor, isto é, $ 300.  Contudo, admitamos que o automóvel1 não seja vendido, já que a própria empresa resolveu permanecer com ele para utilizá-lo em suas atividades. O cálculo do produto e da renda ficaria assim:
Produto Bruto ($ 300) – depreciação ($100) = Produto líquido ($200)
Renda Bruta ($300) – depreciação ($100) = Renda líquido ($200)
Sua dúvida é saber por que da renda bruta será subtraída a depreciação uma vez que o automóvel não foi vendido. Primeiramente, é preciso levarmos em conta que o fato de o automóvel1 não ter sido vendido, isso não significa que ela (a empresa) deixará de pagar os juros, os aluguéis e os salários gerados em sua produção. Ela honrará esses compromissos. Com qual renda ela pagará os juros, os alugueis e os salários do automóvel1 ($60)? Será financiado pelo lucro obtido na venda dos automóveis 2 e 3. Assim, ao vender os outros dois automóveis ela obterá $ 80 a título de lucro. Desse valor, ela separará $ 60 para quitar suas obrigações geradas na produção do automóvel1 ficando com apenas $ 20 de lucro. E o lucro de $ 40? Como ele será financiado? Respondemos: Não será financiado. Será considerado como custo do processo produtivo que deverá ser suportado pela empresa e que será deduzido do remanescente de lucro obtido na venda dos outros dois automóveis ($20). Nesse momento ela terá um prejuízo (-$20) com relação a esse componente da renda mas que acabará sendo compensado pela incorporação do automóvel1 em suas instalações. Haverá uma hemorragia (perda de $20) de recursos financeiros mas uma transfusão (ganho de $20) de recursos materiais. Ela estará, na verdade, imobilizando o automóvel1 e, com ele, também todos os quatro componentes de sua renda. Juntando tudo: ao destinar o automóvel1 (produto) para seu próprio uso, a empresa acaba destinando, juntamente com ele, todos os quatro componentes nele contidos, isto é, um Lucro de $40, um juro de $20, um aluguél de $10 e salários de $30. Veja que não há como separarmos isso.  Lembre-se:  Produto = Renda. As duas óticas – Renda e Produto – se fazem presente de forma indissociável no automóvel1, independentemente se ele tiver sido vendido ou não. Por isso, a parcela do produto não vendido (automóvel1) deverá ser subraída da renda bruta. A idéia do custo outrora mencionado talvez possa ser melhor compreendido com um outro exemplo:  Toda energia elétrica produzida por uma empresa (que atue nesse setor) será destinada, em princípio, à venda. Entretanto, a própria empresa necessita de energia elétrica para funcionar. Ela então comprará sua própria energia? Em absoluto. A parcela da energia elétrica por ela consumida será considerada como custo e, embora não vendida, integrará a receita bruta, como se tivesse sido vendida. Por compor a receita bruta ela será dela deduzida em sua Demonstração do Resultado do Exercício. Esse custo é o que a Contabilidade chama de Custo dos Produtos Vendidos (CPV), Custo das Mercadorias Vendidas (CVM) ou Custo dos Serviços Prestados (CSP) e que é um dos itens integrantes da Demonstração do Resultado do Exercício. Esse item é deduzido da receita bruta: Vendas Brutas – Custos (dos Produtos, das Mercadorias ou dos Serviços).            
Se recorrermos a esse mesmo raciocínio e o aplicarmos no cálculo da renda em nossa economia, teríamos (no tocante aos automóveis):
Lucro 1 ($40) + Lucro 2 ($40) + Lucro 3 ($40) = $ 120
Juros 1 ($ 20) + Juros 2 ($ 20) + Juros 3 ($ 20) = $ 60
Aluguéis 1 ($ 10) + Aluguéis 2 ($ 10) + Aluguéis 3 ($ 10) = $ 30
Salários 1 ($ 30) + Salários 2 ($ 30) + Salários 3 ($ 30) = $ 90
Total Renda = $ 300
(-) Depreciação (automóvel 1):
Lucro: $ 40
Juros: $ 20
Aluguéis: $ 10
Salários: $ 30
Total Depreciação: $ 100
(=) Renda Líquida : $ 200.
Um último questionamento poderia ser suscitado: por que incluir o automóvel não vendido na renda (e no produto) bruto? Não seria melhor não o computarmos no cálculo e assim não precisarmos excluir a depreciação? De maneira alguma. Haveria uma grande lacuna no cálculo do produto e da renda nacionais, pois restaria comprometida a magnitude exata do que foi produzido na economia.   

quarta-feira, 27 de abril de 2011

TRIBUNAIS DE CONTAS

            A atividade dos Tribunais de Contas encontra-se regulada no Texto Constitucional Federal nos artigos 71 a 75. No contexto estadual, cada uma das respectivas Constituições se encarregam por  disciplinar sua organização, composição e competência que, por força do princípio da simetria, devem observar os limites impostos pela Carta Magna. Ao todo, contamos com 34  (trinta e quatro) Tribunais de Contas em nosso País. Nesse universo, podemos distinguir quatro modalidades de organismos.

             A primeira modalidade congrega os Tribunais de Contas cujas jurisdições se estendem tanto aos órgãos e entidades estaduais quanto aos municipais. Nessa modalidade se incluem a grande maioria das unidades federativas. Os Estados do Amazonas, Acre, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, dentre outros, adotam esse modelo de fiscalização. Isso significa que estes Tribunais de Contas possuem competência para avaliar não apenas a aplicação de recursos pertencentes aos estados como também a de seus respectivos municípios.  

              Na segunda modalidade encontramos as unidades federativas que preferiram entregar a Tribunais de Contas distintos a fiscalização dos recursos estaduais e municipais. Essas unidades, portanto, possuem um sistema de controle externo híbrido. Ao lado dos Tribunais de Contas Estaduais existem os Tribunais de Contas dos Municípios. A fiscalização dos recursos estaduais compete aos primeiros enquanto a dos respectivos municípios é entregue aos últimos. Há, pois, duas ordens de fiscalização. Os Estados do Pará, de Goiás, do Ceará e da Bahia adotam essa estrutura. Importante destacar que os Tribunais de Contas dos Municípios integram a estrutura estadual de governo, assim como o próprio Tribunal de Contas Estadual.   

             A terceira modalidade contempla os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Nestas unidades federativas o Tribunal de Contas estadual estende seu poder fiscalizatório tanto aos órgãos e entidades  estaduais e municipais, exceto o Municipio da Capital. Este conta com um Tribunal de Contas próprio, que fiscaliza a aplicação de seus recursos. São os Tribunais de Contas do Município de São Paulo e do Município do Rio de Janeiro. Não confundir suas nomenclaturas com a nomenclatura dos Tribunais de Contas dos Municípios (segunda modalidade). 

            A última das modalidades congrega apenas o Tribunal de Contas da União que é responsável pela fiscalização dos recursos federais. Como tais recursos são aplicados em todo o território nacional e no exterior (embaixadas, consulados, representações de organismos federais espalhados pelo mundo) sua competência também abrange esse universo de organismos e entidades ali situadas.    
   

quinta-feira, 21 de abril de 2011

GASTOS DO GOVERNO FEDERAL

A Secretaria do Tesouro Nacional possui um link onde é possível acompanharmos a execução de importantes rubricas orçamentárias como despesas com pessoal e restos a pagar. Confira: http://www.stn.fazenda.gov.br/siafi/execucao.asp

GASTOS DO GOVERNO NO REINO UNIDO

Existe um site intitulado http://wheredoesmymoneygo.org/ que divulga gastos do governo do Reino Unido. É uma ferramenta útil para estudantes e pesquisadores. Recomendo.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

INVERSÕES FINANCEIRAS

O grupo de despesas denominado “Inversões Financeiras” compõe, juntamente com os grupos “Investimentos” e “Amortização da Dívida”, as Despesas de Capital. Na Lei nº 4.320/64 estão reguladas no § 5º do art. 12. Segundo este dispositivo as Inversões Financeiras podem ser reunidas, essencialmente, em três modalidades. 

A primeira delas compreende as despesas aplicadas pelo Poder Público na aquisição de bens Imóveis, conforme dispõe a primeira parte do inciso “I” do referido parágrafo. Com efeito, a aquisição de um edifício, de um terreno, representa, em si, uma Inversão Financeira. Só perderá esta característica, isto é, deixará de ser classificada como Inversão Financeira, na hipótese de o bem imóvel adquirido for necessário à realização de obras públicas. Nesse caso, o gasto efetuado classificar-se-á no grupo “Investimento” e não na categoria das Inversões Financeiras, conforme dispõe o § 4º do artigo outrora referido. Exemplificando.

Os gastos com a aquisição de um terreno para nele construir um viaduto será considerado um Investimento, pois a compra do terreno será útil à construção do viaduto (uma obra pública). O mesmo se diga se a finalidade for a construção de um hospital ou de uma escola. Se, todavia, a aquisição do terreno não se vincular à realização de qualquer obra pública o dispêndio deverá compor o grupo das Inversões Financeiras e não dos Investimentos.

A segunda modalidade das Inversões Financeiras refere-se aos gastos públicos aplicados na aquisição de bens de capital já em utilização (inciso I, última parte, do § 5º, art. 12, da Lei nº 4.320/64). Os bens de capital já em utilização correspondem a bens permanentes em que o Poder Público figura, pelo menos, como um segundo proprietário. Expliquemos.

Se você compra um automóvel de segunda mão esta despesa será classificada, na ótica do Direito Financeiro, como uma Inversão Financeira e não como um Investimento. O mesmo se aplica a todo e qualquer aquisição feita de um bem já em utilização, isto é, um bem já em uso:

a) um apartamento que você comprou de um vizinho que, por sua vez, já o havia adquirido de uma terceira pessoa;

b) uma motocicleta usada que você incorpora ao seu patrimônio a partir de um anúncio  nos classificados de um jornal;

c) uma geladeira já em uso que você compra porque não possui renda suficiente para adquirir uma nova em alguma loja de eletrodomésticos e assim sucessivamente.

Em todas estas hipóteses o gasto realizado terá a natureza de uma Inversão Financeira.

Com efeito, por trás das despesas públicas aplicadas em bens de capital já em utilização (Inversões Financeiras) o Poder Público é apenas mais um proprietário distinguido, dentre outros proprietários pretéritos, numa cadeia (talvez numerosa) de pessoas que adquiriram o mesmo bem no passado. O mesmo se aplica às aquisições do automóvel, do apartamento, da motocicleta, da geladeira, conforme descrevemos. O novo proprietário será apenas mais um a incorporá-lo ao seu patrimônio uma vez que o bem já fora incorporado, em algum momento do passado, a outros patrimônios.

Por outro lado, na hipótese de o automóvel por você adquirido for um veículo “zerado” - como se diz na linguagem popular - estaremos diante de uma despesa classificada como “Investimento” e não mais como “Inversão Financeira”. Isto porque se trata de um bem novo e não mais de um bem já em utilização.

Em síntese, podemos dizer o seguinte: se você retira da prateleira o bem adquirido este seu desembolso será classificado como um Investimento. Caso, contudo, a aquisição se realize junto a uma terceira pessoa (que pode ser, inclusive, aquela que retirou o bem da prateleira) você estará diante de um gasto que será classificado como Inversão Financeira.

A terceira e última modalidade das Inversões Financeiras referem-se aos gastos do Poder Público com a aquisição de títulos representativos do capital de empresas (ações), conforme incisos II e III do § 5º, art. 12, da Lei nº 4.320/64. A regra é a seguinte.

Em se tratando de aquisições de títulos representativos de capital de empresas já constituídas, e desde que a aquisição não acarrete aumento de capital estaremos diante de uma Inversão Financeira. Nestas condições, é irrelevante o setor da economia que a referida empresa atual (setores primário, secundário ou terciário), consoante dispõe o inciso II do mencionado dispositivo. Assim, se o Poder Público adquire ações de uma empresa agrícola (setor primário) não importando a aquisição em aumento de seu capital, a despesa será classificada como uma Inversão Financeira. O mesmo se diga se a aquisição beneficiar o capital de uma empresa industrial (setor secundário) ou de uma instituição financeira (setor terciário).

Entretanto, caso a mesma aquisição importe aumento de capital ou, ainda, concorra para a constituição do capital da empresa considerada é necessário que se saiba qual o setor da economia que esta empresa atua, a fim de classificar o referido gasto: se no grupo dos Investimentos ou na categoria das Inversões Financeira. Nestas condições, se a empresa atua no setor terciário da economia o gasto será classificado como uma Inversão Financeira (inciso III). Se, no entanto, tratar-se de empreendimento integrante dos setores primário e secundário da economia o gasto efetuado será computado como um Investimento (§ 4º, art. 12, da Lei nº 4.320/64).

A razão desta distinção no tratamento do gasto público reside no fato de o setor terciário da economia constituir-se, essencialmente, de prestações de serviços. Ora, os serviços correspondem a bens incorpóreos que, normalmente, não agregam valor. Regra geral, não possuem uma cadeia agregativa de valores. Em outras palavras, o produtor dos serviços, quase sempre, se relaciona diretamente com o consumidor final destes serviços sem a concorrência de intermediários. O mesmo não ocorre, entretanto, com os dois outros setores econômicos (setores primário e secundário). Nestes há uma substancial agregação de valor a cada cadeia produtiva. Tomemos o exemplo da produção de automóveis.

Para se chegar ao produto final (automóvel) a indústria automobilística tem de percorrer um longo caminho. Os pneus, p. exemplo, são encomendados de um fornecedor. Este, por sua vez, para produzi-lo, tem de reunir a matéria-prima necessária sobressaindo-se a borracha como a principal. É possível, ainda, que a borracha seja comprada junto a outros fornecedores que, por sua vez, terão de gastar com a sua produção e assim por diante, numa longa cadeira produtiva. Ora, a cada etapa desse ciclo produtivo do automóvel há agregação de valor, comumente denominado pela Ciência Econômica de Valor Agregado. Com efeito, quando o Poder Público adquire títulos representativos de uma empresa automobilística, aumentando ou constituindo o seu capital, o desembolso deverá ser considerado como um Investimento, uma vez que desencadeará sucessivos ciclos produtivos na economia  gerando renda e emprego.      

domingo, 10 de abril de 2011

AUDITORES SUBSTITUTOS DE CONSELHEIROS E AUDITORES SUBSTITUTOS DE MINISTROS NOS TRIBUNAIS DE CONTAS: NATUREZA E ATRIBUIÇÕES DO CARGO

Achei interessante este Artigo produzido pelo colega Leonardo dos Santos Macieira, Auditor Substituto de Conselheiro no Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará, intitulado AUDITOR CONSTITUCIONAL DOS TRIBUNAIS DE CONTAS que aborda a natureza e as astribuições do Cargo de Auditor Substituto de Ministros e Conselheiros nos Tribunais de Contas. O Texto é bastante oportuno em seus esclarecimentos já que o Cargo de Auditor Substituto é costumeiramente confundido com o Cargo dos Analistas e Técnicos ligados às funções de Controle Externo nas diversas Cortes de Contas de nosso País. Boa leitura a todos!

I - Introdução

O objetivo geral deste breve estudo é apresentar o arcabouço legal do cargo de Auditor Constitucional dos Tribunais de Contas no que se refere à natureza e às atribuições do cargo, assim como uma visão doutrinária e jurisprudencial a respeito de questões relacionadas à hierarquia e subordinação.
O artigo está dividido em três partes. O capítulo II trata da natureza e atribuições constitucionais do cargo de Auditor. O capitulo III aborda as questões relacionadas à hierarquia e seus desdobramentos. O capítulo IV apresenta o resultado de uma pesquisa sobre a estrutura organizacional e organograma dos Tribunais de Contas.

II - Natureza e Atribuições Constitucionais

Segundo previsão constitucional [01], os Tribunais de Contas são integrados por Ministros e Conselheiros que, em suas ausências e impedimentos, são substituídos por Auditores efetivos (concursados). Esses Auditores quando não estão substituindo Ministros e Conselheiros, exercem as demais atribuições da judicatura, com garantias de juiz de Tribunal Regional Federal. Assim, partindo da premissa que a Constituição não contém palavras inúteis, quis o constituinte que os Auditores exercessem somente duas atribuições, i) de substituição e ii) de judicatura, mantendo, com isso, o significado original da denominação do cargo de Auditor quando da sua criação no Tribunal de Contas da União, por meio do Decreto Legislativo n.0 3.454, de 06/01/1918, nome este, ainda que com significado inadequado para a época atual, que, àquela época, significava exatamente Magistrado da Corte de Contas, como registrados em muitos dicionários jurídicos e da língua portuguesa.
"Auditor (ô). [Do lat. auditore.] S.m. 1. Aquele que ouve; ouvidor. 2. Magistrado com exercício na Justiça militar e que desfruta de prerrogativas honorárias de oficial do exército. 3. Magistrado do contencioso administrativo. 4. Auditor da nunciatura (Tribunal Eclesiástico sujeito ao núncio – Embaixador do Papa)" [02].

Por força de disposição constitucional [03] e observando o princípio da simetria, os Estados são obrigados a organizar seus Tribunais segundo o modelo federal, ou seja, esses Tribunais estaduais devem seguir o modelo de organização, composição e de fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) detalhados na Constituição Federal de 1988, havendo, inclusive, julgados do STF nesse sentido.
"1. Estrutura dos Tribunais de Contas Estaduais. Observância necessária do modelo federal. Precedentes. 2. Não é possível ao Estado-membro extinguir o cargo de Auditor na Corte de Contas estadual, previsto constitucionalmente" (ADI 1994/ES).
O princípio da simetria determina que as entidades federativas estaduais, municipais e distrital, ao organizarem suas constituições estaduais e leis orgânicas, devem obediência às normas de organização previstas na Constituição Federal.
A despeito da clara previsão na Lei Fundamental, há grande confusão no que tange a natureza jurídica e as atribuições do cargo de Auditor previsto na Constituição Federal. O Auditor constitucional dos Tribunais de Contas, assim chamados por ter fundamento constitucional, difere de outros cargos de auditores previstos em normativos infraconstitucionais.
Apesar do mesmo nomem juris, com aqueles não podem ser confundidos, pois a natureza jurídica e atribuições dos cargos são completamente distintas. Explica-se: a Constituição Federal faz menção somente a dois cargos de Auditor, ambos efetivos: i) o Auditor do Tribunal de Contas (art. 73, § 30) e ii) Juiz-Auditor, como é conhecido o magistrado com exercício na Justiça militar [04] (art. 123, parágrafo único, II). Os dois cargos possuem atribuição e garantias de judicatura.
O Auditor militar também é chamado de Juiz-Auditor ou Juiz-Auditor Substituto (art. 1º, IV, da Lei n. 8.457/92). Trata-se de magistrado com exercício na justiça militar e que desfruta de prerrogativas honoríficas de oficial do exército.
Por outro lado, os demais cargos, sejam eles públicos ou não, denominados de "auditor", são previstos somente em normas infraconstitucionais e infralegais, não possuindo atribuições de judicatura e garantias de magistrado. Dessa forma, existem Auditores com fundamento constitucional e que são magistrados por possuírem atribuições e garantias de judicatura (Auditor substituto de Ministros ou de Conselheiros do Tribunal de Contas e Juiz Militar) e outros cargos de auditores na esfera pública e privada, com fundamento somente em normas legais e infralegais, que não exercem atribuições de judicatura e nem possuem garantias a ela inerentes.
O eminente tratadista Dr. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes [05], Conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Mestre em Direito Público e Professor de Direito Administrativo, elucida as atribuições do Auditor com muita propriedade:
"Possuem os Tribunais de Contas Substitutos de ministros e conselheiros concursados, prontos para atuar durante os impedimentos e vacâncias. Trata-se de um traço peculiar. O nome jurídico do cargo também é referido como auditor e tem duas relevantes funções.
A ordinária, consistente em participar do plenário ou câmara e relatar processos (...)
A extraordinária consiste, precisamente, em substituir, para integrar quorum, o ministro ausente, no caso do Tribunal de Contas da União, ou o conselheiro, nos demais Tribunais. Nos impedimentos eventuais e nos não eventuais, assume integralmente as prerrogativas do substituto, inclusive quanto ao voto. (...)
É preciso notar que o constituinte foi muito criterioso ao definir as atribuições ordinárias do auditor, qualificando-as de, não sem motivo de "judicatura", dada a feição judicialiforme do julgamento das contas (...), isto é, próprias de juiz, do exercício da magistratura."
O doutrinador Valdecir Pascoal, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, Professor de Direito Financeiro e Controle Externo, Professor da Escola de Contas Públicas do TCE-PE e Pós-Graduado em Direito Constitucional e Administrativo também disserta sobre o cargo de auditor mencionando as garantias e atribuições de judicatura [06].
No sentido técnico-jurídico, não há como confundir o cargo de Auditor de Tribunal de Contas previsto na Constituição Federal, que tem natureza jurídica especial, com aquele profissional responsável por fazer auditorias e fiscalizações, regidos estritamente por normas infralegais, seja na condição de agente administrativo (regido por regime jurídico único), ou como profissional liberal e celetista (regido por normas próprias de conselhos de classe profissionais).
Como exemplo pode-se citar os servidores da Receita Federal do Brasil que, embora tenham o nome de auditor dado por lei, não possuem previsão constitucional e os servidores do Tribunal de Contas da União, antes denominados de Analistas de Controle Externo, que, com a edição da Lei n.0 11.950/09, passaram a ser denominados de "Auditor" Federal de Controle Externo, mas sem estatura constitucional ou atribuições de substituição de Ministros e de judicatura com as garantias inerentes.
Os auditores independentes e internos são regidos, entre outras, pelas Resoluções do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) n.º: 700/91, que trata das normas de Auditoria Independente; 701/91, que trata das normas Profissionais do Auditor Independente; e Norma Brasileira de Contabilidade T11 e T12 (NBC T 11 - 11.1.1.4 - O parecer é de exclusiva responsabilidade de contador registrado no Conselho Regional de Contabilidade, nestas normas denominado de auditor / NBC T 12 - 12.1.1.2 – A auditoria interna é de competência exclusiva de Contador registrado em Conselho Regional de Contabilidade, nesta norma denominado auditor interno).
O auditor independente é um profissional independente da empresa e de reconhecida capacidade técnica, inscrito no Conselho Profissional de Contabilidade. Esse profissional contábil, que examina as demonstrações contábeis da empresa e emite sua opinião sobre estas, é também conhecido como o auditor externo. Seus pareceres são peças opinativas sobre as demonstrações contábeis da empresa e classificam-se em: parecer sem ressalva, parecer com ressalva, parecer com abstenção de opinião e parecer adverso.
Os auditores internos, ao contrário do auditor independente, é um profissional vinculado à empresa. Eles focam suas atividades no policiamento de fraudes, fiscalização de cumprimento de normas, conferência de despesas e verificação de documentos comprobatórios internos da empresa. Em boa parte das descrições, o trabalho do auditor interno parece restrito ao campo contábil.
É possível que o Constituinte tenha sido infeliz em empregar nos tempos atuais o nomem júris de Auditor, ao invés de, por exemplo, denominar o cargo de "Ministro-Substituto" (Conselheiro-Substituto) ou de "Auditor Substituto de Ministro" (Auditor Substituto de Conselheiro), nome este que refletiria mais apropriadamente a natureza jurídica das atribuições do cargo e que foi adotado por algumas leis orgânicas de Tribunais de Contas com o nítido propósito de deixar claro que tal cargo em nada se assemelha a outros também denominados de auditor que compõem os serviços auxiliares (secretarias) daqueles Tribunais.
Com extrema didática, o Exmo. Sr. Ministro do STF, o Dr. Octavio Gallotti, já em meados da década de 80 tinha perfeita clareza das atribuições do cargo de Auditor constitucional do Tribunal de Contas, assim se manifestando a respeito:
"O estatus dos Auditores dos Tribunais de contas tem dado margem a muitas perplexidades, que começam com a impropriedade da denominação do cargo, ligada a uma tradição respeitável, mas totalmente divorciada do atual conceito de atividades de auditoria. Imprópria, por isso mesmo, para designar o servidor que tem normalmente assento no Plenário do Tribunal de Contas, com atribuições de relatar processos, formalizar propostas conclusivas e exercer plena jurisdição quando convocado para substituir Conselheiro ou Ministro (...)"
Da mesma feita o eminente Exmo. Ministro do STF, Dr. Carlos Ayres Brito, que é reconhecidamente um respeitado estudioso do tema, assim prelecionou:
"A Constituição Federal faz do cargo de auditor um cargo de existência necessária, porque, quando ela se refere nominalmente a um cargo, está dizendo que faz parte, necessariamente, da ossatura do Estado, e só por efeito de emenda à Constituição – e olhe lá – é que a matéria poderia ser modificada. De outra parte, auditor ainda tem uma particularidade: é regrado pela Constituição como um elemento de composição do próprio Tribunal" (ADI 1994-5 – ES).
Com isso, nota-se que importa menos o nomem juris ou denominação do cargo e mais a sua natureza jurídica.
O raciocínio contrário também pode ser feito, à medida que cargos com nomem júris diferentes podem ter natureza jurídica semelhante, como é o caso do cargo de Ministro do TCU e o de Conselheiro dos TCE e TCM que, apesar de nomes diversos, tem a mesma natureza, mesmo pressuposto de fundamento e atribuições e competências análogas.
Em recente questão enfrentada pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, o Exmo. Sr. Desembargador, Dr. Francisco Lincoln Araújo e Silva, assim se manifestou em julgamento do dia 22/06/09, acerca de resolução do Tribunal de Contas local que violara as atribuições de judicatura do Auditor-Magistrado:
"Em se tratando, portanto de AUDITOR, em face de suas peculiaridades institucionais e da relevância do cargo, entendo que a sua disciplina, em caráter exaustivo, só pode ser estabelecidas em nível constitucional e legal, principalmente, no que se refere à definição de suas atribuições, que têm tudo a ver com o que, a respeito, já se encontra, expressa e exaustivamente, disposto nos textos constitucionais pertinentes".
Reconhecendo que as atribuições de judicatura do Auditor-Magistrado não se coadunam com a emissão de parecer, visto que essa atividade é de caráter meramente opinativo, o ilustre Desembargador concedeu medida liminar suspendendo a eficácia da resolução daquele Tribunal por reconhecer a manifesta ilegalidade e inconstitucionalidade:
"Não posso, por isso, entender, data vênia, o motivo pelo qual o Tribunal de Contas dos Municípios, na contramão de comezinhos princípios, aqui e ali, de vez em quando, resolve se atribuir função típica de órgão legislativo, disciplinando, algumas vezes, por via simples resolução, matéria reservada ao domínio estritamente legislativo, usurpando dessa forma, a competência que a constituição adjudica, privativamente, ao Poder Legislativo.
O parecer de auditoria é emitido pelo profissional da iniciativa privada da área contábil, denominado de auditor independente e regido por norma infralegal, no caso, a Norma Brasileira de Contabilidade T11.
Ainda na citada Decisão, o citado Desembargador determinou a imediata distribuição de processos ao impetrante, mediante critérios impessoais de sorteio, aplicáveis a todos os magistrados da Corte de Contas, para que o Auditor possa dirigir a sua Instrução como Magistrado-Relator.
Várias leis orgânicas e constituições estaduais estabeleceram que os Auditores exerceriam as únicas duas funções previstas na Constituição Federal: a ordinária de judicatura e a extraordinária de substituto de Conselheiros.
Art. 16. O Auditor, quando em substituição a Conselheiro terá as mesmas garantias, impedimento, vencimentos e vantagens do titular e, quando no exercício das demais atribuições da judicatura, as de juiz de direito (...) (A Lei Complementar n.0 25/1994. Lei Orgânica do TCM-PA).
A clara dicção constitucional reproduzidas pelas constituições estaduais não deixou muita margem para a competência legislativa em nível infraconstitucional e menos ainda no nível infralegal, visto que somente o constituinte federal e o legislador ordinário podem definir atribuições do cargo de Auditor.
Assim, é juridicamente impossível a criação de novas atribuições para os Auditores ou a prática de atos administrativos que interfiram na independência, imparcialidade e autonomia exclusivamente por força de ato de nível apenas regimental, em face de a atribuição do referido cargo ser de matéria constitucional, regulada por lei complementar em obediência ao princípio da estrita reserva legal.
Ocorre que muitas leis orgânicas não teceram maiores detalhes sobre as atribuições dos Auditores. Nesses casos, as omissões, desde que respeitado o comando constitucional, podem ser supridas subsidiariamente pelo disposto na Lei Orgânica do TCU e na Lei Orgânica da Magistratura (haja vista ser o Auditor o juiz natural das Cortes de Contas). Nesse sentido, a legislação do TCU assim dispõe sobre os Auditores:
"Art. 63. Os ministros, em suas ausências e impedimentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal, serão substituídos, mediante convocação do Presidente do Tribunal, pelos auditores (...)(Lei nº 8.443/92)
§ 1° Os auditores serão também convocados para substituir ministros, para efeito de quorum (...)
§ 2° Em caso de vacância de cargo de ministro, o Presidente do Tribunal convocará auditor para exercer as funções inerentes ao cargo vago, até novo provimento (...)
Parágrafo único. O auditor, quando não convocado para substituir ministro, PRESIDIRÁ À INSTRUÇÃO DOS PROCESSOS QUE LHE FOREM DISTRIBUÍDOS, RELATANDO-OS COM PROPOSTA DE DECISÃO A SER VOTADA PELOS INTEGRANTES DO PLENÁRIO OU DA CÂMARA PARA A QUAL ESTIVER DESIGNADO.
Art. 79. O auditor, depois de empossado, só perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado."
Como somente a lei em sentido estrito pode estabelecer atribuições de cargos públicos e ainda assim nos limites da Constituição, observa-se que a legislação infraconstitucional e infralegal do TCU apenas detalharam que as atribuições da judicatura seriam presidir a instrução processual e relatar com proposta de decisão a ser votada pelo Plenário e Câmaras.
Instruir é efetuar atos, diligências, formalidades, análise das alegações dos interessados e produção de provas para esclarecer a relação jurídica e proporcionar elementos de convicção necessários ao julgamento da causa.
Relatar é expor sumariamente a situação de fato que é submetida a julgamento do Tribunal.
Em decorrência das atribuições judicantes, o Regimento Interno do TCU deixa explícito que os Auditores não se confundem com os servidores da Secretaria do Tribunal (que atualmente também são denominados de auditores), proibindo-os de exercer funções ou comissões naquela Secretaria. Essa distinção é importante, pois em vários Tribunais de Contas é comum que os cargos dos serviços auxiliares também tenham denominação de auditor, embora o mais usual seja a denominação de Analista de Controle Externo, Inspetor de Controle Externo ou de Técnico de Controle Externo.

III - Inexistência de Subordinação ou Vinculação

Judicatura significa o mesmo que poder de julgar, função ou cargo de magistratura [07]. Em decorrência do exercício de judicatura, sobrevêm as garantias constitucionais que asseguram a independência, autonomia e imparcialidade.
A respeito da imparcialidade e garantias do magistrado, o doutrinador Alexandre Freitas Câmara [08] destaca o seguinte:
"Para se assegurar a imparcialidade do Estado, é preciso que haja imparcialidade do agente estatal que irá, no caso concreto, exercer a função jurisdicional. Assim, em primeiro lugar, cuida o ordenamento jurídico, através de norma jurídica hierarquicamente superior às demais, de estabelecer garantias para os magistrados, ou seja, a Constituição da República arrola uma série de garantias dos juízes, destinadas a assegurar que a atuação do magistrado se dê, no processo, de forma imparcial."
Isso quer dizer que, nos termos da Constituição Federal, no exercício das atribuições de judicatura, cada Auditor atua "sem subordinação jurídica, vinculando-se exclusivamente ao ordenamento jurídico" [09], com o objetivo de "colocar-se acima dos poderes políticos e das massas que pretendem exercer pressão sobre suas decisões" [10].
Conforme leciona o professor Humberto Theodoro Júnior, a atividade do juiz é "subordinada exclusivamente à lei, a cujo império se submete com penhor de imparcialidade" [11].
Nesse mesmo sentido, o Exmo. Sr. Ministro do TCU, Dr. Ubiratan Aguiar [12], deixou bem claro em seu discurso, quando da posse do Auditor Weder de Oliveira, que o Auditor subordina-se apenas às normas constitucionais e infraconstitucionais. Logo, o Auditor não está sujeito a coordenação ou supervisão de superior hierárquico.
"A partir de hoje, vossa excelência, como Auditor desta Corte de Contas, estará subordinado apenas às normas constitucionais e infraconstitucionais brasileiras".
Segundo José dos Santos Carvalho Filho [13], hierarquia é o escalonamento em plano vertical dos órgãos e agentes que tem como objetivo a organização da função administrativa e tem como efeitos: o poder de comando; a fiscalização de atividades; o poder de revisão; e a avocação de atribuições.
Assim, indaga-se: é possível submeter o Auditor-Magistrado à hierarquia funcional? É possível obrigar o Auditor a instruir e concluir seu relatório no mérito de acordo com orientações administrativas? É possível determinar ao Auditor-Magistrado que presida a instrução de esta ou de aquela forma? Por fim, é possível avocar as competências constitucionais atribuídas ao Auditor-Magistrado?
Cremos que as respostas a todas essas indagações sejam negativas, pois, segundo o eminente administrativista José dos Santos Carvalho Filho, "INEXISTE HIERARQUIA ENTRE OS AGENTES QUE EXERCEM FUNÇÃO JURISDICIONAL OU LEGISLATIVA, VISTO QUE INAPLICÁVEL O REGIME DE COMANDO QUE A CARACTERIZA. NO QUE CONCERNE AOS PRIMEIROS, PREVALECE O PRINCÍPIO DA LIVRE CONVICÇÃO DO JUIZ, PELO QUAL AGE COM INDEPENDÊNCIA, ‘SEM SUBORDINÇÃO JURÍDICA AOS TRIBUNAIS SUPERIORES, COM BEM SALIENTA HUMBERTO THEODORO JUNIOR’".
Como não há no poder judiciário juiz vinculado a desembargador, não pode haver Auditor vinculado a Ministro (ou Conselheiro). As atividades administrativas e de gestão dos juízes e desembargadores são fiscalizadas internamente pelas corregedorias do próprio Tribunal e externamente pelo Conselho Nacional de Justiça. O mesmo modelo é seguido pelos Tribunais de Contas, cujos Ministros (Conselheiros) e Auditores também estão submetidos à função correcional interna e, possivelmente, no futuro próximo, do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas.
Assim, a hierarquia que o Auditor-Magistrado, Ministro e Conselheiro se submetem é a correição no que se refere à função disciplinar e a hierarquia administrativa e de gestão em relação à Presidência do Tribunal, mas nunca a uma hierarquia que interfira na isenção da Instrução Processual, na imparcialidade das conclusões do seu Relatório, ou que atente contra a autonomia e independência do Auditor-Magistrado, Ministro e Conselheiro.
Logo, conclui-se que não há subordinação hierárquica do ponto de vista funcional (ou vinculação, supervisão, coordenação, controle ou outro termo sinônimo ou análogo), mas apenas para com os atos administrativos e de gestão em relação à Presidência do Tribunal, a quem compete, por disposição legal, dirigir os trabalhos da instituição.

IV - Organização dos Tribunais e Contas

O objetivo desse capítulo é levantar como é a previsão legal dos Auditores em alguns Tribunais de Contas, e sempre que disponível apresentar o organograma da instituição.
Como decorrência do princípio da simetria, a organização dos demais Tribunais segue o modelo federal, consubstanciado no modelo do TCU, que serve de parâmetro para os demais Cortes de Contas. A estrutura organizacional (organograma) do TCU é dividida em Colegiados (Plenários e Câmaras), Autoridades (Ministros, Auditores e Procuradores) e Secretaria (serviços auxiliares técnicos e administrativos).
Os servidores da secretaria do Tribunal são normalmente estatutários e seus cargos geralmente possuem as seguintes denominações: Auditor Federal de Controle Externo (TCU), Auditor de Contas Públicas (TCE-PE e TCE-PB), Auditor de Controle Externo (TCE-PI), Auditor Externo (TCE-MT), Auditor Fiscal de Controle Externo (TCE-SC), Auditor Contábil (TCE-SE), Inspetor de Controle Externo (TCE-MG), Analista de Controle Externo (TCE-MA, TCE-TO e TCE-AC), Analista Fiscal (TCE-RR) e Técnico de Controle Externo (TCE-RO e TCE-PR).
Dessa diversidade de denominações dos servidores das secretarias dos Tribunais é que decorre a confusão feita pelos leigos com relação ao cargo de Auditor-Magistrado previsto na Constituição Federal (Ministro e Conselheiro Substituto).
Não há hierarquia entre Ministros, Auditores e Procuradores. Os Ministros (exceção do presidente) e os Auditores presidem a instrução e relatam processos. O Ministro Presidente só vota para desempatar. Os Auditores somente votam quando estiverem substituindo Ministros. Quando não estiverem substituindo, as propostas de deliberações dos Auditores são votadas pelos demais Ministros.
Os jurisdicionados são divididos em tantas listas quanto forem o número de Ministros e de Auditores relatores, sendo tais listas sorteadas entre eles mediante critérios de publicidade e alternatividade a cada biênio.

As secretarias do Tribunal são responsáveis por operacionalizar a execução da instrução processual de tomadas e de prestações de contas ordinárias e especiais, de consultas, de denúncias, de representações, de requerimentos, de contratos, de licitações, bem como por analisar os pedidos e solicitações de órgãos e entidades vinculados à área de atuação da secretaria. Dependendo de cada Ministro ou Auditor, mediante delegação, as secretarias podem sanear os processos sob sua responsabilidade, por meio de inspeção, diligência, citação ou audiência.

No Estado do Pará, o TCE segue o modelo federal, conforme legislação daquele Tribunal:
"Art. 40. São atribuições dos Auditores:
(...)
a) exercer as funções inerentes ao cargo de Conselheiro, no caso de vacância (...);
b) substituir os Conselheiros em suas ausências e impedimentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal, e ainda, para efeito de quorum (...);
II - atuar em caráter permanente junto ao Plenário, PRESIDINDO A INSTRUÇÃO DOS PROCESSOS QUE LHES FOREM DISTRIBUÍDOS POR SORTEIO, RELATANDO-OS COM PROPOSTA DE DECISÃO POR ESCRITO, A SER VOTADA PELOS CONSELHEIROS, E PARTICIPAR DA DISCUSSÃO SOBRE ESSES AUTOS;
III - presidir sindicância e comissão de processo administrativo, quando designados pela Presidência;
IV - auxiliar o Presidente no exercício de suas atribuições;
O organograma do TCE-PA também reproduz o modelo federal, estando divido em Colegiado, Autoridades e Serviços Auxiliares.
Ainda na Região Norte, o TCE do Maranhão também seguiu o modelo federal, assim dispondo sobre os Auditores, seguindo-se a estrutura organizacional dividida em Colegiados, Autoridades e Serviços Auxiliares:
"Art. 77. Os Conselheiros, em suas ausências e impedimentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal, serão substituídos, mediante convocação do Presidente do Tribunal, pelos Auditores (...).(Lei nº 8.258/05).
§ 1°- Os Auditores serão também convocados para substituir Conselheiro, para efeito de quorum (...).
§ 2°- Em caso de vacância de cargo de Conselheiro, o Presidente do Tribunal convocará Auditor para exercer as funções inerentes ao cargo vago (...).
Art. 104. (...)
Parágrafo único. O Auditor, quando não convocado para substituir Conselheiro, PRESIDIRÁ A INSTRUÇÃO DOS PROCESSOS QUE LHE FOREM DISTRIBUÍDOS, RELATANDO-OS COM PROPOSTA DE DECISÃO A SER VOTADA PELOS INTEGRANTES DO PLENÁRIO OU DA CÂMARA PARA A QUAL ESTIVER DESIGNADO"
O maior Estado da federação, São Paulo, por sua vez, também implementou o modelo federal no que se refere aos cargos de Auditores, a saber:
Artigo 4º - Compete ao Auditor do Tribunal de Contas: (Lei Complementar n. 979/00).
I - substituir Conselheiros em suas ausências e impedimentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal;
II - PRESIDIR A INSTRUÇÃO DOS PROCESSOS QUE LHE FOREM DISTRIBUÍDOS, QUANDO NÃO ESTIVER CONVOCADO PARA SUBSTITUIR CONSELHEIRO, RELATANDO-OS COM PROPOSTA DE DECISÃO A SER VOTADA PELOS INTEGRANTES DO PLENÁRIO OU DA CÂMARA PARA A QUAL ESTIVER DESIGNADO;
Parágrafo único - O Auditor do Tribunal de Contas, quando em substituição a Conselheiro, terá as mesmas garantias e impedimentos do titular e, quando no exercício das demais atribuições da judicatura, as de Juiz Estadual de Direito da última entrância.
Artigo 5º - Ocorrendo alguma das hipóteses previstas no inciso I do artigo 4º e sempre que se fizer necessário, os Auditores do Tribunal de Contas exercerão a substituição mediante convocação do Presidente do Tribunal de Contas, de acordo com critérios previstos no Regimento Interno do Tribunal.
§ 1º - Em caso de vacância de cargo de Conselheiro, o Presidente do Tribunal de Contas, observados os critérios previstos no caput, convocará Auditor do Tribunal de Contas para exercer as funções inerentes ao cargo vago, até novo provimento.
§ 2º - Assiste ao Auditor do Tribunal de Contas o direito de perceber, por efeito da substituição e enquanto ela ocorrer, a remuneração devida ao Conselheiro"
A exposição de motivos da lei de criação do cargo de Auditor no Tribunal de Contas de São Paulo deixa claro que tal medida tem por escopo fazer com que seus titulares, a par de exercerem a substituição dos Conselheiros, possam compor o modelo constitucional de organização da Corte de Contas. Cita dezenas de decisões do STF nesse sentido para concluir que essa é orientação que vem sendo definida pelo Supremo Tribunal Federal. Afirma ainda que o projeto busca acompanhar os parâmetros das competências atribuídas ao Auditor, no âmbito da organização do Tribunal de Contas da União.
A seguir, apresenta-se um quadro com exemplos de Tribunais que, segundo as respectivas leis complementares e regimentos internos, seguem o modelo federal.

Quadro 1 – Cortes de Contas que seguem integralmente o modelo federal (TCU)

Função Ordinária

Tribunal
  1. Presidir a Instrução de processos
  2. Relatar processos com proposta de decisão
  3. a ser votado pelo Plenário ou Câmaras.
    que lhe for distribuído;
SubstituirMinistros e Conselheiros nas seguintes hipóteses:
  1. Ausências;
  2. Impedimentos;
  3. Licenças;
  4. Férias;
  5. Afastamento Legal;
  6. Vacância; e
  7. Quorum.
  1. TCE-AM;
  2. TCE-CE;
  3. TCE-DF;
  4. TCE-ES;
  5. TCE-MA;
  6. TCE-PA;
  7. TCE-PB;
  8. TCE-PE;
  9. TCE-PI;

  • TCE-PR;
  • TCE-RN;
  • TCE-RO;
  • TCE-RR;
  • TCE-SC;
  • TCE-SE;
  • TCE-SP;
  • TCE-TO.

Fonte: Leis Orgânicas e Regimentos Internos

Alguns Tribunais não fazem parte desta lista por não possuírem a figura do Auditor em sede constitucional ou legal. Outras Cortes de Contas possuem cargos com nomes juris de Auditor, mas a atribuições desses cargos se distanciam de tal maneira do modelo constitucional que foram excluídas da Tabela. No entanto, aos Tribunais não constantes da Tabela 1, na maior parte das vezes, faltam tão-somente algumas das funções ordinárias ou extraordinárias do cargo de Auditor.


V - Conclusão

Pretendeu-se com este artigo apresentar elementos e subsídios para uma análise descritiva do cargo de Auditor Constitucional dos Tribunais de Contas (Auditor-Magistrado), sem, contudo, apresentar cunho crítico ou prescritivo, mas visando tão-somente contribuir para a compreensão e divulgação do cargo também denominado de Ministro (Conselheiro) substituto. Esse cargo, que nada mais é do que o juiz natural das Cortes de Contas, como concebido há mais de noventa anos pelo Decreto de criação n.0 3454 de 1918, possui garantias de magistrados que o possibilita atuar com plena independência e sem subordinação hierárquica ou jurídica, vinculando-o apenas ao ordenamento constitucional e legal, que o diferencia, sobremaneira, de todos os demais cargos infraconstitucionais e infralegais também denominados de auditor.


Bibliografia

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 17ª Ed. Editora Lumum Juris: Rio de Janeiro, 2008. p. 136.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17ª Ed. Editora Lumem Juris: Rio de Janeiro, 2007.

COUTURE, Eduardo. Introdução ao Estudo do Direito Processual Civil. Rio de Janeiro.

FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes. Tribunais de Contas do Brasil: Jurisdição e Competência. 2ª Ed. Editora Fórum: Belo Horizonte, 2005. p. 692-693.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia. 1ª Ed. Editora Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1975. p. 160

PACHECO, José da Silva. Direito Processual Civil. 1ª Ed. São Paulo, 1976.

PASCUAL, Valdecir. Direito Financeiro e Controle Externo. 4ª Ed. Editora Impetus.

SANTOS, Washington. Dicionário Jurídico Brasileiro. Editora Del Rey.

THEODORO Jr, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. V. I. 50ª Ed. Editora Forense: Rio de Janeiro, 2009. p. 39.


Notas

  1. Art. 73, § 4º, CF/88 - O auditor, quando em substituição a Ministro, terá as mesmas garantias e impedimentos do titular e, quando no exercício das demais atribuições da judicatura, as de juiz de Tribunal Regional Federal.
  2. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia. 1ª Ed. Editora Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1975, p. 160.
  3. Art. 75, CF/88 - As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.
  4. Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.
  5. Lei 8.457/92. Art. 1° São órgãos da Justiça Militar:
  6. I o Superior Tribunal Militar; II a Auditoria de Correição; III os Conselhos de Justiça; IV os Juízes-Auditores e os Juízes-Auditores Substitutos.
  7. Tribunais de Contas do Brasil: Jurisdição e Competência. 2ª edição. Editora Fórum: Belo Horizonte, 2005. p. 692-693.
  8. Direito Financeiro e Controle Externo – Ed. Impetus – 4ª Ed.
  9. SANTOS, Washington. Dicionário Jurídico Brasileiro. Ed.: Del Rey.
  10. Lições de Direito Processual Civil. 17ª edição. Editora Lumem Júris: Rio de Janeiro, 2008. p.136.
  11. PACHECO, José da Silva. Direito Processual Civil. 1ª edição. São Paulo: 1976.
  12. COUTURE, Eduardo. Introdução ao estudo do direito processual civil. Rio de Janeiro.
  13. Curso de Direito Processual Civil – Vol. I – 50ª edição – Editora Forense – Rio de Janeiro – 2009 – p. 39.
  14. Ata do TCU n. 1, de 21 de janeiro de 2009.
  15. Manual de Direito Administrativo. 17ª Ed. Lumes Júris.

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    sábado, 2 de abril de 2011

    NOVA RESOLUÇÃO SOBRE AS NORMAS BRASILEIRAS DE CONTABILIDADE É EDITADA PELO CFC

    O Conselho Federal de Contabilidade editou a Resolução n. 1328/11 que dispõe sobre a estrutura das Normas Brasileiras de Contabilidade. Confira:  Resolução